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sábado, 2 de junho de 2018

TEOLOGIA DA POLITiCA DO DIREITO E DA ECONOMIA: uma visão bíblica e historica


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Este artigo tem os seguintes assuntos:

Parte 1  Noções Básicas de Politica e História

1- Estado e intervenção econômica.(marxismo e intervencionismo, neoliberalismo)
2- Marxismo- Clássico e Ocidental (Subdivisões, Crise)
3-Crise do socialismo
4- Socialismo e Comunismo- necessários?
5- Lado escuro do capitalismo
6- Estatismo x livre mercado
7- Etapas do capitalismo
8- Direita e Esquerda- Uma abordagem irrefutável
9- Facismo
10- Totalitarismo x Autoritarismo
11- Por que existem países ricos e pobres
12-O milagre japonês


Parte 2  Teologia Política, Economia e do Direito
clique no fim da pagina em mais informações
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PARTE 1  Noções Básicas de Politica Econômica na História


1- O ESTADO E A INTERVENÇÃO

1.1- LIBERALISMO ECONÔMICO CLÁSSICO


 O liberalismo econômico se opôs inicialmente à intervenção do poder do rei nos negócios, que se dava por meio de procedimentos típicos da economia mercantilista tais como a concessão de monopólios e privilégios. Os primeiros a se insurgirem contra o controle da economia foram os fisiocratas, cujo lema era "laissez -faire, laissez-passer, le monde va de lui-même" ("deixai fazer, deixai passar, que o mundo anda por si mesmo").
 Tais idéias são desenvolvidas pelos economistas ingleses Adam Smith (1723-1790) e David Ricardo (1772-1823). O que se pretendia era a defesa da propriedade privada dos meios de produção e a economia de mercado, baseada na livre iniciativa e competição.
 O Estado mínimo, ou seja, o Estado não -intervencionista é considerado póssível porque o equilíbrio pode ser alcançado pela lei da oferta e da procura.  Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna. 2ª Edição Atualizada. p. 217

 Os primeiros teóricos liberais opunham-se ao absolutismo real e aspiravam por um governo constitucional, pela liberdade civil e religiosa e pela não -intervenção do Estado na economia. Embora tenha fortalecido as instituições que favoreciam o exercício da cidadania, o liberalismo clássico permaneceu elitista, na medida em que o voto censitário permitia a participação política apenas aos homens de posse. 
 Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna. 2ª Edição Atualizada. 259
Uma das conquistas do liberalismo clássico foi o ideal do Estado não-intervencionista, que deixava o mercado livre para sua auto-regulação. Tratava-se do Estado minimalista, de baixa intervenção, e do liberalismo,ou seja, do prevalecimento do livre mercado.
  
Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna. 2ª Edição Atualizada, p. 260 

1.2 LIBERALISMO SOCIAL E A CRISE DO LIBERALISMO CLÁSSICO


 No século XIX, os liberais e os movimentos e partidos liberais mudaram a estrutura econômica, social e política da Europa alterando drasticamente a comunidade internacional. Pôs-se fim à escravidão, às incapacidades religiosas; inaugurou-se a liberdade de imprensa, de discurso e associação, a educação foi ampliada; o sufrágio foi se estendendo até a sua universalização – muito embora esta tenha se concretizado já no século XX –; Constituições escritas foram elaboradas; o governo representativo consolidou-se como modelo de organização política; garantiu-se o livre comércio e eliminaram-se as taxações até então impostas, etc. É de observar, ainda, que o liberalismo teve um impacto profundo na vida econômica, e a liberdade de movimento se realiza. Lar e propriedade se tornam invioláveis; eliminam-se taxações de mercadorias para a facilitação do livre comércio mundial.
No referente específico ao sufrágio, o seu alargamento provoca uma consequência imediata com a formação de partidos políticos (de massa), provocando uma maior participação eleitoral – no sentido quantitativo –, bem como reformulando o conteúdo das demandas políticas – na perspectiva, agora, qualitativa. Há uma suscetibilidade tanto de governos quanto de partidos às reivindicações sociais que se expressam a partir da ampliação da participação político-eleitoral, que passa a incluir os não possuidores de patrimônio ou renda, os proletários/operários, na sequência as mulheres e aqueles com uma idade limite, a qual vem sendo reduzida historicamente. As novas demandas sociais implicam não apenas um reforço quantitativo na atuação estatal, mas também requerem novas estratégias de ação por parte dos entes políticos. A atividade prestacional pública se aperfeiçoa, de início, a partir da luta dos movimentos operários pela regulação das relações produtivas. A luta pelos três oitos (oito horas de sono, oito horas de lazer e oito horas de trabalho) é exemplar. Intervenções são assumidas para manter os desamparados; oficinas públicas são mantidas para resolver o desemprego, legislação sobre o trabalho de menores, regulação da jornada de trabalho, leis relativas à segurança no trabalho, etc. Assim é que a liberdade contratual e econômica, símbolos da doutrina econômica liberal – o liberismo –, é fortemente reduzida pela participação do Estado como ator do jogo econômico, atuando no e sobre o domínio econômico, e, em um sentido mais amplo, do jogo social como um todo, participando das mais variadas formas nas lutas, reivindicações e arranjos sociais como ator privilegiado...

