Culto a Maria e aos Santos
Penso que o ambiente da igreja “baixa”13 em que cresci estava muito confortavelmente à vontade em Sião.14 Meu avô, eu soube, costumava dizer que “esperava ter conversas muito interessantes com Paulo quando chegasse ao céu”. Dois cavalheiros clericais conversando à vontade em um clube! Nunca pareceu cruzar sua mente que um encontro com esse apóstolo poderia ser uma experiência esmagadora, mesmo para um clérigo evangélico de boa família. Mas, quando Dante viu os grandes apóstolos no céu, eles lhe pareceram como montanhas.15 Há muito a ser dito contra as devoções aos santos; mas, pelo menos, eles continuam nos lembrando de que somos pessoas muito pequenas em comparação com eles. Quão menores, então, diante do Mestre deles? Cartas a Malcom - IIAparentemente, eu mesmo fui culpado por introduzir outra distração ao mencionar devoções a santos. Eu não queria, nem um pouco, entabular uma discussão sobre esse assunto. Há claramente uma defesa teológica para isso: se você pode pedir as orações dos vivos, por que você não deveria pedir as orações dos mortos? Há claramente também um grande perigo. Em alguma prática popular, vemos isso nos levar a uma imagem infniitamente ingênua do céu como um tribunal terrestre, onde os suplicantes terão de ser sábios para puxar os corretos, descobrir os melhores “canais” e unirem-se aos grupos de pressão mais influentes. Mas eu não tenho relação nenhuma com nada disso. Não estou pensando em adotar essa prática; e quem sou eu para julgar as práticas dos outros? Só espero que não haja nenhum projeto para termos canonizações na Igreja da Inglaterra. Você pode imaginar uma estufa melhor para fomentar ainda mais divisões entre nós? Cartas a Malcom - III
A Idade Média demonstrou tamanha reverência a uma mulher em especial, que nos foi plausível acusar aquele período de considerar a bendita virgem quase como “uma quarta pessoa da Trindade”. Deus nos banco s dos réus p. 289
(d)LEWIS, C. S. Ibid. (1º de julho de 1944), p. 427:Prezado, eu concordo com Dean Hughes que a ligação entre crença e liturgia é íntima, mas duvido que seja “inextricável”. Entendo que a relação é saudável quando a liturgia expressa a fé da Igreja, e mórbida quando a liturgia produz, por meio de sugestionamento, crenças que a Igreja não professa, ensina ou defende publicamente. Se a Igreja pensa, por exemplo, que nossos pais erraram ao abandonar as invocações católicas de santos e anjos, sem dúvida devemos proclamar nossa renúncia coletiva, declarar seus fundamentos na Escritura, na razão e na tradição, realizar um ato solene de penitência, reorientar os leigos e introduzir as mudanças apropriadas na liturgia. Deus no banco dos réus. p. 407(f) LEWIS, C. S. “Invocation”. Ibid. (15 de julho de 1949), p. 463-464: Prezado, o Sr. Every (de forma bastante legítima) confere à palavra invocação um sentido mais amplo do que eu. A questão passa a ser, portanto, até onde podemos inferir, da propriedade da invocação à propriedade da devoção? Eu aceito a autoridade do Benedicite [313] quanto à propriedade da invocação (no sentido do Sr. Every) dos santos. Mas, se eu inferir disso a propriedade das devoções aos santos, não serei obrigado a aprovar a devoção de estrelas, geadas e baleias? Deus no banco dos réus. p. 407
Canonização PITT, Eric. “Canonization”. Church Times. v. CXXXV (17 de outubro de 1952), p. 743. LEWIS, C. S. Ibid. (24 de outubro de 1952), p. 763: Prezado, eu sou, tal como o Sr. Eric Pitt, um leigo, e gostaria de obter explicações sobre diversos pontos antes de sequer discutir a proposta de um “sistema” de canonização anglicana. De acordo com a Enciclopédia Católica, “santos” são pessoas mortas cujas 11. (a) (b) virtudes as tonaram “dignas” do amor “especial” de Deus. A canonização faz com que a dulia seja “universal e obrigatória”; e, independentemente do que mais afirme, ela certamente declara que a pessoa canonizada “está no céu”. A menos, portanto, que a palavra “canonização” esteja sendo empregada em um sentido distinto do sentido romano (e, se for o caso, outra palavra seria muito mais conveniente), a proposta de estabelecer um “sistema” de canonização significa que alguém (digamos, o arcebispo) deve ser designado (a) para dizer-nos que certas pessoas nomeadas (i) estão “no céu” e (ii) são “dignas” do amor “especial” de Deus; e (b) para atribuir-nos (sob pena de excomunhão?) a obrigação de prestar dulia às pessoas nomeadas. Ora, é evidente que ninguém deveria nos dizer aquilo que desconhece. Acredita-se, portanto, que Deus prometeu (e, em caso afirmativo, quando e onde?) à Igreja universal o conhecimento do estado de determinadas almas que partiram? Se assim for, será que tal conhecimento discerne os graus e tipos variados de salvação que estão, suponho, implícitos na palavra “especial”? E, caso o faça, será que a promulgação de tal conhecimento ajuda a salvar almas agora in vida? Afinal, isso poderia levar a uma consideração de “pretensões rivais”, como lemos em Imitação de Cristo (livro III, capítulo lviii), onde somos advertidos: “Não perguntes quem é maior no reino dos céus […] a busca de tais coisas não traz lucro, mas ofende os próprios santos.” Por fim, há a questão prática. Não me refiro à pequena e bela menção na Enciclopédia Católica às “despesas comuns da canonização” (embora isso também possa ser lido com proveito), mas ao perigo de cisma. Milhares de membros da Igreja da Inglaterra questionam se a dulia é lícita. Será que alguém a considera necessária à salvação? Em caso negativo, de onde vem a obrigação de corrermos riscos tão terríveis? Deus no banco dos réus,410-411
ARTIGO 10: DA SANTA CEIA
Da ceia do Senhor se ensina que o verdadeiro corpo e o verdadeiro sangue de Cristo estão verdadeiramente presentes na ceia30 sob31 a espécie do pão e do vinho32 e são nela distribuídos e recebidos. Por isso também se rejeita a doutrina contrária.
32. Unter der Gestalt des Brots und Weins. “Gestalt” = aparência, forma; “Erscheinungsform” (BSLK, p. 64, nota 1), forma externa, espécie. Na doutrina da transubstanciação: espécies = acidentes do pão e do vinho. Observa a nota 1, p. 64, BSLK, a propósito do termo “Gestalt” em CA X: “Vielleicht Anklang na kath. Sprauchgebrauch....” (“talvez reminiscência do uso idiomático católico...”.) E ilustra com um texto das teses de Wimpina contra os Artigos de Schwabach: depois da “Tirmung” (consagração), diz Wimpina, fica apenas a “Gestalt” do pão e do vinho, e “unter jetlicher Gestalt” (“sob cada uma das espécies”) está o verdadeiro corpo e sangue de Cristo, e o Cristo inteiro, individido e completo (WA XXX, 3; 190, 10 ss.) Cf. E. F. Karl Müller, Symbolik, 1896, p. 347, nota 7: “Die Worte des deutschen Textes, ‘dass wahrer Leib und Blud Christi wahrhaftiglich unter der Gestalt des Brods un Weins im Abendmahl gegenwärtig sei’, entsprechen der geläufigen römischen Redeweise”. (grifo do autor.) Sobre as espécies eucarísticas, ou santas espécies, no sentido de aparências do pão e do vinho depois da transubstanciação cf. também IV Concílio de Latrão, 1215 (Denziger-Schönmetzer, Enchiridion Symbolorum, 802): Iesus Christus, cuius corpus et sanguis in sacramento altaris sub speciebus panis et vini veraciter continentur, transsubstantiatis pane in corpus, et vino in sanguinem potestate divina. – Observa P. Brunner (Pro Ecclesia, p. 187) que não se deve aceitar uma interpretação da expressão “unter der Gestalt” no sentido da doutrina romana da transubstanciação. O sentido, diz ele, é: “unter dem sinnlich wahrnehmbaren Ding, das Brot und Wein ist” (“sob a coisa sensorialmente perceptível, que é pão e vinho”)
Ele haveria de dizer: “Isto é o meu corpo”. [40] Pão comum, pão milagroso, pão sacramental — estes três são distintos, mas não devem ser separados. Deus no banco dos réus p. 46
No momento em que possuímos um ego, temos a possibilidade de nos colocar em primeiro lugar - de querer ser o centro de tudo — de querer, na verdade, ser Deus. Esse foi o pecado de Satanás, e foi esse o pecado que ele ensinou à raça humana. Certas pessoas julgam que a queda do homem teve algo a ver com o sexo, mas estão enganadas. (A história contada no Livro do Gênesis sugere, isto sim, que nossa natureza sexual foi corrompida após a queda, como uma conseqüência desta, e não uma causa.) O que Satanás colocou na cabeça dos nossos remotos ancestrais foi a idéia de que poderiam "ser como deuses" — poderiam bastar-se a si mesmos como se fossem seus próprios criadores; poderiam ser senhores de si mesmos e inventar um tipo de felicidade fora e à parte de Deus. Dessa tentativa, que não pode dar certo, vem quase tudo o que chamamos de história humana: o dinheiro, a miséria, a ambição, a guerra, a prostituição, as classes, os impérios, a escravidão - a longa e terrível história da tentativa do homem de descobrir a felicidade em outra coisa que não Deus
Eu pessoalmente tenho testemunhado a mais diversa gama de pessoas alegremente citar C. S. Lewis. Isto inclui as pessoas que aderem a todos os tipos de posições teológicas e eclesiológicas, incluindo o fundamentalismo, cessacionismo, continuísmo, calvinismo, arminianismo, molinismo, o teísmo aberto, o movimento profético terceira onda, o movimento pentecostal tradicional, um monte de movimentos! (às vezes sou surpreendido com o grupo diverso de amigos que tenho).
Você está pegando o ponto? C. S. Lewis é um dos mais influentes, amado, estimado, reverenciado e honrado autores cristãos de todos os tempos. Ele é elogiado por calvinistas como John Piper e os teístas abertos como Greg Boyd. Essencialmente todo mundo pensa duas coisas (1) C. S. Lewis é incrível, e (2) C. S. Lewis está em seus times.
Acontece que, enquanto a maioria do mundo cristão absolutamente adora C. S. Lewis, "o autor", bem poucas pessoas conhecem C. S. Lewis, "o herege." Eu, pessoalmente, não acho que C. S. Lewis é um herege, mas (e aqui está a grande ironia), se eu fosse defender suas crenças, 95% das igrejas evangélicas iriam me chutar para fora como um herege, e ainda assim a maioria dessas pessoas avidamente e excessivamente citam Lewis em numerosas ocasiões.
AS "HERESIAS" DE C. S. LEWIS
Heresia refere-se a crença ou ensinamento que é contrário a crenças ortodoxas (aqueles aceitos como vital e verdadeiro). Há, de facto heresias oficiais, tal como definido pela Igreja, no entanto, a maioria dos cristãos usar o termo livremente para se referir a qualquer crença que são consideradas as crenças cristãs não-tradicionais.
1. A evolução é uma explicação científica válida para a vida
C. S. Lewis abertamente aceitou que a evolução era uma teoria científica válida das origens. Na verdade, seu livro mais famoso Cristianismo Puro e Simples inclui o conceito de evolução científica como um exemplo de crescimento espiritual no grande final do livro. Isso nunca foi atualizado, revisado ou alterado ao longo da vida de Lewis.
"Há milhares de séculos, criaturas gigantescas e dotadas de cascos pesadíssimos surgiram sobre a Terra. Se naquela época houvesse alguém que observasse o curso da evolução, provavelmente pensaria que ela caminhava na direção de cascos cada vez mais pesados. Estaria errado, porém. O futuro tinha uma carta na manga, uma carta que, naquele momento, não poderia ter sido prevista de modo algum. Estava a ponto de gerar pequenos seres nus, sem cascos nem espinhos, mas dotados de cérebros melhores: seres que, com esses cérebros, viriam a dominar o planeta inteiro. Não só teriam mais poder que os monstros pré-históricos como teriam um novo tipo de poder. O passo seguinte não só foi diferente como também foi marcado por um novo tipo de diferença. A corrente da evolução não seguiria a direção em que nosso hipotético observador a via fluir: na verdade, estava a ponto de fazer uma curva acentuada. (...) Ora, se pretendemos continuar usando essa linguagem, a ideia cristã é que esse próximo passo já foi dado. E, de fato, ele é completamente novo. Não é uma mudança de homens cerebrais para homens mais cerebrais ainda: é uma mudança que parte numa direção completamente diferente — de criaturas de Deus para filhos de Deus." (Lewis, Cristianismo Puro e Simples, "As Novas Criaturas")
"Durante longos séculos Deus aperfeiçoou a forma animal que iria tomar-se o veículo da humanidade e a imagem de Si mesmo. Ele deu-lhe mãos cujo polegar podia ser aplicado a cada um dos dedos, e mandíbula, dentes e garganta articulados, assim como um cérebro suficientemente complexo para executar todos os movimentos materiais dando Julgar ao pensamento racional. A criatura pode ter existido durante séculos neste estado antes de tomar-se homem: pode ter sido até mesmo inteligente o bastante para fazer coisas que o arqueólogo moderno aceitaria como prova de sua humanidade. Mas não passava de um animal porque todos os seus processos físicos eram dirigidos a fins puramente materiais e naturais. Então, na plenitude do tempo, Deus fez descer sobre este organismo, tanto na sua psicologia como fisiologia, uma nova espécie de consciência que podia dizer "eu" e "mim", que podia olhar para si mesma como um objeto, que conhecia Deus, que podia fazer juízos quanto à verdade, beleza e bondade, e que estava tão acima do tempo que podia percebê-lo passar." (Lewis, O Problema do Sofrimento)
"No capítulo anterior, comparei a obra de cristo da criação do novo ser humano com o processo pelo qual um cavalo se torna uma criatura alada. Usei esse exemplo extremo para deixar bem claro que aquilo de que se trata não é uma simples melhora, mas uma transformação. A coisa que mais se aproxima disso no mundo da natureza são as transformações notáveis que podemos provocar nos insetos quando projetamos certos raios sobre eles. Há quem pense que foi assim que ocorreu a evolução. As alterações das quais esse processo depende poderiam ter sido produzidas por raios vindos do espaço sideral. (É claro que, quando as alterações passam a existir, passam também a sofrer a influência daquilo que se chama "seleção natural": as alterações úteis permanecem e as demais são extirpadas.)