Em resumo, como exposto acima, pode-se dizer que, ao longo do século XIX, os liberais e os movimentos e partidos liberais mudaram a estrutura econômica, social e política da Europa, e modificaram drasticamente a comunidade internacional, quando, então, terminaram a escravidão e as incapacidades religiosas, garantiu-se a tolerância, a liberdade de imprensa, de manifestação e de associação; a educação foi estendida; o direito de voto ampliou-se – universalizou-se – até as mulheres; elaborações constitucionais limitando e responsabilizando os governos foram escritas. Por outro lado, na medida em que o sufrágio se estendeu a novos setores sociais, os partidos políticos começaram a surgir e se ampliar, buscando votos de modo a governar na base do que ofereciam como respostas ao eleitorado, tornando os governos suscetíveis às solicitações populares. Da mesma forma, as contradições do próprio liberalismo econômico – liberismo – vão se expressar mais radicalmente, deixando à mostra as insuficiências de suas respostas, assim como o caráter excludente de seu formato econômico – o capitalismo. Tudo isso, aqui sintetizado, irá impor uma mudança de rota no projeto do Estado Mínimo no sentido da intervenção do poder público estatal em espaços até então próprios à iniciativa privada, dando início a uma nova fase do Estado Liberal: a do intervencionismo estatal como resposta às demandas sociais e às próprias fragilidades do projeto político-econômico liberal....
O espaço interventivo da ação estatal, de início, se expressa através de leis de pobreza para manter os desamparados; oficinas públicas para resolver o desemprego; legislação sobre o trabalho de menores – jornada de trabalho (10 horas em 1846, na Inglaterra); leis trabalhistas relativas à segurança do trabalho, propagando-se movimentos de autodeterminação e independência. Em termos globais, o liberalismo do séc. XIX apresenta um registro importante em termos de surgimento e de institucionalização de direitos civis, direitos políticos e liberdades econômicas. Também foi notável pelo crescimento e o desenvolvimento sem precedentes da tecnologia e da produção, apesar dos numerosos infortúnios que continuavam a afligir os trabalhadores. As economias se fortaleceram; a população mundial começou a crescer rapidamente; desenvolvem-se as comunicações, as cidades; incremento do capital (dinheiro), e novas práticas bancárias facilitaram as trocas mercantis.  Ciéncia Política e Teoria do Estado.8ª EDIÇÃO Revista e Atualizada. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014.
Acontecimentos históricos apressam a reformulação dos princípios do liberalismo. Após a quebra da bolsa de Nova Yorque em 1929, a década de 30 foi marcada pela depressão econômica: falências, desemprego, inflação, geradores de graves tensões sociais.
A crise do modelo capitalista desencadeia a experiência totalitária na Alemanha e na Itália. Outros países, como Inglaterra e Estados Unidos, buscam soluções diferentes que pudessem evitar tanto o perigo do nazismo como a tentação do comunismo. As novas medidas tomadas encaminham o liberalismo para a tendência que podemos chamar de liberalismo social, em que é revisto o papel do Estado na economia.
Desde o início do século, a Inglaterra já vinha implantando medidas assistenciais como seguro nacional de saúde e sistema fiscal progressivo. Mas é nas décadas de 20 e 30 que o Estado começa a intervir de forma marcante na produção e distribuição de bens, o que indica uma forte tendência em direção ao Welfare State, ou seja, ao Estado de bem-estar social. Tanto é assim que, nos anos 40, considerava -se que qualquer cidadão teria direito a emprego, controle de salário, seguro contra invalidez, doença, proteção na velhice, licença maternidade, aposentadoria. o que aumentou significa ativamente a rede de serviços sociais garantidos pelo Estado.
 É nessa direção que se desenvolve o pensamento do inglês John Maynard Keynes (1883 -1946), que além de economista era também filósofo e jurista. Seguindo a tendência democrática de Stuart Mill, Keynes considera necessário aliar a eficiência e a liberdade individual, com devida justiça social. Mas isso provoca o revisionismo econômico, já que exige do Estado maior intervenção nos negócios as forças econômicas e regular as distorções, o que s ignifica uma crítica ao laissez faire da economia clássica.
Nos Estados Unidos, idéias semelhantes orientam o presidente Roosevelt na elaboração do plano econômico conhecido como New Deal, que introduziu o dirigismo estatal durante a depressão da década de 30....
As teorias keynesianas foram influentes desde a década de 30 até a de 70, quando passaram a ser severamente criticadas pelo neoliberalismo"   Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna. 2ª Edição Atualizada, p. 260
A Primeira Guerra Mundial rompe a tradição do liberalismo econômico, acelerando violentamente a ação de fatores desagregadores. De fato, tal guerra dilata desmesuradamente as exigências de armamento e aprovisionamento, demonstrando a
necessidade do controle integral e coativo da vida econômica, também como reflexo da emergência da Revolução Russa, da Constituição de Weimar (1919) e do constitucionalismo social iniciado pela Constituição mexicana de 1917;
 A crise econômica de 1929 e a Depressão trouxeram embutida a necessidade de uma economia interventiva, em que se reconciliam os dois maiores fatores de estabilidade econômica: a iniciativa privada e a ação governamental, que engendram a política social
de Roosevelt e o New Deal americanos, uma intensa política de nacionalizações implementada por Atlee, após a II Guerra Mundial, bem como os reflexos da ação de Léon Blum e a Front Populaire, no caso francês;...
...A transformação do regime foi acelerada pela I Guerra Mundial, que transformou a face do mundo e iniciou novo capítulo nas relações econômicas. Surgiu a necessidade de o Estado atuar para organizar as necessidades produtivas, direcionando-as para o esforço de guerra, o que abriu caminho para uma experiência intervencionista concreta. A guerra provocou a destruição do mercado natural e ocasionou enormes perdas, requerendo a ação do Estado no sentido de evitá-las, além de provocar o aumento numérico e o surgimento de uma consciência de classe entre os operários, cuja organização se intensificou nesta época, e cujo poder político passou a ser mais respeitado, possibilitando o enfrentamento dos proprietários dos meios de produção. Ciência Política e Teoria do Estado. 8ª EDIÇÃO Revista e Atualizada. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014.