Talvez um homem moderno possa compreender melhor a idéia cristã se a entender no contexto da evolução. Hoje em dia, todos já ouviram falar da evolução (embora haja homens instruídos que não creiam nela): todos já tiveram de ouvir que o homem evoluiu a partir das formas inferiores de vida. Conseqüentemente, as pessoas amiúde se perguntam: "Qual será o próximo passo? Quando aparecerá o ser que virá depois do homem?" Escritores cheios de imaginação tentam às vezes desenhar a figura desse próximo passo - o "super-homem", pois assim o chamam; mas, no geral, só conseguem esboçar os contornos de um ser muito pior do que o homem que conhecemos, e depois tentam compensar esse fato dando-lhe novos pares de braços e pernas. Mas suponhamos que o próximo passo seja algo muito mais dessemelhante dos passos anteriores do que imaginam esses escritores. Não é provável que assim seja? Há milhares de séculos, criaturas gigantescas e dotadas de cascos pesadíssimos surgiram sobre a Terra. Se naquela época houvesse alguém que observasse o curso da evolução, provavelmente pensaria que ela caminhava na direção de cascos cada vez mais pesados. Estaria errado, porém. O futuro tinha uma carta na manga, uma carta que, naquele momento, não poderia ter sido prevista de modo algum. Estava a ponto de gerar pequenos seres nus, sem cascos nem espinhos, mas dotados de cérebros melhores: seres que, com esses cérebros, viriam a dominar o planeta inteiro. Não só teriam mais poder que os monstros pré-históricos como teriam um novo tipo de poder. O passo seguinte não só foi diferente como também foi marcado por um novo tipo de diferença. A corrente da evolução não seguiria a direção em que nosso hipotético observador a via fluir: na verdade, estava a ponto de fazer uma curva acentuada. Ora, me parece que a maioria das conjecturas populares sobre o próximo passo estão cometendo o mesmo tipo de erro. As pessoas vêem (ou pelo menos pensam que vêem) os homens desenvolvendo um cérebro gigantesco e ampliando o domínio sobre a natureza. E, como pensam que a corrente está fluindo nessa direção, imaginam que continuará seguindo o mesmo curso. Mas não posso deixar de pensar que o próximo passo será completamente novo e tomará uma direção com a qual ninguém teria sonhado. Se não fosse assim, não poderia propriamente ser chamado um próximo passo. Penso que ele não só será diferente como também será caracterizado por um novo tipo de diferença. Não conjectura uma simples mudança, mas um novo método de produzir a mudança. Ou, para propor um paradoxo, conjectura que o próximo estágio da evolução não será de modo algum um estágio evolutivo: penso que a própria evolução será superada enquanto método de produção da mudança. E, por fim, não me surpreenderei se, quando isso acontecer, pouca gente perceber que está acontecendo. Ora, se pretendemos continuar usando essa linguagem, a idéia cristã é que esse próximo passo já foi dado. E, de fato, ele é completamente novo. Não é uma mudança de homens cerebrais para homens mais cerebrais ainda: é uma mudança que parte numa direção completamente diferente — de criaturas de Deus para filhos de Deus. O primeiro caso dessa mudança surgiu na Palestina há dois mil anos. Em certo sentido, a mudança não é uma "evolução" de modo algum. Não é algo que nasce do processo natural dos acontecimentos, mas algo que entra na natureza vindo de fora dela. Porém, não deveríamos esperar outra coisa. Foi do estudo do passado que chegamos à nossa idéia de "evolução". Se de fato existem novidades à nossa espera, é evidente que nossa idéia, baseada no passado, não poderia prevê-las. E na verdade esse próximo passo é diferente dos anteriores não só por vir de fora da natureza, mas por vários outros motivos também. cap. 11
Mesmo admitindo a Evolução guiada por Deus ele cria na Queda do homem. Veja no próximo item
2. Adão e Eva não foram pessoas literais
O pastor proeminente Tim Keller, que é um ávido estudante de CS Lewis (12) escreve: "Um dos meus escritores cristãos favoritos (colocando moderadamente), C. S. Lewis, não acreditava em um literal Adão e Eva, e eu não acho que a falta de tal crença significa que ele não pode ser salvo ". (13)
O próprio Lewis escreve o seguinte (que nunca foi revisto, atualizado ou alterado em novas edições de seus livros):
PARA A IRMÃ PENELOPE, CSMV: do Magdalen College10 de janeiro de 1952Se eu não pensei sobre, eu pelo menos imaginei, por um bom tempo, os outros tipos de Homens. A minha própria ideia foi baseada no velho problema: “Quem era a esposa de Caim?” Seseguirmos as Escrituras, parece que ela não deveria ter sido uma filha de Adão. Eu imaginei os descendentes dos Verdadeiros Homens (em Gênesis 6:1–4, onde eu concordo contigo), reproduzindo-se e assim produzindo os antediluvianos perversos.Por estranho que pareça, eu, como a senhora, imaginei Adão como sendo fisicamente o filho de dois antropoides em que, após o seu nascimento, Deus operou o milagre que o tornou Homem e disse: “Saia — e esqueça o seu próprio povo e a casa do seu pai.” O Chamado de Abraão seria um exemplo bem menor do mesmo tipo de coisa e a regeneração em cada um de nós seria um exemplo também, apesar de não ser menor. Isso tudo me parece encaixar-se histórica e espiritualmente.
PARA A SRA. HOOK: do The Kilns29 de dezembro de 1958Por uma alegoria eu quero dizer uma composição (seja pictórica ou literária) em que as realidades imateriais são representadas por objetos físicos simulados, por exemplo, um Cupido retratadorepresenta alegoricamente o amor erótico (que na realidade é uma experiência, não um objeto ocupando uma dada área de espaço) ou, em Bunyan, um gigante representa o Desespero.Se Aslam representasse a Deidade imaterial da mesma forma que o Gigante Desespero representa o Desespero, ele seria uma figura alegórica. Na realidade, entretanto, ele é uma invenção quedá uma resposta imaginária à questão: “Com o que Cristo se pareceria se realmente existisse um mundo como Nárnia e ele tivesse escolhido se encarnar e morrer e ressuscitar de novo naquele mundo como ele fez de verdade no nosso?” Isso não é nem um pouco de alegoria. O mesmo acontece em Perelandra. Isso também funciona como uma suposição. (“Suponha, agora, que emalgum outro planeta houvesse um primeiro casal passando pela mesma coisa que Adão e Eva passaram aqui, mas com sucesso”).
Lewis acreditava sim num Adão Literal- (para maiores detalhes ver aqui https://evolutionnews.org/2013/11/darwin_in_the_d_1/
2) A origem do sofrimento animal poderia ser traçada, por gerações anteriores, até a Queda do homem o mundo inteiro foi contagiado pela rebelião destrutiva de Adão. Isto agora é, entretanto, impossível, pois temos boa razão para crer que os animais existiram muito antes do homem. O ato de comer carne, com tudo que ele envolve, é mais antigo que a humanidade. E então impossível neste ponto deixar de lembrar de uma história sagrada que, embora não esteja incluída nos credos, tem sido amplamente divulgada na Igreja e parece estar implícita em vários pronunciamentos dominicais, paulinos e joaninos estou me referindo à história de que o homem não foi a primeira criatura a rebelar-se contra o Criador mas que um ser mais antigo e poderoso há muito tempo tornou-se apóstata e é agora o imperador das trevas e (significativamente) o Senhor deste mundo.... Assim sendo, se Nosso Senhor tivesse feito qualquer declaração científica ou histórica que soubéssemos ser falsa, isto não iria perturbar minha fé na sua divindade. (Lewis, O Problema do Sofrimento- Cap. 6)
Não sabemos quantas dessas criaturas Deus fez, nem por quanto tempo continuariam no estado paradisíaco. Mas, mais cedo ou mais tarde, elas caíram. Alguém ou alguma coisa lhes sussurrou que poderiam tornar-se como deuses que podiam deixar de manter suas vidas na direção do Criador e aceitar todos os seus prazeres como dádivas não convencionais, como "acidentes" (no sentido lógico) surgidos no decorrer de uma vida dirigida à adoração de Deus e não a esses prazeres. (Lewis, O Problema do Sofrimento- Cap. 5)
Até esse momento o espírito humano tinha estado em pleno controle do organismo humano, e sem dúvida esperava que reteria esse controle quando deixou de obedecer a Deus. Mas sua autoridade sobre o organismo não passava de uma autoridade delegada que perdeu quando deixou de ser o delegado de Deus. Pelo fato de ter-se afastado, na medida do possível, da fonte de seu ser, ele também rompeu sua ligação com a fonte de poder. Quando dizemos quanto às coisas criadas que A domina B, isto deve significar que Deus domina B através de A. Duvido que fosse intrinsecamente possível para Deus continuar a ter domínio sobre o organismo através do espírito humano quando este se rebela contra Ele. Pelo menos, não o fez. Passou a governar o organismo de maneira mais externa, não mais pelas leis do espírito, mas pelas da natureza.(4) Assim sendo, os órgãos, não mais governados pela vontade do homem, caíram sob o controle das leis bioquímicas comuns e sofreram as interações que essas leis provocaram na forma de dor, senilidade e morte. (Lewis, O Problema do Sofrimento- Cap. 5)
" No momento em que possuímos um ego, temos a possibilidade de nos colocar em primeiro lugar - de querer ser o centro de tudo — de querer, na verdade, ser Deus. Esse foi o pecado de Satanás, e foi esse o pecado que ele ensinou à raça humana. Certas pessoas julgam que a queda do homem teve algo a ver com o sexo, mas estão enganadas. (A história contada no Livro do Gênesis sugere, isto sim, que nossa natureza sexual foi corrompida após a queda, como uma conseqüência desta, e não uma causa.) O que Satanás colocou na cabeça dos nossos remotos ancestrais foi a idéia de que poderiam "ser como deuses" — poderiam bastar-se a si mesmos como se fossem seus próprios criadores; poderiam ser senhores de si mesmos e inventar um tipo de felicidade fora e à parte de Deus. Dessa tentativa, que não pode dar certo, vem quase tudo o que chamamos de história humana: o dinheiro, a miséria, a ambição, a guerra, a prostituição, as classes, os impérios, a escravidão - a longa e terrível história da tentativa do homem de descobrir a felicidade em outra coisa que não Deus" Cristianismo puro e simples
C. S. Lewis não acreditava que as primeiras partes do Gênesis foram uma narrativa histórica literal, mas sim que eles eram formas míticas de apreender a verdade.
O mais antigo estrato do Antigo Testamento contém muitas verdades de uma forma que eu considero ser lendária, ou mesmo mítica - suspensa nas nuvens, mas gradualmente a verdade condensa, torna-se mais e mais histórica. De coisas como a Arca de Noé ou o sol que está ainda em cima de Aijalom, você vem para baixo com as memórias da côrte do rei Davi. Finalmente chegar ao Novo Testamento e a História reina suprema, e a Verdade é encarnada. E "encarnada" aqui é mais do que uma metáfora. Não é uma semelhança acidental que o que, do ponto de vista do ser, é indicado na forma "Deus se fez Homem", deve envolver, do ponto de vista do conhecimento humano, a declaração "Mito tornou-se Fato." (Lewis, "Is Teology Poetry?")
"Não tenho, portanto, qualquer dificuldade em aceitar, por exemplo, a visão desses estudiosos que nos dizem que o relato da criação em Gênesis é derivado de histórias semitas anteriores que eram Pagãs e míticas. Naturalmente, devemos deixar bastante claro o que "derivado de" significa. Histórias não reproduzem suas espécies como ratos. Elas são contadas por homens. cada um que as reconta repete exatamente o que seu antecessor tinha lhe dito ou então as altera. Ele pode mudá-las inconscientemente ou deliberadamente. Se ele muda-las deliberadamente, sua invenção, o seu sentido de forma, sua ética, suas ideias sobre o que é adequado ou edificante, ou meramente interessante, tudo entra. Se inconscientemente, em seguida, seu inconsciente (que é tão grandemente responsável por nossos esquecimentos) tem trabalhado. Assim, a cada passo no que é chamado - um pouco enganador - a "evolução" de uma história, um homem, tudo o que ele é, e todas as suas atitudes, estão envolvidos. E nenhum bom trabalho é feito em qualquer lugar sem a ajuda do Pai das Luzes. Quando uma série de tais recontagens transforma uma história da criação que a princípio não tinha quase nenhum significado religioso ou metafísico em uma história que alcança a ideia da verdadeira Criação e de um Criador transcendente (como Gênesis faz), então nada vai me fazer acreditar que alguns dos recontadores, ou algum deles, não foi guiado por Deus."
"Se uma determinada passagem é corretamente traduzida ou é um mito (mas naturalmente um mito curso especialmente escolhido por Deus dentre inúmeros mitos para transportar uma verdade espiritual) ou a história (...) Mas não devemos usar a Bíblia (nossos pais tão frequentemente usaram) como uma espécie de enciclopédia dos quais textos...podem ser tomados para uso como armas."