1.3- LIBERALISMO DE ESQUERDA- socialismo + liberalismo
Liberal Socialismo ou Socialismo liberal ou liberalismo socialista
Na Itália fascista - e contra ela - floresceram teorias do liberalismo social que poderíamos considerar como liberalismo de esquerda, ou seja, visavam desencadear movimentos de cunho popular (e não burguês) e resgatavam os ideais socialistas, embora os adaptando ao liberalismo. Em vez de se oporem simplesmente ao marxismo, buscavam extrair dele os elementos positivos, repudiando sobretudo a concepção revolucionária de Marx: uma espécie de "terceiro caminho", superando a tese de que liberalismo e socialismo seriam inconciliáveis.
Carlo Rosselli (1899-1937) escreve: "É possível pensar que a passagem de um a para outra sociedade aconteça mediante um processo gradual e pacífico: mediante uma passagem que, salvando as vantagens já garantidas de uma, as reforce progressivamente através das vantagens da outra".

Tais teorias alimentaram a fundação do... Partido dell"Azione, em 1942, onde Norberto Bobbio (1909) inicia sua atividade e reflexão política.... Político ativo, Bobbio.... Critica a injustiça que permanece no mundo capitalista e o estado de não -liberdade dos países em que foi implantado o socialismo real [ex União Soviética]Ciente das implicações tecno-burocráticas das modernas sociedades industrializadas, sejam elas capitalistas ou socialistas, analisa os obstáculos à democracia. Por exemplo: a necessidade crescente de os governos recorrerem a especialistas (tecnocracia); a ampliação e complexificação da máquina estatal (burocracia); a existência de grandes organizações (sejam empresariais ou estatais) que impedem as condições objetivas de exercício democrático; a predominância da sociedade de massa que torna o homem apático, muito distante do caráter ativo exigido pela verdadeira cidadania. Bobbio chama a esses aspectos de paradoxos da democracia moderna. Evidentemente, não para concluir que a democracia é impossível, mas que se trata de tarefa difícil. Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna. 2ª Edição Atualizada, p. 260-261
Houve a crise do marxismo e o quente debate acerca do revisionismo, provocado pelos escritos de Eduard Bernstein (1850-1932), que levantaram para os socialistas uma questão crucial: como conciliar hipóteses e princípios da doutrina marxista ortodoxa com a realidade da sociedade capitalista e a práxis do movimento operário organizado. Tais acontecimentos conduziram os teóricos e os líderes do partido a aceitarem mais ou menos explicitamente, alguns princípios básicos da concepção liberal, abrandando seu classismo, bem como sua resistência ao método parlamentar, fazendo com que, na luta para a criação de estruturas coletivas, fosse aceita a permanência daeconomia de mercado....O "dogma" que precisa ser abandonado pelo liberalismo é, de acordo com os liberal-socialistas, o livre-cambismo. Conforme uma distinção fundamental feita, como vimos, por Stuart Mill e mais tarde aprofundada por Croce, considerar o livre-cambismo como característica indeclinável da doutrina liberal significa fazer dele, que é apenas um "legítimo princípio econômico", uma "ilegítima teoria ética": atribuir-se-ia a uma norma contingente, nascida num determinado período histórico e profundamente relacionada com uma concepção filosófica superada (o
utilitarismo ético de Bastiat), dignidade e valor de lei social, válida em toda época e em toda circunstância. Trata-se de um erro cujas conseqüências se manifestam cada dia mais, na medida em que o desenvolvimento da indústria e a formação de grandes massas proletárias exigem uma intervenção maciça do Estado, quer na estruturação de serviços essenciais para a comunidade, quer na coordenação e disciplina das atividades  econômicas, para evitar excessos de especulação e o predomínio de pequenos grupos particulares na vida nacional...
No campo econômico-social, a instância fundamental é "alcançar o máximo de equilíbrio entre o trabalho realizado e o bem econômico disponível": em suma, a cada um de acordo com seu trabalho. Tal objetivo da ideologia liberal-socialista se concretiza numa atitude anticapitalista, não absoluta e sim relativa, visando impedir, sobretudo, situações de parasitismo ou de privilégio (por isso, insiste-se muito na necessidade da taxação progressiva), mas, principalmente, no esboço de uma estrutura econômica "mista" ou "de dois setores", onde possam coexistir empresas privadas juntamente com segmentos nacionalizados ou controlados pelo Estado, de acordo com critérios distributivos de tipo empírico, nascidos, conforme as circunstâncias, de exigências da sociedade no seu conjunto.
Os elementos essenciais da ideologia se fazem presentes também em relação aos problemas internacionais: aplicação da exigência comunitária nas relações entre os Estados, combate ao racismo, ao imperialismo, ao nacionalismo, tendência à cooperação e a um crescente desenvolvimento de organismos internacionais representativos.Particular atenção é dedicada pelo Liberalsocialismo à construção de um novo modelo de
Estado, às garantias judiciárias e à educação das massas. Numa sociedade alicerçada em normas eficazes, por serem expressão da maioria dos cidadãos, se fazem necessários instrumentos idôneos para combater e prevenir eventuais abusos legislativos ou administrativos: torna-se portanto oportuno reforçar a independência e a autonomia do corpo judiciário e criar uma Corte suprema para defesa da lei fundamental, ou seja, da Constituição. Com relação à escola, afirma-se que somente uma organização que proporcione a todos uma instrução completa e generalizada possibilitará a consecução de dois objetivos essenciais do Liberal-socialismo: a revolução das consciências e a igualdade de oportunidade para todos os cidadãos.
Dicionario de Politica. Norberto Bobbio. Brasília:UNB, 11ª edição p. 706-707, 1998

1.4- NEOLIBERALISMO - a volta da não intervenção do estado na economia


As teorias de intervenção estatal começam a dar sinais de desgaste devido às frequentes dificuldades dos Estados em arcar com as responsabilidades sociais assumidas. Aumento do déficit público, crise fiscal, inflação e instabilidade social são consideradas justificativas suficientes para a limitação da ação assistencial do Estado.Desde a década de 40 alguns teóricos, como o austríaco Friedrich von Hayek (1899), defendiam o retorno às medidas liberistas do livre mercado....Hayek acusa o Estado previdenciário de paternalista e se refere a "miragem da justiça social". ..
Os neoliberais retomam o ideal de Estado minimalista, cuja ação se restringe ao policiamento, justiça e defesa nacional. O que, segundo eles, não implica em enfraquecimento do Estado, mas, ao contrário, no seu fortalecimento, já que se pretende reduzir os seus encargos.A partir da década de 80, os governos de Reagan e depois Bush, nos Estados Unidos, e de Margareth Thatcher na Inglaterra são representantes da nova onda neoliberal. No Brasil a tendência se confirma nos processos de privatização de organismos estatais e abolição da reserva de mercado. Mas contraditoriamente esbarra em outras medidas de nítida intervenção estatal (muitas vezes exacerbadas) como a dos sucessivos planos heterodoxos de controle na economia para conter a inflação. Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna. 2ª Edição Atualizada, p. 261
LIBERALISMO. Doutrina que serviu de substrato ideológico às revoluções antiabsolutistas que ocorreram na Europa (Inglaterra e França, basicamente) ao longo dos séculos XVII e XVIII, e à luta pela independência dos Estados Unidos.
Correspondendo aos anseios de poder da burguesia, que consolidava sua força econômica ante uma aristocracia em decadência, amparada no absolutismo monárquico, o liberalismo defendia:1) a mais ampla liberdade individual; 2) a democracia representativa com separação e independência entre três poderes (executivo, legislativo e judiciário); 3) o direito inalienável à propriedade; 4) a livre iniciativa e a concorrência como princípios básicos capazes de harmonizar os interesses individuais e coletivos e gerar o progresso social.
 Segundo o princípio do laissez- faire, não há lugar para a ação econômica do Estado, que deve apenas garantir a livre-concorrência entre as empresas e o direito à propriedade privada, quando esta for ameaçada por convulsões sociais. 
O pensamento econômico liberal constitui-se, a partir do século XVIII, no processo da Revolução Industrial, com autores como François Quesnay, estruturando-se como doutrina definitiva nos trabalhos de John Stuart Mill, Adam Smith, David Ricardo, Thomas Malthus, J.B. Say e F. Bastiat. Eles consideravam que a economia, tal como a natureza física, é regida por leis universais e imutáveis, cabendo ao indivíduo apenas descobri-las para melhor atuar segundo os mecanismos dessa ordem natural.Só assim poderia o homo economicus, livre do Estado e da pressão de grupos sociais, realizar sua tendência natural de alcançar o máximo de lucro com o mínimo de esforço. Os princípios do laissez-faire aplicados ao comércio internacional levaram à política do livre-cambismo, que condenava as práticas mercantilistas, as barreiras alfandegárias e protecionistas. A defesa do livre-cambismo foi uma iniciativa fundamentalmente da Inglaterra, a nação mais industrializada da época, ansiosa por colocar seus produtos em todos os mercados europeus e coloniais.