(Cartas de C. S. Lewis, New York, Harper and Row, 2001)
"O ponto é que todo o Livro de Jonas tem para mim o ar de ser um romance moral, um tipo bem diferente de coisa que, por exemplo, o relato do rei Davi ou narrativas do Novo Testamento, não amarradas, como elas, em qualquer situação histórica. Em que sentido a Bíblia "apresenta" a história de Jonas "como histórica"? É claro que ela não diz: "Isto é ficção", mas nem o nosso Senhor diz que o juiz injusto, o bom samaritano, ou o filho pródigo são ficção (eu colocaria Ester na mesma categoria que Jonas, pela mesma razão). Como é que uma negação, uma dúvida, de sua historicidade conduz logicamente a uma negação semelhante de milagres do Novo Testamento? Supondo que (como eu acho que é o caso), aquela leitura crítica sólida revelasse diferentes tipos de narrativa na Bíblia, certamente seria ilógico supor que esses tipos diferentes devem ser lidos da mesma forma?" (Lewis, Carta de C. S. Lewis para Corbin)
Resposta:
Apesar do valor surpreendente de Lewis para a apologética cristã, nem tudo nas suas posições é compatível com o cristianismo evangélico. Lewis escreveu uma de suas melhores críticas ao naturalismo já publicada (Milagres), na qual defendeu os milagres literais do NT, inclusive a ressurreição de Cristo. No entanto, Lewis negava, incoerente-mente, a natureza literal de muitos milagres do AT (v. milagres na Bíblia):
Os hebreus, como outros povos, tinham mitologia: mas, como eram o povo escolhido, sua mitologia era a mitologia escolhida — a mitologia escolhida por Deus para ser o veículo das primeiras verdades sagradas, o primeiro passo no processo que termina no nt, onde a verdade se tornou completa- mente histórica. Se podemos dizer com certeza onde, nesse processo de cristalização, qualquer história específica do NT cai, é outra questão. Eu acredito que as memórias da corte de Davi estão num extremo e são um pouco menos históricas que Marcos ou Atos; e que o Livro de Jonas é o outro extremo (Milagres,p. 139). Enciclopedia de Apologética. Norman Geisler,. São Paulo: Vida, 2002 p. 498
Uma teologia que nega a historicidade de quase tudo nos evangelhos, aos quais a vida e as afeições e o pensamento cristãos se fixaram por quase dois milênios — que ou nega totalmente o milagroso ou, por incrível que pareça, depois de engolir o camelo da Ressurreição se incomoda com o mosquito da multiplicação dos pães — se oferecida a um homem simples pode produzir apenas um ou outro de dois efeitos. Ou ele se tornará um católico romano ou um ateu (Christian reflections, p. 153).
Lewis reconhece que pode estar errado com relação aos milagres do AT. Ele admite que sua posição é experimental e está sujeita a erros, e que 0 assunto está além do seu conhecimento:
A consideração dos milagres do AT está além da intenção deste livro e exigiria muitos tipos de conhecimento que não possuo. Minha posição atual—que é experimental e está sujeita a toda espécie de correção — seria que, assim como, no lado factual, uma longa preparação culmina na encarnação de Deus como Homem, no lado documentário a verdade aparece primeiro na forma mítica e então, mediante um longo processo de condensação ou focalização, finalmente se torna encarnada como História (Milagres, p. 139).
Lewis também aceitava outras idéias da alta crítica sobre o AT (v. Bíblia, crítica da). Ele questionou a historicidade de Jó, “porque o livro começa com um homem bem desligado da história ou mesmo da lenda, sem genealogia, vivendo num país do qual a Bíblia não diz quase nada” .... Lewis acreditava nisso apesar da referência a Jó como sendo um personagem histórico tanto no at (Ez 14.14, 20) quanto no NT (Tg 5.11). Uz é mencionada em Jeremias 25.20 e Lamentações 4.21. Costumes e for- mas de nomes próprios ligados a Jó também foram comprovados (Archer, p. 438-48).
Lewis tinha uma posição bastante negativa com relação a vários salmos, chegando ao ponto de considerá-los “diabólicos” (Reflections on the Psalms [Reflexões sobre Salmos], p. 25). Rejeitou a autoria davídica de todos os salmos exceto o salmo 18 (ibid., 114). Isso é surpreendente, dada sua grande consideração por Cristo e os evangelhos. Jesus comprovou que Davi escreveu o salmo 110 (Mt 22.41-46). Jesus também afirmou a autoridade divina de todo o AT(Mt 5.17,18; Jo 10.35) e principalmente dos Salmos (v. Lc 24.44), um dos livros que ele citou com mais freqüência. Enciclopedia de Apologética. Norman Geisler,. São Paulo: Vida, 2002 p. 499
Alguns exemplos que dificilmente conseguiriam produzir um sorriso talvez apareçam de maneira ainda mais perturbadora em alguns salmos que amamos: o 143, após seguir por onze versículos com uma melodia que traz lágrimas aos olhos, no 1 2° acrescenta uma espécie de lembrança de última hora: "E no teu amor leal, aniquila os meus inimigos". De modo ainda mais ingênuo, quase infantil, o Salmo 139, em meio ao seu hino de louvor, acrescenta (v. 19): "Quem dera matasses os ímpios, ó Deus!" - como se fosse surpreendente que um remédio assim tão simples para as enfermidades humanas não tivesse passado pela cabeça do Todo-Poderoso. O pior de todos está em "O Senhor é meu pastor" (Sl 23): depois dos pastos verdejantes, das águas tranquilas, da firme confiança no vale da sombra da morte, de repente nos deparamos com o versículo 5: "Preparas um banquete para mim à vista dos meus inimigos" - ou, como o doutor Moffatt* *James Moffat (1870-1944), escocês, tradutor da Bíblia. (N.E.) traduz essa passagem: "Tu és o anfitrião que oferece-me uma festa enquanto meus inimigos ficam olhando': O prazer do poeta em sua prosperidade momentânea não seria completo, a menos que aqueles inimigos horrendos (que costumavam olhá-lo com desprezo) estivessem assistindo àquilo tudo e odiando. Essa talvez não seja tão diabólica quanto as passagens que citei acima; no entanto, sua mesquinhez e vulgaridade, especialmente no contexto em que está inserida, são difíceis de suportar Reflexõees sobre os Salmos ,p. 28-29
É extremamente raso ler as maldições nos salmos e não ter qualquer sentimento em relação a elas, exceto o de horror diante da falta de compaixão dos poetas. Eles são verdadeiramente maus. p. 32
A primeira é que, dentro do judaísmo, a resposta correta para esse tipo de reação natural já existia. "Não guardem ódio contra o seu irmão no coração [ . . . ] Não procurem vingança, nem guardem rancor contra alguém do seu povo, mas ame cada um o seu próximo como a si mesmo", diz Levítico 19 .17 -18. Em Êxodo 23.4-5 lemos: "Se você encontrar perdido o boi ou o jumento que pertence ao seu inimigo, leve-o de volta a ele. Se você vir o jumento de alguém que o odeia caído sob o peso de sua carga, não o abandone, procure ajudá-lo". "Não se alegre quando o seu inimigo cair, nem exulte o seu coração quando ele tropeçar" (Pv 24.1 7). E eu nunca me esquecerei da surpresa que tive quando descobri que a palavra do apóstolo Paulo - "Se o seu inimigo tiver fome, dê-lhe de comer" etc. - é uma citação direta desse mesmo livro (Pv 25.21). Essa é uma das recompensas por ler o Antigo Testamento regularmente. Você sempre descobre, mais e mais, quanto o Novo Testamento é uma colcha de retalhos de citações do Antigo Testamento p. 33
A primeira impressão que tenho é a de que os judeus eram muito mais vingativos e sarcásticos do que os pagãos. p. 34
Erros sobre o Sheol e vida após morte:
Parece bem claro que, na maior parte do Antigo Testamento, há pouca ou nenhuma crença em uma vida futura; certamente nenhuma crença que tenha qualquer importância religiosa. A palavra traduzida por "alma" em nossa versão dos salmos significa simplesmente "vida''; a palavra traduzida por "inferno" significa apenas "a terra dos mortos': a condição de todos os mortos, igualmente bons e maus, o Sheol. É difícil saber o que um judeu antigo pensava do Sheol. Ele não gostava de pensar a respeito disso. Sua religião não o encorajava a fazê-lo. Não faria bem nenhum pensar sobre o Sheol. Só poderia fazer mal. O Sheol era uma condição a partir da qual se acreditava que pessoas muito perversas, como a feiticeira de En-Dor, seriam capazes de invocar um fantasma. O fantasma, no entanto, não dizia nada a você sobre o Sheol, era chamado apenas para falar sobre o nosso mundo. Ou, por outro lado, se você se permitisse desenvolver um interesse doentio pelo Sheol, talvez fosse atraído a uma das formas próximas de paganismo e comeria "sacrifícios oferecidos a ídolos mortos" (Sl 106.28). Por trás de tudo isso, podemos discernir uma concepção não especificamente judaica, mas comum a muitas religiões antigas. O Hades grego é o exemplo mais conhecido no mundo de hoje. Não é o céu nem o inferno; é quase nada. Estou falando de crenças populares; é claro que filósofos como Platão tinham uma doutrina vívida e positiva da imortalidade. E é claro que os poetas podem escrever fantasias sobre o mundo dos mortos. Tais fantasias, em geral, têm menos a ver com a verdadeira religião pagã e mais com ideias fantasiosas que podemos escrever sobre outros planetas e a verdadeira Astronomia. Na verdadeira crença pagã, não valia muito a pena fazer comentários sobre o Hades; era um mundo de sombras e de decadência. Homero (provavelmente bem mais próximo das verdadeiras crenças do que os últimos e mais sofisticados poetas) apresenta os fantasmas como entidades insensatas. Eles gaguejam coisas sem sentido até que algum ser humano lhes dê de beber um sacrifício de sangue. No início da Ilíada, quando ele fala acerca dos homens mortos em batalha, conta que "suas almas" foram para o Hades, mas que "eles mesmos" foram devorados por cães e urubus. Isso demonstra, de maneira espantosa, como os gregos se sentiam a respeito de tudo isso naquela época. O homem, em si, é o corpo, mesmo o corpo inerte; o fantasma é apenas um tipo de reflexo ou de eco. (Por vezes, senti em minha mente o impulso macabro de me perguntar se tudo isso era mesmo verdade; que o destino natural da humanidade, o destino da humanidade não redimida, é apenas este: desintegrar-se na alma como no corpo para ser um sedimento psíquico ridículo. Se é assim, a ideia de Homero de que somente um gole de sacrifício de sangue pode trazer de volta um fantasma à razão seria uma das mais impressionantes entre as muitas expectativas pagãs pela verdade.)
Tal concepção vaga e marginal, mesmo no paganismo, torna-se mais próxima no judaísmo. O Sheol é ainda mais turvo e, no fundo, mais distante do que o Hades. Ele fica a mil milhas do centro da religião judaica; especialmente nos salmos. Eles falam do Sheol ("inferno" ou "poço") muito mais como um homem fala da "morte" ou da "sepultura'' quando não há nenhuma crença em qualquer tipo de estado futuro, qualquer que seja - um homem para quem os mortos estão simplesmente mortos e nada mais há a ser dito. Em muitas passagens isso está bem claro para todo leitor atencioso, mesmo na nossa tradução. A mais clara de todas essas passagens é o grito dado em Salmos 89.47: "Lembra-te de como é passageira a minha vida. Terás criado em vão todos os homens?''. Todos nós terminamos em nada. Portanto, "o homem não passa de um sopro" (39.5). Sábios e tolos têm o mesmo destino (49.10). Uma vez morto, um homem não adora mais a Deus: ''.Acaso o pó te louvará?" (30.9). "Entre os mortos, quem te louvará?" (6.5). A morte é a "terra'' onde não somente as coisas mundanas, mas todas as coisas são esquecidas (88.12). Quando um homem morre, "naquele mesmo dia acabam-se os seus planos" (146.4). Todo homem "se juntará aos seus antepassados, que nunca mais verão a luz" (49.19); ele vai para uma escuridão que jamais terá fim. Em outro lugar, eu admito, é como se o poeta estivesse orando pela "salvação de sua alma'', no sentido cristão. É quase certo que não. Em Salmos 30.3 lemos: " ... tiraste-me da sepultura'', que significa: "Você me salvou da morte''. ''.As cordas da morte me envolveram, as angústias do Sheol vieram sobre mim'' ( 116.3) significa: ''.A morte estava armando laços para mim, eu senti a angústia de um homem moribundo" - como diríamos, "eu estava às portas da morte'' p. 43-45
4. A expiação substitutiva não é o Evangelho
A maioria dos protestantes afirma que o que aconteceu na cruz pode ser explicado como Expiação Penal Substitutiva, a ideia de que Deus castigou Jesus como um substituto em vez dos pecadores por seus pecados. Muitos evangélicos modernos, de fato chamam a expiação substitutiva de "O Evangelho", no entanto, C. S. Lewis não aceitava isso:
"Ora, antes de me tornar cristão, eu tinha a impressão de que a primeira coisa em que os cristãos tinham de acreditar era uma teoria particular sobre o propósito dessa morte. De acordo com essa teoria, Deus queria castigar os homens por terem desertado e se unido à Grande Rebelião, mas Cristo se ofereceu para ser punido em lugar dos homens, e Deus não nos puniu. Hoje admito que nem mesmo essa teoria me parece mais tão imoral e pueril quanto me parecia, mas não é essa a questão que me ocupa. O que vim a perceber mais tarde é que o cristianismo não é nem essa teoria nem nenhuma outra. A principal crença cristã é que a morte de Cristo de algum modo acertou nossas contas com Deus e nos deu a possibilidade de começar de novo. As teorias sobre como isso ocorreu são outro assunto. Várias teorias foram formuladas a esse respeito; o que todos os cristãos têm em comum é a crença na eficácia dessa morte." (Lewis, Cristianismo Puro e Simples)
"Existem membros de outras religiões que, pela influência secreta de Deus, são levados a concentrar-se naqueles elementos de suas religiões que concordam com o cristianismo, e que assim pertencem a Cristo sem o saber. Um budista de boa vontade, por exemplo, pode ser levado a concentrar-se cada vez mais na doutrina budista da compaixão, deixando em segundo plano os elementos doutrinais que versam sobre outras questões (embora possa ainda afirmar crer nessa doutrina como um todo). É possível que muitos dos bons pagãos que viveram antes do nascimento de Cristo tenham estado nessa situação." (Lewis, Cristianismo Puro e Simples)
"De que nos valerá isso quando o universo se dissolver como um sonho e algo até então inconcebível para nossa mente sobrevier com estrépito — algo tão magnífico para alguns e tão terrível para outros? De que isso nos valerá quando não pudermos mais escolher? Dessa vez, Deus se apresentará sem disfarce, e virá com tamanho poder que causará em cada criatura um amor irresistível ou um irresistível horror. Será tarde demais, então, para escolher um dos lados. Quando não é mais possível ficar em pé, de nada adianta você dizer que decidiu ficar deitado. Aquele não será o tempo das escolhas, mas sim da revelação do lado a que pertencíamos, tivéssemos consciência disso ou não. Hoje, agora, neste momento, temos a oportunidade de escolher o lado correto. Deus tarda a aparecer para nos dar essa chance, que não durará para sempre. E pegar ou largar." Cristianismo puro e simples.