 Com o desenvolvimento da economia capitalista e a formação dos monopólios no final do século XIX, os princípios do liberalismo econômico foram cada vez mais entrando em contradição com a nova realidade econômica, baseada na concentração da renda e da propriedade. Essa defasagem acentuou-se com as crises cíclicas do capitalismo, sobretudo a partir da Primeira Guerra Mundial, quando o Estado se tornou um dos principais agentes orientadores das economias nacionais. 
Coube a J.M. Keynes redefinir os pressupostos da economia clássica, considerando a intervenção do Estado na economia e os próprios monopólios uma evolução racional e natural no desenvolvimento capitalista. O liberalismo econômico atual mantém-se mais no plano da retórica, pois, na prática, há muito dirigismo econômico na sociedade capitalista moderna. Também as diretrizes dos mais importantesorganismos econômico-financeiros internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), contradizem os princípios do liberalismo clássico.  NOVÍSSIMO DICIONÁRIO DE ECONOMIA. São Paulo: Best Seller, 1999.
Entretanto, o Estado negativo – com um intervencionismo zero – nunca foi
experimentado,
pois, desde sua criação, a atividade estatal sempre se deu, em
maior ou menor escala, voltada para fins distintos, porém, algum grau de
intervencionismo sempre foi experimentado, até mesmo porque, em caso
contrário, estaríamos diante da própria supressão do Estado como ente artificial
que deve responder às características postas pelo Contrato Social.
Como sustenta Fernando Scaff,74 apenas por sua existência, o Estado,
com sua ordem jurídica, implica intervenção. No modelo liberal, o que há,
efetivamente, é uma exclusão da atuação estatal interventiva com relação ao
processo econômico, como ocorrera ao tempo de Diocleciano com o
tabelamento dos preços ou com a regulação mercantil intentada pelo
absolutismo, o qual fica imune à regulação do ente público, sendo forjado pelos
arranjos “naturais” do próprio mercado capitalista.
Após a fase absolutista, o Estado Moderno assume, na tradição liberal dos
anos 1700/1800, a visão do poder público percebido e apresentado como inimigo
da liberdade individual, uma vez que, para a burguesia enriquecida, a liberdade
contratual era tida como um direito natural dos indivíduos, pois “(...) Cada homem
é o melhor juiz de seu interesse e deve ter a liberdade de promovê-los segundo a
sua livre vontade.” Já no século XIX, “(...) aceitava-se como exceção a
interferência do Estado nos assuntos em que fosse predominante o interesse
individual, sendo raros os que não eram assim considerados(...)”. Assim, o “(...)
Estado Liberal resultante da ascensão política da burguesia, organizou-se de
maneira a ser o mais fraco possível, caracterizando-se como o Estado mínimo ou o
Estado polícia, com funções restritas quase que à mera vigilância da ordem social
e à proteção contra ameaças externas”.75
Dessa forma, percebe-se que o grau zero de intervenção é ideal nunca
alcançado,
pois sempre houve políticas estatais de algum tipo ou, porque, como
se percebe, o Estado Liberal requer qualidades e pressupostos igualitários, além
de uma competição equilibrada, concretizadas em sede legislativa.
Ciência Política e Teoria do Estado. 8ª EDIÇÃO Revista e Atualizada. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014.