"Eis outra coisa que me intrigava: não é terrivelmente injusto que essa vida nova só chegue às pessoas que ouviram falar de Cristo e acreditaram nele? A verdade, porém, é que Deus não nos deixou a par de seus desígnios a respeito das outras pessoas. O que sabemos é que nenhum homem pode ser salvo a não ser por meio de Cristo; ninguém nos disse que só os que o conhecem podem ser salvos por ele. Nesse ínterim, se você está preocupado com as pessoas de fora, a coisa menos insensata a fazer é permanecer de fora também. Os cristãos são o corpo de Cristo, o organismo através do qual ele trabalha. Cada acréscimo a esse corpo permite que ele trabalhe mais. Se você quer ajudar os que estão de fora, tem de acrescentar sua pequena célula ao corpo de Cristo, o único que pode ajudá-los. Decepar o dedo de um homem seria uma forma excêntrica de levá-lo a trabalhar mais" (Lewis, Cristianismo Puro e Simples,Cap. 5)
Os cristãos sempre tiveram o costume de polemizar sobre o que conduz o cristão à sua morada: se as boas ações ou se a fé em Cristo. Na verdade, não tenho o direito de falar sobre um assunto tão difícil, mas me parece que é como perguntar qual das lâminas de uma tesoura é a mais importante. O esforço moral sério é a única coisa que pode nos conduzir ao ponto de jogar a toalha. A fé em Cristo é a única coisa que pode nos salvar do desespero nesse ponto: e, dessa fé, é inevitável que surjam boas ações. No passado, alguns grupos cristãos acusaram outros grupos cristãos de parodiar a verdade de duas formas. O exagero das situações talvez ajude a tornar a verdade mais clara. Um dos grupos era acusado de dizer: "As boas ações são tudo o que interessa. A melhor das boas ações é a caridade. O melhor tipo de caridade é dar dinheiro. A melhor forma de dar dinheiro é fazer uma doação para a Igreja. Logo, faça uma doação de 10.000 libras e garantiremos sua entrada na vida eterna." A resposta a esse absurdo é que as ações feitas com essa intenção, com a idéia de que o Paraíso pode ser comprado, não são boas ações de forma alguma, mas somente especulações comerciais. Outro grupo era acusado de dizer: "A fé é tudo o que importa. Logo, se você tem fé, não importam as suas ações. Peque à vontade, meu filho, divirta-se a valer, que para Jesus Cristo não vai fazer a mínima diferença no final." A resposta a esse absurdo é que, se o que você chama de "fé" em Cristo não implica dar atenção ao que ele disse, ela não é fé de maneira alguma — nem Fé nem confiança, mas apenas a aceitação mental de alguma teoria a seu respeito. A Bíblia encerra a discussão quando junta as duas coisas numa única sentença admirável. A primeira metade diz: "Ponham em ação a salvação de vocês com temor e tremor" - o que dá a idéia de que tudo depende de nós e de nossas boas ações; mas a segunda metade complementa: "Pois é Deus que efetua em vocês tanto o querer quanto o realizar" - o que dá a idéia de que Deus faz tudo e nós, nada. Esse é o tipo de coisa com a qual nos defrontamos no cristianismo. (Lewis, Cristianismo Puro e Simples, Cap. 12)
(3) Agora, vamos um pouco mais ao fundo. O administrador está quando investir em novo maquinário: quando Cristo terminar de fazer o que tem de fazer com a srta. Bates, ela será efetivamente muito "boa". Mas, se parássemos por aí, ficaríamos com a impressão de que o único objetivo de Cristo foi conduzir a srta. Bates ao mesmo nível em que Dick sempre esteve. Na verdade, estivemos falando como se com Dick estivesse tudo bem; como se o cristianismo fosse algo que os mal-humorados necessitam e que os simpáticos podem se dar ao luxo de ficar sem; e como se tudo quanto Deus exige fosse um pouco de bondade natural. Porém, esse é um engano fatal. A verdade é que, aos olhos de Deus, Dick Firkin precisa da "salvação" exatamente da mesma maneira que a srta. Bates. Em certo sentido (vou explicar esse sentido daqui a pouco), essa bondade natural nem sequer é levada em conta.... (Lewis, Cristianismo Puro e Simples,Cap. 10)
Há aí um paradoxo. Enquanto Dick não se volta para Deus, pensa que sua bondade pertence a ele; e, enquanto ele pensar assim, ela não lhe pertencerá. E só quando Dick perceber que sua bondade não é dele, mas um dom de Deus, e quando a oferecer de novo a Deus — é só então que ela começará a pertencer-lhe realmente. Por enquanto, Dick está apenas usufruindo sua criação. As únicas coisas que podemos conservar são as que entregamos a Deus. As que guardamos para nós são as que perderemos com certeza.
A "bondade natural" - uma personalidade sadia e integrada — é uma coisa excelente. Por todos os meios que a medicina, a educação, a economia e a política nos põem à disposição, temos de procurar produzir um mundo em que o maior número possível de pessoas cresçam "boas" - assim como temos de tentar produzir um mundo em que todos tenham o bastante para comer. Mas não devemos pensar que, mesmo que nos fosse possível fazer com que todos fossem bons, estaríamos salvando as almas de todos. Deus se fez homem para que as criaturas se tornassem filhos: não simplesmente para produzir homens melhores do tipo antigo, mas para produzir um novo tipo de homem. É como se, em vez de ensinar um cavalo a saltar cada vez melhor e mais alto, nós o tornássemos uma criatura alada. E claro que, quando suas asas crescessem, ele voaria por sobre cercas que nenhum cavalo poderia saltar, e assim venceria o cavalo natural no seu próprio território. Mas haveria um período, quando as asas ainda estivessem apenas começando a crescer, em que não poderia fazer isso; e, nesse estágio, as protuberâncias nos ombros — ninguém seria capaz de dizer, pelo simples olhar, que viriam a transformar-se em asas - poderiam até dar-lhe uma aparência canhestra. (Lewis, Cristianismo Puro e Simples, Cap. 10)
6. Há um purgatório após a morte
"Claro que eu oro pelos mortos. A ação é tão espontânea, quase que de modo inevitável, somente o caso teológico mais compulsivo contra ela me impediria.. E eu mal sei como o resto das minhas orações iria sobreviver se aquelas para os mortos fossem proibidas. Na nossa idade, a maioria daqueles que mais amamos estão mortos. Que tipo de comunicação com Deus eu poderia ter se o que eu mais amo fosse imencionável a Ele? Eu acredito no Purgatório. Parto do princípio de que o processo de purificação normalmente envolverá sofrimento. Em parte pela tradição; em parte porque a maioria dos bens reais que me foram feitos nesta vida o envolveram. Mas eu não acho que o sofrimento é o objetivo da purgação. Eu posso muito bem acreditar que as pessoas nem muito pior nem muito melhor do que eu vão sofrer menos do que eu ou mais. . . . O tratamento dado será o necessário, quer doa pouco ou muito. A minha imagem predileta em relação a esse assunto é o da cadeira de um dentista. Espero que quando o dente da vida for arrancado e eu “voltar a mim mesmo”, uma voz dirá, “enxágue a sua boca com isso”. Isso é o purgatório. O enxágue pode durar mais do que eu imagino. A sensação do enxaguante pode ser mais ardente ou adstringente que a minha sensibilidade poderia suportar, mas…tal enxaguante não será nem repugnante nem indigno".
(C. S. Lewis, Cartas a Malcolm: Principalmente sobre a oração)
- a igreja católica ensina que todo cristão é livre por Cristo das penas eternas , mas não das temporais, as quais deve passar nesta vida. Mas se morrer sem passar por elas, por cuausa do s chamados pecados veniais, deve passar por elas no purgatório.
- Já Lewis acreditava que todo salvo deveria passar por um estagio pós morte restaurativo., pois não tinha uma finalidade de cumprir uma pena temporal , mas era puramente restaurativo, visava a santificação plena.
- O catolicismo ensina que o purgatório visa o perdão dos pecados veniais
- Já Lewis não acreditava que o purgatório perdoava o pecado mas trazia santificação plena.
- O catolicismo acreditava na expiação no purgatório.
- Lewis não acreditava na expiação no purgatório
- A igreja católica ensinava que as indulgências oferecidas pelo Papa, esmolas e obras de penitências
- Já Lewis não cria que indulgencias do Papa ou esmolas ou obras de penitênica diminuiam o tempo de estada no purgatório por causa das penas.
"Como essas definições protestantes nunca passaram, entretanto, de convenções humanas — e os próprios evangélicos o admitem —, Lewis aparentemente não via problema algum em dar crédito à doutrina católica sobre o Purgatório. Sua confissão é manifesta na obra Letters to Malcolm: Chiefly on Prayer, publicada postumamente em 1964" :...
A visão do autor anglicano tinha seus aspectos pessoais, é verdade. C. S. Lewis se incomodava, por exemplo, com as descrições fortes que São Thomas More e São João Fisher faziam do Purgatório, pois tinha a impressão de que as penas pareciam mais de um "Inferno temporário" que de um lugar propriamente de purificação. Agradava-lhe, ao contrário, o que ia retratado na obra poética The Dream of Gerontius, do Beato John Henry Newman, onde "a alma salva, bem aos pés do trono de Deus, implora para ser levada embora e purificada, sem poder suportar mais um momento sequer que a sua escuridão seja confrontada por aquela luz".
Precisamente nisso consiste o Purgatório. Como explicou certa vez o Papa Bento XVI, apresentando a conhecida doutrina de Santa Catarina de Gênova, "Deus é tão puro e santo que a alma com as manchas do pecado não pode encontrar-se na presença da majestade divina". Por isso, "os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não estão completamente purificados, embora tenham garantida sua salvação eterna, passam, após sua morte, por uma purificação, a fim de obter a santidade necessária para entrar na alegria do Céu" (Catecismo da Igreja Católica, § 1030) — santidade "sem a qual ninguém verá o Senhor" (Hb 12, 14). https://padrepauloricardo.org/blog/c-s-lewis-um-protestante-que-acreditava-no-purgatorio
Padre Paulo Ricardo despreza tudo que disse acima e cita o parágrafo 1030 do catecismo que ressalta que após o purgatório a pessoa fica santificada, mas Lewis não crê que no purgatório se paga pena temporal, ou que vão para lá as pessoas que morrem com pecados veniais sem confessar ou que lá se dá o perdão dos pecados. Mas para ele o "purgatório" é estágio obrigatório a todos os salvos.
A igreja católica afirma que aqueles salvos que não tem penas temporais de seus pecados vão para o céu, ou seja, não vão para o purgatório, neste caso a santificação pós morte é imediata. Os protestantes em geral creem que todos os salvos, após a morte tem uma santificação imediata, ou seja, passam uma "purgação" imediata. C S Lewis achava que não era imediato, para ele a santificação plena não era imediata.
"AS PENAS DO PECADO
1472. Para compreender esta doutrina e esta prática da Igreja, deve ter-se presente que o pecado tem uma dupla consequência. O pecado grave priva-nos da comunhão com Deus e, portanto, torna-nos incapazes da vida eterna, cuja privação se chama «pena eterna» do pecado. Por outro lado, todo o pecado, mesmo venial, traz consigo um apego desordenado às criaturas, o qual precisa de ser purificado, quer nesta vida quer depois da morte, no estado que se chama Purgatório. Esta purificação liberta do que se chama «pena temporal» do pecado. Estas duas penas não devem ser consideradas como uma espécie de vingança, infligida por Deus, do exterior, mas como algo decorrente da própria natureza do pecado. Uma conversão procedente duma caridade fervorosa pode chegar à total purificação do pecador, de modo que nenhuma pena subsista (82).
1473. O perdão do pecado e o restabelecimento da comunhão com Deus trazem consigo a abolição das penas eternas do pecado. Mas subsistem as penas temporais. O cristão deve esforçar-se por aceitar, como uma graça, estas penas temporais do pecado, suportando pacientemente os sofrimentos e as provações de toda a espécie e, chegada a hora, enfrentando serenamente a morte: deve aplicar-se, através de obras de misericórdia e de caridade, bem como pela oração e pelas diferentes práticas da penitência, a despojar-se completamente do «homem velho» e a revestir-se do «homem novo»
"III. A purificação final ou Purgatório
1030. Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não de todo purificados, embora seguros da sua salvação eterna, sofrem depois da morte uma purificação, a fim de obterem a santidade necessária para entrar na alegria do céu.
1031. A Igreja chama Purgatório a esta purificação final dos eleitos, que é absolutamente distinta do castigo dos condenados. A Igreja formulou a doutrina da fé relativamente ao Purgatório sobretudo nos concílios de Florença (622) e de Trento (623). A Tradição da Igreja, referindo-se a certos textos da Escritura (624) fala dum fogo purificador:
«Pelo que diz respeito a certas faltas leves, deve crer-se que existe, antes do julgamento, um fogo purificador, conforme afirma Aquele que é a verdade, quando diz que, se alguém proferir uma blasfémia contra o Espírito Santo, isso não lhe será perdoado nem neste século nem no século futuro (Mt 12, 32). Desta afirmação podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas neste mundo e outras no mundo que há-de vir» (625).
1032. Esta doutrina apoia-se também na prática da oração pelos defuntos, de que já fala a Sagrada Escritura: «Por isso, [Judas Macabeu] pediu um sacrifício expiatório para que os mortos fossem livres das suas faltas» (2 Mac 12, 46). Desde os primeiros tempos, a Igreja honrou a memória dos defuntos, oferecendo sufrágios em seu favor, particularmente o Sacrifício eucarístico para que, purificados, possam chegar à visão beatífica de Deus. A Igreja recomenda também a esmola, as indulgências e as obras de penitência a favor dos defuntos:
«Socorramo-los e façamos comemoração deles. Se os filhos de Job foram purificados pelo sacrifício do seu pai (627) por que duvidar de que as nossas oferendas pelos defuntos lhes levam alguma consolação? [...] Não hesitemos em socorrer os que partiram e em oferecer por eles as nossas orações» (628)." Catecismo Edição Típica Vaticana
1471. A doutrina e a prática das indulgências na Igreja estão estreitamente ligadas aos efeitos do sacramento da Penitência. O QUE É A INDULGÊNCIA? «A indulgência é a remissão, perante Deus, da pena temporal devida aos pecados cuja culpa já foi apagada; remissão que o fiel devidamente disposto obtém em certas e determinadas condições, pela acção da Igreja, a qual, enquanto dispensadora da redenção, distribui e aplica por sua autoridade o tesouro das satisfações de Cristo e dos santos» (79). «A indulgência é parcial ou plenária, consoante liberta parcialmente ou na totalidade da pena temporal devida ao pecado» (80). «O fiel pode lucrar para si mesmo as indulgências [...], ou aplicá-las aos defuntos» (81).1475. Na comunhão dos santos, «existe, portanto, entre os fiéis – os que já estão na pátria celeste, os que foram admitidos à expiação do Purgatório, e os que vivem ainda peregrinos na terra – um constante laço de amor e uma abundante permuta de todos os bens» (85). Nesta admirável permuta, a santidade de um aproveita aos demais, muito para além do dano que o pecado de um tenha podido causar aos outros. Assim, o recurso à comunhão dos santos permite ao pecador contrito ser purificado mais depressa e mais eficazmente das penas do pecado1478. A indulgência obtém-se mediante a Igreja que, em virtude do poder de ligar e desligar que lhe foi concedido por Jesus Cristo, intervém a favor dum cristão e lhe abre o tesouro dos méritos de Cristo e dos santos, para obter do Pai das misericórdias o perdão das penas temporais devidas pelos seus pecados. É assim que a Igreja não quer somente vir em ajuda deste cristão, mas também incitá-lo a obras de piedade, penitência e caridade» (88). 1479. Uma vez que os fiéis defuntos, em vias de purificação, também são membros da mesma comunhão dos santos, nós podemos ajudá-los, entre outros modos, obtendo para eles indulgências, de modo que sejam libertos das penas temporais devidas pelos seus pecados.1495. Por meio das indulgências, os fiéis podem obter para si próprios, e também para as almas do Purgatório, a remissão das penas temporais, consequência do pecado. Catecismo Católico Edição Típica Vaticana
Lewis acreditava não numa santificação pós morte imediata, mas que durava certo tempo, e por isso usou o nome de purgatório (que significa purificação- neste caso da natureza pecaminosa). Ele dizia que isso envolve sofrimento mas não era o objetivo (em contraste com o catolicismo), pois o objetivo era a santificação e não sofrer as penas temporais de pecados não confessados.
"Realmente devo divagar para lhe contar algumas boas notícias. Na semana passada, enquanto orava, descobri de repente - ou senti como se tivesse - que havia perdoado alguém que tento perdoar há mais de trinta anos. Tentando e rezando para que eu pudesse. Quando a coisa realmente aconteceu - repentina como a desejada interrupção do rádio de um vizinho - meu sentimento foi "Mas é tão fácil. Por que você não fez isso há muito tempo?" Muitas coisas são feitas facilmente no momento em que você pode fazê-las. Mas até então, completamente impossível, como aprender a nadar. Há meses durante os quais nenhum esforço o manterá acordado; então vem o dia, a hora e o minuto após os quais, e sempre depois, torna-se quase impossível afundar. Também me parecia que perdoar (a crueldade daquele homem) e ser perdoado (meu ressentimento) eram a mesma coisa. " O importante é que uma discórdia foi resolvida e certamente foi o grande Resolvedor que o fez. Finalmente, e talvez o melhor de tudo, acreditei de novo no que nos é ensinado na parábola do Juiz Injusto. Nenhum mau hábito está tão arraigado nem por tanto tempo orado contra (como parecia) em vão, que não possa, mesmo na velhice seca, ser levado embora. O importante é que uma discórdia foi resolvida e certamente foi o grande Resolvedor que o fez. Finalmente, e talvez o melhor de tudo, acreditei de novo no que nos é ensinado na parábola do Juiz Injusto. Nenhum mau hábito está tão arraigado nem por tanto tempo orado contra (como parecia) em vão, que não possa, mesmo na velhice seca, ser levado embora.Eu me pergunto, os mortos há muito tempo sabem disso quando nós, finalmente, após incontáveis fracassos, conseguimos perdoá-los? Seria uma pena se não o fizessem. Um perdão dado, mas não recebido, seria frustrado. O que me leva à sua pergunta.
Claro que rezo pelos mortos. A ação é tão espontânea, quase inevitável, que apenas o caso teológico mais compulsivo contra ela me deteria. E eu mal sei como o resto de minhas orações sobreviveriam se aquelas pelos mortos fossem proibidas. Em nossa idade, a maioria das pessoas que mais amamos está morta. Que tipo de relação com Deus eu poderia ter se o que eu mais amo não fosse mencionado por Ele?
Na visão protestante tradicional, todos os mortos são condenados ou salvos. Se eles estão condenados, orar por eles é inútil. Se eles são salvos, é igualmente inútil. Deus já fez tudo por eles. O que mais devemos perguntar?
Mas não acreditamos que Deus já fez e já está fazendo tudo o que pode pelos vivos? O que mais devemos perguntar? No entanto, somos instruídos a perguntar. "Sim", será respondido, "mas os vivos ainda estão no caminho. Outras provações, desenvolvimentos, possibilidades de erro, os aguardam. Mas os salvos foram aperfeiçoados. Eles terminaram o curso. Orar por eles pressupõe que o progresso e a dificuldade ainda são possíveis. Na verdade, você está trazendo algo como o Purgatório. "
Bem, suponho que sim. Embora mesmo no Céu algum aumento perpétuo de bem-aventurança, alcançado por uma auto-entrega cada vez mais extática, sem a possibilidade de fracasso, mas não talvez sem seus próprios ardores e esforços - pois o deleite também tem suas severidades e subidas íngremes, como os amantes sabem- -Pode ser suposto. Mas não vou pressionar, ou adivinhar, esse lado no momento. Eu acredito no Purgatório.
Veja bem, os reformadores tinham bons motivos para lançar dúvidas sobre "a doutrina romanista a respeito do purgatório" como essa doutrina romana havia se tornado. Não me refiro apenas ao escândalo comercial. Se você passar do Purgatório de Dante para o século XVI, ficará horrorizado com a degradação. Na súplica das almas, de Thomas More, o purgatório é simplesmente um inferno temporário. Nele as almas são atormentadas por demônios, cuja presença é "mais horrível e dolorosa para nós do que a própria dor". Pior ainda, Fisher, em seu Sermão sobre o Salmo VI, diz que as torturas são tão intensas que o espírito que as sofre não pode, por dor, "lembrar-se de Deus como ele deve fazer". Na verdade, a própria etimologia da palavra purgatório sumiu de vista. Suas dores não nos aproximam de Deus, mas nos fazem esquecê-Lo. É um lugar não de purificação, mas puramente de punição retributiva.
A visão correta retorna magnificamente no Sonho de Newman . Lá, se bem me lembro, a alma salva, bem ao pé do trono, implora para ser tirada e purificada. Não pode suportar por mais um momento "Com sua escuridão para afrontar aquela luz." A religião reivindicou o purgatório.
Nossas almas exigem o purgatório, não é? Não quebraria o coração se Deus nos dissesse: "É verdade, meu filho, que seu hálito cheira e seus trapos gotejam lama e lodo, mas somos caridosos aqui e ninguém vai repreender você com essas coisas, nem puxar longe de você. Entre na alegria. "? Não deveríamos responder: "Com submissão, senhor, e se não houver objeção, eu sim ser limpo em primeiro lugar." "Pode doer, você sabe" - "Mesmo assim, Senhor."
Presumo que o processo de purificação normalmente envolverá sofrimento. Em parte pela tradição; em parte porque a maior parte do bem real que me foi feito nesta vida envolveu isso. Mas não acho que o sofrimento seja o propósito da purgação. Posso muito bem acreditar que as pessoas nem muito piores nem muito melhores do que eu sofrerão menos do que eu ou mais. "Nada de absurdo sobre o mérito." O tratamento dado será o necessário, doa pouco ou muito.
Minha imagem favorita sobre esse assunto vem da cadeira do dentista. Espero que quando o dente da vida for arrancado e eu estiver "voltando", uma voz diga: "Enxágue sua boca com isso." Este será o Purgatório. O enxágue pode demorar mais do que posso imaginar agora. O gosto disso pode ser mais ardente e adstringente do que minha sensibilidade atual poderia suportar. Mas More e Fisher não devem me persuadir de que será nojento e profano.
Sua própria dificuldade peculiar - que os mortos não chegaram a tempo - é outra questão.
Como você sabe que eles não são? Certamente acredito que ser Deus é desfrutar de um presente infinito, onde nada passou e nada está por vir. Segue-se que podemos dizer o mesmo de santos e anjos? Ou pelo menos exatamente igual? Os mortos podem experimentar um tempo que não é tão linear quanto o nosso - pode, por assim dizer, ter espessura e também comprimento. Já nesta vida, ganhamos certa espessura sempre que aprendemos a cuidar de mais de uma coisa ao mesmo tempo. Pode-se supor que isso tenha aumentado em alguma medida, de modo que, embora, para eles como para nós, o presente esteja sempre se tornando passado, cada presente contém inimaginavelmente mais do que o nosso.
Eu sinto - você pode descobrir para mim e me dizer se é mais do que um sentimento - que tornar a vida dos abençoados mortos estritamente atemporal é inconsistente com a ressurreição do corpo.
Novamente, como você e eu concordamos, quer oremos em nome dos vivos ou dos mortos, as causas que impedirão ou excluirão os eventos pelos quais oramos já estão em ação. Na verdade, eles fazem parte de uma série que, suponho, remonta à criação do universo. As causas que tornavam a doença de George trivial já estavam agindo enquanto orávamos a respeito; se fosse o que temíamos, as causas disso teriam funcionado. É por isso que, segundo afirmo, nossas orações são concedidas, ou não, na eternidade. A tarefa de encaixar as histórias espirituais e físicas do mundo uma na outra é realizada no próprio ato total da criação. Nossas orações e outros atos livres são conhecidos por nós apenas quando chegamos ao momento de realizá-los. Mas eles estão eternamente na partitura da grande sinfonia. Não "pré permite a noção de eternidade simplesmente como um tempo mais antigo. Pois embora não possamos experimentar nossa vida como um presente infinito, somos eternos aos olhos de Deus; isto é, em nossa realidade mais profunda. Quando digo que estamos "no tempo", não quero dizer que estejamos, impossivelmente, fora do presente infinito em que Ele nos vê como vê tudo o mais. Quero dizer, nossa limitação de criatura é que nossa realidade fundamentalmente atemporal pode ser experimentada por nós apenas no modo de sucessão.
Na verdade, começamos colocando a questão de maneira errada. A questão não é se os mortos fazem parte da realidade atemporal. Eles são; o mesmo acontece com um relâmpago. A questão é se eles compartilham a percepção divina de atemporalidade.
Diga a George que eu ficaria encantado. Rendez-vous em meus quartos às 7h15. Não nos vestimos para jantar nas noites comuns." Cartas à Malcon. C S Lews.
Considerando o Purgatório como medicinal, ainda faria sentido interceder pelas almas, e isso seria essencialmente o mesmo que interceder pela santificação de alguém que ainda está vivo — como nas orações do apóstolo Paulo pela santificação e purificação dos cristãos ainda vivos, nas suas cartas (cf. Ef. 3:16-17; Fp. 1:9-11; Cl.1:11) —, mas a intercessão seria bem diferente da de um procurar livrar as almas das penas: não para que o Purgatório fosse suavizado, mas intensificado. Se isso significasse diminuição do tempo necessário, seria pelo motivo inverso.É certo que as definições dogmáticas mais antigas sobre o purgatório enfatizam indubitavelmente seu lado punitivo. Os Concílios de Lyon II (1274) e de Florença (1439) falam em “pena”, “satisfação”, “punição”, envolvendo, nas palavras de Sixto IV na bula Salvator noster (1476), a expiação das penas devidas segundo a justiça divina. Nesse universo doutrinal, é natural que as indulgências florescessem, pois elas se resumem à remissão de uma pena...É nessa purificação inconcebível “após a morte”, semelhante à purificação inconcebível que nos acontece ainda em vida, que C. S. Lewis localiza o Purgatório. Mesmo tendo escrito muito pouco sobre esses assuntos, uma coisa é indubitável: ele acreditava no Purgatório. No capítulo 20 das Cartas para Malcolm, ele escreveu alguns parágrafos sobre o Purgatório, ainda que dando razão às críticas dos reformadores à “doutrina romana do Purgatório”, pela degradação que observava nela, e ele julga a versão de Dante como bem melhor que a de Thomas More ou outras do período da Reforma. Para ele, a imagem “degradada” do Purgatório como lugar de agonia excruciante e companhia diabólica não faz justiça sequer ao nome: “Não é um lugar de purificação senão puramente de punição retributiva.”Eu não sei se C. S. Lewis leu o Tratado de Santa Catarina de Gênova, mas a imagem do Purgatório que ele propõe, ainda que não sem sofrimento, é puramente restaurativa. O sofrimento seria semelhante à dor provocada por um dentista: é um sofrimento necessário para a “cura”, mas ninguém deveria ir a um dentista com um propósito de sofrer ou pagar uma pena. ...Correta ou incorreta, a doutrina protestante clássica da “justiça imputada” através da “substituição penal” não provoca nenhum problema ao Purgatório restaurativo de Lewis, desde que se faça a distinção, também essencial à doutrina protestante, entre justificação e santificação: a justificação, nessa teologia, diz respeito principalmente ao perdão misericordioso dos nossos pecados, e a santificação, principalmente ao nosso crescimento no amor divino. O Purgatório de C. S. Lewis não visa completar nossa justificação, nosso “perdão”, nossa “expiação”, mas apenas nossa santificação. Nada acrescenta àquilo que Cristo fez por nós e fora de nós (extra nos), mas apenas recebe a ação dele em nós (in nobis), pois a salvação envolve as duas coisas.Minha convicção é de que esse Purgatório restaurativo é inteiramente defensável na teologia, e totalmente coerente com a doutrina protestante da justificação pela fé. É certo que, do ponto de vista do método (Sola Scriptura), ninguém encontrará qualquer declaração clara da Escritura Sagrada a esse respeito, mas parte do ofício da Teologia é explicitar o que está implícito na Escritura — como a divindade do Espírito Santo, por exemplo —, e parte do trabalho da Tradição é preservar essa sabedoria. O princípio Sola Scriptura, nas suas formulações clássicas, como aquela dos 39 Artigos da Igreja Anglicana, envolve tanto a doutrina explícita quanto a doutrina implícita na Escritura. https://vineadei.wordpress.com/2018/11/15/o-purgatorio-de-c-s-lewis-uma-defesa-breve/
Conclusões:
Todos concordam que após a morte há uma santificação plena dos salvos.
Os protestantes em geral acreditavam que isso se dá de forma imediata, há uma purgação imediata.
C S Lewis acreditava que a santificação plena não era imediata após a morte , mas durava um tempo determinado.
O purgatório católico é retributivo, visa que a pessoa que morreu com pecados veniais sofra as penas desses pecados e somente depois vai para o céu., após uma santificação plena. Já os outros salvos por já terem sofrido as penas de seus pecados na terra não vão para lá e tem uma santificação imediata.
Dizer que C S Lewis acreditava numa doutrina católica do purgatório é desconhecer ou o catolicismo ou o que C S Lewis acreditava.
A doutrina de santificação plena não imediata pós morte (ou mediata) não contradiz a justificação ou santificação judicial plena, mas não vejo fundamento bíblico para a mesma.
Em primeiro lugar, Lewis era um estudante do pastor e autor universalista George MacDonald (14, 15), no entanto Lewis não aceitou plenamente o universalismo do seu mentor. Em vez disso, ele se tornou conhecido por propor uma ideia radicalmente diferente sobre o inferno.
"as portas do inferno são fechadas por dentro. Não quero dizer que os fantasmas não desejem sair do inferno, da maneira vaga como uma pessoa invejosa "deseja" ser feliz: mas eles certamente não querem nem sequer os primeiros estágios preliminares daquele auto-abandono através do qual a alma pode alcançar qualquer bem. Eles gozarão para sempre da horrível liberdade que exigiram, e são portanto auto-escravizados; da mesma maneira que os justos, para sempre submissos à obediência, se tornam através de toda eternidade cada vez mais livres." (Lewis, O Problema do Sofrimento)
Mesmo em relação a este exílio auto-imposto, Lewis estava inseguro sobre a sua eternidade, dizendo: "noto que Nosso Senhor, embora enfatizando os terrores do inferno com grande severidade, no geral não destaca a ideia de duração, mas de finalidade. A entrega ao fogo destruidor é geralmente tratada como o fim da história e não como o começo de outra nova. Não podemos duvidar que a alma perdida esteja eternamente fixada em sua atitude diabólica; mas se esta fixidez eterna implica numa duração sem fim - ou que dure mesmo - não podemos dizer." (Lewis, O Problema do Sofrimento)
Ele ainda postulou que o inferno pode ser simplesmente existência solitária, essencialmente, estar sozinho no cérebro de alguém: "Se [inferno] significa ser deixado para uma existência puramente mental, sem coisa alguma senão a própria inveja, lascívia, ressentimento, solidão e auto-conceito de alguém ou se ainda existe algum tipo de ambiente, algo que você chamar um mundo ou uma realidade, eu nunca pretendo saber. Mas eu não colocaria a questão na forma "eu acredito em um inferno real". A própria mente é real o suficiente. Se ele não parece totalmente real agora que é porque você sempre pode escapar um pouco para o mundo físico - olhar para fora da janela, fumar um cigarro, ir dormir. Mas quando não há nada para você, exceto sua própria mente (sem corpo para ir dormir, livros ou paisagem, nem sons, sem drogas) isso vai ser tão real como - como - bem, como um caixão é real para um homem enterrado vivo.
(Cartas de C. S. Lewis a Arthur Greeves (13 de Maio 1946))
Resposta:
Penso, entretanto, que pode ser demonstrado que ela é moral, mediante uma crítica das objeções geralmente feitas, ou sentidas, em relação à mesma.Primeiro, existe uma objeção, em muitas mentes, quanto à idéia de castigo retributivo como tal. Isto foi tratado parcialmente em outro capitulo. ... Imagine um homem que tenha ficado rico ou poderoso através de uma série contínua de traições e crueldades, explorando com fins puramente egoístas os sentimentos nobres de suas vítimas, rindo de sua ingenuidade; que, tendo alcançado assim o sucesso, faz uso dele para sua própria gratificação, cobiça e ódio e finalmente perde o último vestígio de honra entre malfeitores, traindo seus cúmplices e zombando de seus derradeiros momentos de desilusão desnorteada. Suponhamos, ainda, que ele faça tudo isso, não (como gostaríamos de imaginar) atormentado pelo remorso ou mesmo apreensão, mas comendo como um adolescente e dormindo como uma criança saudável um homem alegre, sadio, sem um cuidado no mundo. Confiante até o fim de que só ele encontrou a resposta para o enigma da vida, que Deus e o homem são tolos de quem se aproveitou, que seu modo de viver é completamente satisfatório, cheio de sucesso, inatacável. Temos de ser cuidadosos neste ponto. A menor indulgência da paixão vingativa é um pecado mortal. A caridade cristã aconselha-nos a empreender todos os esforços para a conversão de alguém assim: preferir a sua conversão, mesmo ao risco de nossa própria vida, talvez de nossa própria alma, do que o seu castigo; e preferir isso infinitamente. Mas esse não é o ponto. Suponhamos que ele não venha a converter-se, que destino no mundo eterno você consideraria adequado para ele? Será que pode realmente desejar que um indivíduo desse tipo, permanecendo como é (e ele deve ter capacidade para tanto se tiver livre-arbítrio), seja confirmado para sempre na sua felicidade presente deveria ele continuar, por toda eternidade, a manter-se perfeitamente convencido de que a última risada será sua? Se você não puder considerar isto como tolerável, será apenas a sua maldade apenas o despeito que impede que o faça? Ou você encontra agora esse conflito entre a justiça e a Misericórdia, que algumas vezes lhe pareceu uma parte obsoleta da teologia, atuando em sua mente, e tem a sensação de que ele vem do alto, e não de baixo? Você não é movido pelo desejo de ver sofrer essa miserável criatura, mas por uma exigência verdadeiramente ética de que, cedo ou tarde, o direito deve vencer, a bandeira deve ser plantada nessa alma tremendamente rebelde, mesmo que não seja seguida de uma vitória melhor e mais ampla. A própria misericórdia dificilmente poderia desejar que um indivíduo assim continue eternamente satisfeito em sua deplorável ilusão. Tomás de Aquino falou a respeito do sofrimento o mesmo que Aristóteles falou da vergonha: tratava-se de algo que não era bom em si mesmo, mas que poderia apresentar certos aspectos bons em determinadas circunstâncias. Isto é, se o mal está presente, a dor ao reconhecer o mal, sendo uma espécie de conhecimento, é relativamente boa; pois a alternativa seria que a alma ignorasse o mal, ou ignorasse que o mal é contrário à sua natureza, "sendo ambas", diz o filósofo, "manifestamente prejudiciais".(1) E penso que, embora tremendo, concordamos. A exigência de que Deus deva perdoar tal homem enquanto permaneça como é. está baseada numa confusão entre tolerar e perdoar. Tolerar um mal é simplesmente ignorá-lo, tratá-lo como se fosse um bem. Mas o perdão precisa ser tanto aceito como oferecido caso deva ser completo: e a pessoa que não admite culpa não pode aceitar perdão.Iniciei com o conceito de inferno como um castigo retributivo e positivo infligido por Deus, por ser essa a forma em que a doutrina é mais repelente, e queria tentar resolver a objeção mais forte. Mas, naturalmente, embora Nosso Senhor fale com freqüência do inferno como de uma sentença infligida por um tribunal, Ele também diz em outro ponto que o juízo consiste no próprio fato de que os homens preferem as trevas à luz, e que sua "palavra" e não Ele julga os homens.(2) Temos, portanto, liberdade desde que os dois conceitos, a longo prazo, significam a mesma coisa de pensar na perdição deste perverso, não como uma sentença imposta a ele, mas como o simples fato de ele ser o que é. A característica das almas perdidas é "sua rejeição de tudo que não seja simplesmente elas mesmas".(3) Nosso egoísta imaginário tentou transformar tudo o que encontra em umaprovíncia ou apêndice do EU. A preferência pelo outro, isto é, a própria capacidade de gozar do bem, é apagada nele exceto até o ponto em que seu corpo ainda o arrasta a um contato rudimentar com o mundo exterior. A morte remove este último contato. Ele alcança o que deseja viver inteiramente para si mesmo e tirar o melhor proveito do que descobre em seu interior. E o que encontra ali é o inferno.
Outra objeção se prende à aparente desproporção entre a danação eterna e o pecado transitório. Se pensarmos na eternidade como um simples prolongamento do tempo, é mesmo desproporcional. Mas muitos rejeitariam esta idéia de eternidade. Se pensarmos no tempo como uma linha que é uma boa imagem, porque as partes do tempo são sucessivas e duas delas não podem coexistir; i.e., não existe largura no tempo, apenas comprimentoprovavelmente pensaríamos na eternidade como sendo um plano ou mesmo um sólido. Assim sendo, toda a realidade de um ser humano seria representada por uma figura sólida.Esse sólido seria principalmente a obra de Deus, agindo através da graça e da natureza, mas o livre-arbítrio humano teria contribuído com a linha-base que chamamos de vida terrena: e se você traçar sua linha base torta, todo o sólido irá ficar no lugar errado. O fato de a vida ser curta ou, no símbolo, que contribuímos apenas com uma linha pequena e fina em toda figura complexa, poderia ser considerado como uma misericórdia divina. Pois se até mesmo o traçado dessa pequena linha, deixada ao nosso livre arbítrio, é tão mal feito que pode prejudicar o todo, quanto mais estragaríamos a figura se mais dela nos fosse confiado? Uma forma mais simples da mesma objeção consiste em dizer que a morte não deveria ser final, que deveria haver uma segunda oportunidade.' Acredito que se ummilhão de oportunidades tivessem qualquer probabilidade de ajudar, elas seriam dadas. Mas um professor sempre sabe, mesmo quando os alunos e os pais não sabem, que é realmente inútil fazer um estudante repetir uma determinada prova. O fim deve chegar um dia, e não é necessária uma fé muito forte para crer que a onisciência sabe quando deve ser esse dia.
Uma terceira objeção se concentra na terrível intensidade das penas do inferno como sugerido pela arte medieval e, sem dúvida, por algumas passagens das Escrituras. Von Hügel nos adverte aqui para não confundirmos a doutrina em si com as imagens mediante as quais é transmitida. Nosso Senhor fala do inferno sob três símbolos: primeiro, o do castigo ("castigo eterno" Mt 25:46); segundo, da destruição ("temam apenas, a Deus, que pode destruir no inferno a alma e o corpo juntos" Mt 10:28); e terceiro, da privação, exclusão e expulsão para as "trevas exteriores", como nas parábolas do homem que não tinha as roupas do casamento ou a das virgens sábias e das tolas. A imagem predominante do fogo é significativa porque combina as noções de tormento e destruição.É, porém, praticamente certo que todas essas expressões têm na verdade a intenção de sugerir algo indiscutivelmente horrível, e qualquer interpretação que não enfrente esse fato estará, conforme receio, errada desde o princípio. Não é, entretanto, necessárioconcentrar-se nas imagens de tortura, excluindo as que sugerem destruição e privação. O que pode ser então aquilo de que as três imagens são símbolo? A destruição, podemos naturalmente presumir, significa a eliminação ou aniquilação dos destruídos. E as pessoasfalam com freqüência como se a "aniquilação" de uma alma fosse possível. Em nossa experiência, porém, a destruição de uma coisa significa a emergência de outra. Queime um pedaço de madeira e terá gases, calor e cinzas. Ter sido um pedaço de madeira significa agora ser essas três coisas. Se a alma pode ser destruída, não haverá um estado de ter sido uma alma humana? E não é esse, talvez, o estado que é igualmente bem descrito como tormento, destruição e privação? Você estará lembrado de que, na parábola, os salvos vãopara um lugar preparado para eles, enquanto os perdidos vão para um lugar que não foi absolutamente feito para homens.(5)Entrar no céu é tornar-se mais humano do que jamais alguém o foi na terra; entrar no inferno é ser banido da humanidade. O que é lançado (ou se lança) no inferno não é um homem: são "refugos". Ser um homem completo significa ter as paixões obedientes à vontade e essa vontade oferecida a Deus: ter sido um homem ser um ex-homem ou um "fantasma perdido" iria presumivelmente significar consistir de uma vontade completamente voltada para o Eu e paixões não controladas pela vontade. Torna-se, naturalmente, impossível imaginar com o que a consciência de tal criatura já então umagregado indefinido de pecados mutuamente antagônicos em lugar de um pecador poderia comparar-se.Pode haver grande parte de verdade no ditado: "o inferno é inferno, não de seu próprio ponto de vista, mas do ponto de vista celestial". Não acredito que isto interprete mal a severidade das palavras de Nosso Senhor. Somente aos condenados é que seu destinopoderia parecer menos do que insuportável. E deve ser admitido que, nestes últimos capítulos, à medida que pensamos na eternidade, as categorias de dor e prazer, que nos prenderam por tanto tempo, começam a retroceder, enquanto bens e males mais vastos surgem no horizonte. Nem a dor nem o prazer como tais têm a última palavra. Mesmo se fosse possível que a experiência (se pode ser chamada assim) dos perdidos não contivesse dor mas muito prazer; ainda assim, esse prazer negro seria de um tipo tal que faria qualquer alma, ainda não condenada, voar para as suas orações num terror de pesadelo: mesmo que houvesse sofrimentos no céu, todos os que têm entendimento os desejariam.
Uma quarta objeção é que nenhum homem caridoso poderia considerar-se abençoado no céu enquanto soubesse que uma única alma continuasse ainda no inferno; e se for assim, somos então mais misericordiosos que Deus? Por trás dessa objeção existe uma imagem mental de céu e inferno coexistindo numa época unilinear como coexistem as histórias da Inglaterra e América: dessa forma a cada momento os bem-aventurados poderiam dizer: "As misérias do inferno estão agora continuando". Mas eu noto que Nosso Senhor, embora enfatizando os terrores do inferno com grande severidade, no geral não destaca a idéia de duração, mas da palavra final. A entrega ao fogo destruidor é geralmente tratada como o fim da história e não como o começo de outra nova. Não podemosduvidar que a alma perdida esteja eternamente fixada em sua atitude diabólica; mas se esta fixidez eterna implica numa duração sem fim ou que dure mesmo não podemos dizer. O Dr. Edwyn Bevan faz algumas especulações interessantes sobre este ponto.(6) Sabemos muito mais sobre o céu do que sobre o inferno, pois o céu é o lar da humanidade e portanto contém tudo o que está implícito numa vida humana glorificada: mas o inferno não foi feito para homens. Ele não é de forma alguma paralelo ao céu, mas a"escuridão lá fora", a borda externa em que o ser se desvanece no nada.
Finalmente, é objetado que a perda final de uma única alma significa a derrota da onipotência. E assim é. Ao criar seres com livre arbítrio, a onipotência desde o início se submete à possibilidade de tal fracasso. O que você chama de derrota, eu chamo de milagre: pois criar algo que não a Si mesmo, e tornar-se assim, num certosentido, capaz de sofrer resistência por parte das obras de suas próprias mãos, é o mais surpreendente e inconcebível dos feitos que atribuímos à divindade. Acredito realmente que os perdidos são, de certa forma, rebeldes bem sucedidos até o fim; que as portas do inferno são fechadas por dentro. Não quero dizer que os fantasmas não desejem sair do inferno, da maneira vaga como uma pessoa invejosa "deseja" ser feliz: mas eles certamente não querem nem sequer os primeiros estágios preliminares daquele auto-abandono através do qual a alma, sozinha, pode alcançar qualquer bem. Eles gozarão para sempre da horrível liberdade que exigiram, e são portanto auto-escravizados; da mesma maneira que os justos, para sempre submissos à obediência, se tornam através de toda eternidade cada vez mais livres.
A longo prazo, a resposta a todos os que se opõem à doutrina do inferno é, em si mesma, uma pergunta: "O que você está querendo que Deus faça?" Apagar os pecados cometidos por eles no passado e permitir-lhes um novo começo, alisando toda dificuldade eoferecendo toda ajuda milagrosa? Mas Ele fez isso, no Calvário. Perdoá-los? Não podem ser perdoados. Abandoná-los? Sim, tenho medo de que é justamente isso que Ele faz. O problema do sofrimento. cap. 8
Nenhuma referência ao Demônio ou a demônios é feita em nenhum Credo cristão, e é bastante possível ser cristão sem acreditar neles. Eu acredito que tais seres existem, mas isso é problema meu. Supondo que eles existam, o grau de percepção humana com relação a eles varia muito. Isto é, quanto mais um homem está em poder do Demônio, menos ele estará consciente disso, da mesma forma que um homem está bem sóbrio na medida que ele reconhece que está bêbado. São as pessoas que estão completamente cônscias e tentando ser boas é que estão conscientes do Demônio. Só quando você começa se armar contra Hitler é que você percebe que seu país está cheio de agentes nazistas. É evidente que os demônios não querem que você acredite neles. Se os demônios existem, o primeiro objetivo deles é lhe aplicar um anestésico – para lhe fazer baixar a guarda. Somente se isso falhar é que você se torna consciente deles.
(Lewis, "Respostas a perguntas sobre o cristianismo," God in the Dock (Eerdmans:. 1970)
Resposta:
Como pôde o Poder das Trevas ter caído no erro? Para essa pergunta, sem dúvida, nós, seres humanos, não conseguimos formular uma resposta com absoluta certeza. Podemos, entretanto, oferecer um palpite razoável (e tradicionalmente aceito) baseado em nossas próprias experiências de erro. No momento em que possuímos um ego, temos a possibilidade de nos colocar em primeiro lugar - de querer ser o centro de tudo — de querer, na verdade, ser Deus. Esse foi o pecado de Satanás, e foi esse o pecado que ele ensinou à raça humana. Certas pessoas julgam que a queda do homem teve algo a ver com o sexo, mas estão enganadas. (A história contada no Livro do Gênesis sugere, isto sim, que nossa natureza sexual foi corrompida após a queda, como uma conseqüência desta, e não uma causa.) O que Satanás colocou na cabeça dos nossos remotos ancestrais foi a idéia de que poderiam "ser como deuses" — poderiam bastar-se a si mesmos como se fossem seus próprios criadores; poderiam ser senhores de si mesmos e inventar um tipo de felicidade fora e à parte de Deus. Dessa tentativa, que não pode dar certo, vem quase tudo o que chamamos de história humana: o dinheiro, a miséria, a ambição, a guerra, a prostituição, as classes, os impérios, a escravidão - a longa e terrível história da tentativa do homem de descobrir a felicidade em outra coisa que não Deus....
Essa é a chave da história humana. Despende-se uma energia incrível, erguem-se civilizações, concebem-se excelentes instituições, mas algo sempre dá errado. Uma falha fatal sempre permite que as pessoas mais egoístas e cruéis subam ao poder, trazendo a derrocada, a desgraça e a ruína. A máquina, em outras palavras, emperra, Ela parece engrenar bem e rodar por alguns metros, mas então se quebra. Tentamos fazê-la funcionar com o combustível errado. E isso que Satanás fez para nós, seres humanos. Cristianismo Puro e Simples .cap. 3
2) A origem do sofrimento animal poderia ser traçada, por gerações anteriores, até a Queda do homem o mundo inteiro foi contagiado pela rebelião destrutiva de Adão. Isto agora é, entretanto, impossível, pois temos boa razão para crer que os animais existiram muito antes do homem. O ato de comer carne, com tudo que ele envolve, é mais antigo que a humanidade. E então impossível neste ponto deixar de lembrar de uma história sagrada que, embora não esteja incluída nos credos, tem sido amplamente divulgada na Igreja e parece estar implícita em vários pronunciamentos dominicais, paulinos e joaninos estou me referindo à história de que o homem não foi a primeira criatura a rebelar-se contra o Criador mas que um ser mais antigo e poderoso há muito tempo tornou-se apóstata e é agora o imperador das trevas e (significativamente) o Senhor deste mundo....Assim sendo, se Nosso Senhor tivesse feito qualquer declaração científica ou histórica que soubéssemos ser falsa, isto não iria perturbar minha fé na sua divindade. Mas a doutrina da existência e queda de Satanás não está entre as coisas que sabemos ser inverídicas: ela não contradiz os fatos descobertos pela ciência, mas apenas o simples e vago "clima de opinião" em que acontece estarmos vivendo. Eu, de minha parte, tenho um conceito muito baixo dos 'climas de opinião". Quanto ao que lhe diz respeito, todo homem sabe que todas as descobertas são feitas e todos os erros corrigidos por aqueles que ignoram o "clima de opinião".Parece-me, portanto, uma suposição razoável, que algum extraordinário poder criado já estivesse operando para o mal no universo material, ou no sistema solar, ou pelo menos, no planeta Terra, muito antes de o homem ter entrado em cena: e que quando o homem caiu, alguém na verdade o tentou. Esta hipótese não é introduzida como uma "explicação do mal" generalizada: ela dá apenas uma aplicação mais ampla ao princípio de que o mal surge do abuso do livre arbítrio. (Lewis, O Problema do Sofrimento- Cap. 8)
PARA A SRA. EDWARD A. ALLEN: do Magdalen College1º de novembro de 1954Penso que seria perigoso supor que Satanás tenha criado todas as criaturas que sejam desagradáveis ou perigosas para nós, pois (a) estas criaturas, se elas pudessem pensar, teriam a mesma razão para pensar que nós é que fomos criados por Satanás. (b) Não acho que o mal possa criar, no sentido estrito. Ele pode estragar algo que outro tenha criado. Satanás pode ter corrompido outras criaturas da mesma forma que a nós. Parte de corrupção em nós pode ser o horror irracional e desgosto que sentimos por algumas criaturas, bem à parte de qualquer prejuízo que elas possam nos causar. (Eu não suporto aranhas.) Temos base bíblica para supor que Satanás cause doenças — ver Lucas 13:16.
"No meu ponto de vista é preciso aplicar algo do mesmo tipo de explicação para, digamos, as atrocidades (e traições) de Josué. Eu vejo o grave perigo que corremos ao fazê-lo; mas os perigos de acreditar em um Deus que não podemos mais considerarmos como maligno, e , em seguida, em mera bajulação aterrorizada chama-lo de "bom" e adora-lo, é ainda mais perigoso. A pergunta final é se a doutrina da bondade de Deus ou da infalibilidade das Escrituras que deve prevalecer quando entram em conflito. Eu acho que a doutrina da bondade de Deus é a mais certa das duas. De fato, somente essa doutrina torna essa adoração a Ele obrigatória ou até mesmo permissível. Para isso alguns vão responder 'ah, mas estamos caídos e não reconhecemos o bem quando a vemos.' Mas o próprio Deus não diz que estamos tão caídos em tudo isso" (Lewis, Carta aos Beversluis)
10. A Bíblia é em parte humana e tem erros
"A principal dificuldade parece-me não a questão de saber se a Bíblia é 'inspirada', mas o que exatamente queremos dizer com isto. Nossos ancestrais, eu considero, acreditavam que o Espírito Santo apenas substituiu as mentes dos autores (como o suposto 'controle' na escrita automática) ou pelo menos ditou a eles como que a secretários. A própria Escritura refuta essas idéias. ... Eu penso nisso como análogo à Encarnação - que, como em Cristo uma alma-e-corpo humanos são tomados e fazem o veículo da Divindade =, de modo que na Escritura, uma massa de lenda humana, história, ensino moral, etc., são tomadas fazem o veículo da Palavra de Deus. Erros de menor importância estão autorizados a permanecer. (foi Nosso Senhor mesmo incapaz, [como] Homem, de tais erros? Seria uma encarnação humana real se ele fosse?) é preciso lembrar que a nossa atenção moderna e ocidental para datas, números, etc., simplesmente não existia no mundo antigo. Ninguém estava olhando para esse tipo de verdade."
(Lewis, para Lee)
Em relação aos evangelhos, ele não acreditava que eles eram palavra divina, ou infalíveis, mas relatórios bastante humanos:
"Podemos observar que o ensino de Nosso Senhor, em que não há nenhuma imperfeição, não nos é dado daquela maneira sistemática, infalível e sistemática que poderíamos ter esperado ou desejado. Ele não escreveu livros. Temos apenas palavras relatadas, a maioria delas proferidas em resposta a perguntas, formadas em algum grau pelo seu contexto. E quando recolhemos todas elas, não podemos reduzi-las a um sistema. ... Ela não estará, da forma que queremos, "presas".
Resposta:
"As qualidades humanas das matérias-primas mostram do princípio ao fim. Ingenuidade, erro, contradição, mesmo maldade (como nos Salmos Imprecatórios) não são removidos. O resultado total não é "a Palavra de Deus" no sentido de que cada passagem, em si, dá ciência ou história impecáveis. Ela carrega a Palavra de Deus; e nós (sob a graça, com atenção à tradição e aos intérpretes mais sábios do que nós mesmos, e com o uso de tal inteligência e aprendizado como podemos ter) recebemos essa palavra dela não a usando como uma enciclopédia ou uma encíclica, mas embebendo-nos em seu tom ou serenidade e assim aprender a sua mensagem geral."
(Lewis, Reflexões sobre os Salmos)
Ele se referia aos erros das pessoas registrados nas Escrituras, por exemplo:
No entanto, deve haver alguma forma cristã de se fazer uso deles; isso se, pelo menos, ainda crermos (como eu creio) que toda a Sagrada Escritura é, de algum modo - embora isso não se aplique da mesma maneira a todas as suas partes -, a Palavra de Deus (posteriormente explicarei a maneira como entendo isso). p. 27
1. A distinção que São Paulo faz em 1 Coríntios 7 entre ouk ego all’ ho kurios [não eu, mas o Senhor] (v. 10) e ego lego oux ho kurios [digo eu, não o Senhor] (v. 12).
2. As aparentes inconsistências entre as genealogias de Mateus 1 e Lucas 2; com os relatos da morte de Judas em Mateus 27:5 e Atos 1:18-19.
3. O próprio relato de São Lucas de como ele obteve o seu material (1:1-4).
4. A não-historicidade universalmente admitida (não digo, é claro, falsidade) de pelo menos algumas das narrativas nas Escrituras (as parábolas), que podem muito bem também se estender a Jonas e Jó.
5. Se todo dom bom e perfeito vem do Pai das luzes, então, todos os verdadeiros e edificantes escritos, quer na Escritura ou não, devem ser em algum sentido inspirados.
6. João 11:49-52 - A inspiração pode operar em um homem mau, sem ele saber, e ele pode, então, pronunciar a mentira que ele pretende (propriedade de fazer um homem inocente um bode expiatório político), bem como a verdade que não pretende (o sacrifício divino).
Parece-me que 2 e 4 descartam a ideia de que cada declaração nas Escrituras deve ser verdade histórica. E 1, 3, 5, e 6, impedem a visão de que a inspiração é uma coisa simples no sentido de que, se presente como um todo, esteja sempre presente no mesmo modo e mesmo grau. Portanto, eu acho, descarta a ideia de que qualquer passagem tomada isoladamente pode ser assumida como sendo inerrante exatamente no mesmo sentido como qualquer outra: por exemplo, que o número dos exércitos no V. T. (que, tendo em conta a dimensão do país, se for verdade, envolvem milagre contínuo) são estatisticamente corretos, porque a história da Ressurreição é historicamente correta. Que a operação de soberana da Escritura é transmitir a Palavra de Deus para o leitor (ele também precisa de sua inspiração) que a ler no espírito correto, eu acredito plenamente. Que ela também dá respostas verdadeiras para todas as perguntas (muitas vezes religiosamente irrelevantes) que ele poderia fazer, eu não sei. O próprio tipo de verdade que muitas vezes estamos exigindo, na minha opinião, nem foi sequer prevista pelos antigos.
(Lewis citado em Michael J. Christensen, C. S. Lewis na Escritura)
PARA O PROFESSOR CLYDE S. KILBY: do Magdalene College (Professor Kilby diz da carta a seguir: “Escrita depois que eu lhe enviei uma cópia da declaração do Wheaton College relativa àinspiração da Bíblia e solicitei sua opinião”)7 de maio de 1959
Incluo aqui, em poucas palavras, o que eu me sinto capacitado a dizer quanto a esta questão. Se de qualquer forma isso poderia entristecer alguém, jogue na lata de lixo. Lembre-se ainda que éapenas uma tentativa, menos de estabelecer uma visão, do que uma afirmação sobre o assunto que cheguei a trabalhar, quer seja com acerto ou erro. Para mim, a coisa curiosa é que, nem em minha própria leitura da Bíblia, nem em minha vida religiosa como um todo, a questão jamais assume de fato aquela importância que ela sempre recebe nas controvérsias teológicas. A diferença entre ler a história de Rute e aquela de Antígona — ambos de primeira classeenquanto literatura — é para mim inequívoca e impressionante. Mas a questão “É Rute histórica?” (não tenho motivo para supor que não seja) não parece realmente surgir se não posteriormente. Ela pode, até onde posso enxergar, continuar agindo em mim como a Palavra de Deus, mesmo se não for.
Todas as Escrituras Sagradas são escritas para nosso aprendizado. Mas aprendizado de quê? Penso que o valor de algumas coisas (por exemplo, a Ressurreição) dependem de se elas realmente aconteceram, mas o valor de outras (por exemplo, o destino da esposa de Ló) dificilmente o fariam. E aquelas cuja historicidade importa são como a vontade de Deus, que deixa isso claro […].Qualquer que seja a visão que sustentemos sobre a autoridade divina das Escrituras, ela tem que dar lugar aos seguintes fatos:1. A distinção que o apóstolo Paulo faz em I Coríntios 7, entre ουχι εγω αλλ’ ο Κυριος (10) e εγω λεγω, ουχι ο Κυριος (12).802. As aparentes inconsistências entre as genealogias em Mateus 1 e Lucas 3: com os relatos da morte de Judas em Mateus 27:5 e Atos 1:18–19.3. O relato do próprio Lucas de como ele obteve sua matéria (1:1–4).4. A a-historicidade admitida universalmente (eu não estou dizendo, é claro, que é falsidade) de ao menos algumas narrativas nas Escrituras (as parábolas), que podem ser estendidas muito bemtambém para Jonas e Jó.5. Se todo dom bom e perfeito vem do Pai das Luzes, então todos os escritos verdadeiros e edificantes devem, em algum sentido, ser inspirados.6. João 11:49–52. A inspiração pode operar num homem perverso sem que ele o soubesse, e ele pode então proferir a mentira que ele pretende (propriedade de tornar um homem inocente em um bode expiatório) bem como a verdade que ele não pretendia (o sacrifício divino).
Parece-me que 2 e 4 descartam a visão de que toda a declaração nas Escrituras devesse ser verdade histórica.
E 1, 3, 5 e 6 descartam a visão de que a inspiração seja uma coisa única no sentido de que, se é que está presente, é sempre da mesma forma e no mesmo grau. Daí que, penso eu, isso descarte a visão de que qualquer passagem, tomada isoladamente, possa ser presumida de ser inerrante exatamente no mesmo sentido que qualquer outra: por exemplo, que os números dos exércitos do AT (que em vista do tamanho do país, se verdadeiros, envolvem milagres contínuos) estejam estatisticamente corretos, só porque a história da ressurreição seja historicamente correta. Eu acredito piamente que a operação global das Escrituras é de veicular a Palavra de Deus para o leitor (ele também necessita de sua inspiração) que o lê com o espírito correto. Mas que ela também dê respostas verdadeiras para todas as questões (muitas vezes religiosamente irrelevantes) que ele possa perguntar, eu não creio. O próprio tipo de verdade que estamos muitas vezes demandando não era, em minha opinião, nem vislumbrada pelos antigos.
12. Outros livros, além de a Bíblia podem ser inspirados
Lewis não somente amplia sua visão de inspiração para incluir mitos do Antigo Testamento, mas ele também permitiu a "inspiração" de material extra-bíblico mais tardio. Ele escreveu (em uma carta de 07 de maio de 1959) para Clyde Kilby: "Se todo dom bom e perfeito vem do Pai das luzes, então todos os verdadeiros e edificantes escritos, quer na Escritura ou não, devem ser em algum sentido inspirados."
Resposta:
PARA O PROFESSOR CLYDE S. KILBY: do Magdalene College (Professor Kilby diz da carta a seguir: “Escrita depois que eu lhe enviei uma cópia da declaração do Wheaton College relativa àinspiração da Bíblia e solicitei sua opinião”)7 de maio de 1959
Incluo aqui, em poucas palavras, o que eu me sinto capacitado a dizer quanto a esta questão. Se de qualquer forma isso poderia entristecer alguém, jogue na lata de lixo. Lembre-se ainda que éapenas uma tentativa, menos de estabelecer uma visão, do que uma afirmação sobre o assunto que cheguei a trabalhar, quer seja com acerto ou erro. Para mim, a coisa curiosa é que, nem em minha própria leitura da Bíblia, nem em minha vida religiosa como um todo, a questão jamais assume de fato aquela importância que ela sempre recebe nas controvérsias teológicas. A diferença entre ler a história de Rute e aquela de Antígona — ambos de primeira classeenquanto literatura — é para mim inequívoca e impressionante. Mas a questão “É Rute histórica?” (não tenho motivo para supor que não seja) não parece realmente surgir se não posteriormente. Ela pode, até onde posso enxergar, continuar agindo em mim como a Palavra de Deus, mesmo se não for.
Todas as Escrituras Sagradas são escritas para nosso aprendizado. Mas aprendizado de quê? Penso que o valor de algumas coisas (por exemplo, a Ressurreição) dependem de se elas realmente aconteceram, mas o valor de outras (por exemplo, o destino da esposa de Ló) dificilmente o fariam. E aquelas cuja historicidade importa são como a vontade de Deus, que deixa isso claro […].Qualquer que seja a visão que sustentemos sobre a autoridade divina das Escrituras, ela tem que dar lugar aos seguintes fatos:1. A distinção que o apóstolo Paulo faz em I Coríntios 7, entre ουχι εγω αλλ’ ο Κυριος (10) e εγω λεγω, ουχι ο Κυριος (12).802. As aparentes inconsistências entre as genealogias em Mateus 1 e Lucas 3: com os relatos da morte de Judas em Mateus 27:5 e Atos 1:18–19.3. O relato do próprio Lucas de como ele obteve sua matéria (1:1–4).4. A a-historicidade admitida universalmente (eu não estou dizendo, é claro, que é falsidade) de ao menos algumas narrativas nas Escrituras (as parábolas), que podem ser estendidas muito bemtambém para Jonas e Jó.5. Se todo dom bom e perfeito vem do Pai das Luzes, então todos os escritos verdadeiros e edificantes devem, em algum sentido, ser inspirados.6. João 11:49–52. A inspiração pode operar num homem perverso sem que ele o soubesse, e ele pode então proferir a mentira que ele pretende (propriedade de tornar um homem inocente em um bode expiatório) bem como a verdade que ele não pretendia (o sacrifício divino).
Parece-me que 2 e 4 descartam a visão de que toda a declaração nas Escrituras devesse ser verdade histórica.
E 1, 3, 5 e 6 descartam a visão de que a inspiração seja uma coisa única no sentido de que, se é que está presente, é sempre da mesma forma e no mesmo grau. Daí que, penso eu, isso descarte a visão de que qualquer passagem, tomada isoladamente, possa ser presumida de ser inerrante exatamente no mesmo sentido que qualquer outra: por exemplo, que os números dos exércitos do AT (que em vista do tamanho do país, se verdadeiros, envolvem milagres contínuos) estejam estatisticamente corretos, só porque a história da ressurreição seja historicamente correta. Eu acredito piamente que a operação global das Escrituras é de veicular a Palavra de Deus para o leitor (ele também necessita de sua inspiração) que o lê com o espírito correto. Mas que ela também dê respostas verdadeiras para todas as questões (muitas vezes religiosamente irrelevantes) que ele possa perguntar, eu não creio. O próprio tipo de verdade que estamos muitas vezes demandando não era, em minha opinião, nem vislumbrada pelos antigos.
13. Jesus encarnado era um homem, capaz de errar
"Diga o que quiser", que deve ser dito, "as crenças apocalípticas dos primeiros cristãos provou ser falsa. É evidente a partir do Novo Testamento que todos eles esperavam a Segunda Vinda em sua própria vida. E pior ainda, tinham um motivo, e um que você vai achar muito embaraçoso: Seu Mestre lhes tinha dito isso. Ele compartilhou, e de fato criou, a ilusão deles. Ele disse em tantas palavras, "esta geração não passará até que todas estas coisas aconteçam". E ele estava errado. Ele claramente não sabia mais sobre o fim do mundo do que qualquer outra pessoa." Esse é certamente o verso mais embaraçoso na Bíblia. No entanto, como provocação, também, que, dentro de catorze palavras de que deve vir a afirmação: "Mas a respeito daquele dia e hora ninguém sabe, não, nem os anjos que estão no céu, nem o Filho, senão o Pai." (Lewis, A última noite do mundo)
A única exposição de erro e uma confissão de ignorância [Marcos 13:32] crescem lado a lado. Que eles estavam assim, pela boca do próprio Jesus e não foram simplesmente introduzidos, dessa forma, pelo relator, certamente não precisamos ter dúvida .... Os fatos, então, são estes: que Jesus se declarou (em algum sentido) ignorante, e dentro de um momento mostrou que Ele realmente era assim".(Lewis, A última noite do mundo).
Resposta:
QUAL É O PONTO?
Por que estou escrevendo este artigo? Qual poderia ser a razão para colocar esta informação pouco edificante, depreciativa lá fora?? Existem algumas opções possíveis, vamos considerá-las:
1. "C. S. Lewis é um herege, aqui está uma lista de suas heresias, você deve parar de ser enganado e me ouvir em vez disso. Eu sou mais inteligente, mais sábio e santo! "
Não, certamente, este não é o meu ponto ou intenção.
2. "C. S. Lewis é incrível, aqui está uma lista de suas crenças surpreendentes que são todas obviamente verdadeiras, você deve acreditar e conclusivamente aceitar todas estas coisas."
Não, eu não estou interessado em forçar a crença em alguma coisa porque algum proeminente autor lá fora acredita nisso.
3. "C. S. Lewis acreditava em coisas que você acha que são realmente malignas, mas você realmente ama C. S. Lewis e acha que ele é o melhor autor cristão, que é uma justaposição estranha; talvez possamos aprender com ele a ser mais abertos e deixar de ser tão rápidos em chamar todos de hereges?"
Isto é muito mais próximo de onde estou.
Traduzido livremente de:
http://yuriystasyuk.com/cs-lewis-the-most-beloved-heretic
BARRABÁS LIVRE >>> http://www.barrabaslivre.com/2016/06/c-s-lewis-o-mais-amado-de-todos-os.html#ixzz6tun7LjhS
Avaliação de C S Lewis por Norman Geisler
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