1.5- É PRECISO INTERVIR NA ECONOMIA E NAS OUTRAS ESFERAS DA VIDA?

Sim, por causa do Egoísmo do ser humano e dos antagonismos de interesses, a história nos mostrou que o liberalismo econômico levou a inúmeros problemas:
Acontecimentos históricos apressam a reformulação dos princípios do liberalismo. Após a quebra da bolsa de Nova Yorque em 1929, a década de 30 foi marcada pela depressão econômica: falências, desemprego, inflação, geradores de graves tensões sociais.Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna. 2ª Edição Atualizada, p. 260
O que há de comum entre os filósofos contratualistas é que eles partem da análise do homem em estado de natureza, isto é, antes de qualquer sociabilidade, quando, por hipótese, desfruta de todas as coisas, realiza os seus desejos e é dono de um poder ilimitado. No estado de natureza, o homem tem direito a tudo:
"O direito de natureza, a que os autores geralmente chamam jus naturale, é a liberdade que cada homem possui de usar seu próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação de sua própria natureza, ou seja, de sua vida; e, consequentemente, de fazer tudo aquilo que seu próprio julgamento e razão lhe indiquem como meios adequados a esse fim". Ora, enquanto perdurar esse estado de coisas, não haverá segurança nem paz alguma.
A situação dos homens deixados a si próprios é de anarquia, geradora de insegurança, angústia e medo. Os interesses egoístas predominam e o homem se torna um lobo para o outro homem (homo homini lupus). As disputas geram a guerra de todos contra todos (bellum omnium contra omnes), cuja consequência é o prejuízo para a indústria, a agricultura, a navegação, e para a ciência e o conforto dos homens. Na sequência do raciocínio, Hobbes pondera que o homem reconhece a necessidade de "renunciar a seu direito a todas as coisas, contentando-se, em relação aos outros homens, com a mesma liberdade que aos outros homens permite em relação a si mesmo". A nova ordem é celebrada mediante um contrato, um pacto, pelo qual todos abdicam de sua vontade em favor de "um homem ou de uma assembléia de homens, como representantes de suas pessoas". O homem, não sendo sociável por natureza, o ser á por artifício. É o medo e o desejo de paz que o levam a fundar um estado social e a autoridade política, abdicando dos seus direitos em favor do soberano. Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 2ª Edição Atualizada. p. 217 210-211
 Para Locke, no estado natural cada um é juiz em causa própria; portanto, os riscos das paixões e da parcialidade são muito grandes e podem desestabilizar as relações entre os homens. Por isso, visando a segurança e a tranquilidade necessárias ao gozo da propriedade, as pessoas consentem em instituir o corpo político.Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna 2ª Edição Atualizada. p.218
 Em segundo lugar, no estado de natureza falta um juiz conhecido e indiferente com autoridade para resolver quaisquer dissensões, de acordo com a lei estabelecida; porque, sendo cada homem, nesse estado, juiz e executor da lei da natureza, sendo os homens parciais para consigo, a paixão e a vingança podem levá-los a exceder-se nos casos que os interessam, enquanto a negligência e a indiferença os tornam por demais descuidados nos casos de terceiros. (Segundo Tratado Sobre o Governo. John Locke)   Filosofando. Introdução à Filosofia. 2ª Edição Atualizada. p. 220

 
No Discurso sobre a origem da desigualdade Rousseau cria a hipótese dos homens em estado de natureza, vivendo sadios, bons e felizes enquanto cuidam de sua própria sobrevivência, até o momento em que é criada a propriedade e uns passam a trabalhar para outros, gerando escravidão e miséria. Rousseau parece demonstrar extrema nostalgia do estado feliz em que vive o bom selvagem, quando é introduzida a desigualdade entre os homens, a diferenciação entre o rico e o pobre, o poderoso e o fraco, o senhor e o escravo e a predominância da lei do mais forte. O homem que surge da desigualdade é corrompido pelo poder e esmagado pela violência. Trata.-se de um falso contrato, esse que coloca os homens sob grilhões. Há que se considerar a possibilidade de outro contato verdadeiro e legítimo, pelo qual o povo esteja reunido sob uma só vontade.Filosofando. Introdução à Filosofia. 2ª Edição Atualizada p. 224-225


Mesmo assim, Rousseau ainda é filho do seu tempo porque, ao partir da tese contratualista, de certa forma mantém a perspectiva individualista do pensamento burguês; ao denunciar a violência como resultado da natureza humana corrompida, mantém ainda a perspectiva de uma análise moral (e portanto pessoal) de um fenômeno que os teóricos socialistas a ele posteriores perceberão como resultante dos antagonismos sociais.Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 226-227
1.6 Intervenção do estado é uma característica marxista?
Não.
  •  Como vimos acima a intervenção estatal foi maior ou menor nas economias capitalistas dependendo do período histórico. Após a crise de 1929 por exemplo ela foi maior, e diminuiu depois da decada de 70. 
  • Japáo e os tigres asiaticos cresceram pela intervenção da economia
  • Além disso o anarquismo não prevê intervenção estatal alguma.
  • Além disso o chamado "milagre japonês" aconteceu com grande intervenção estatal  ver 13

"do Japão e dos NICs (Newly Industrialized Countries) de primeira geração, Taiwan, Coréia do Sul, Cingapura e Hong Kong, e que analisam o papel das políticas públicas voltadas à construção de novas estruturas produtivas e capacidades tecnológicas. As pesquisas associadas ao PED têm enfatizado o estudo das políticas industriais, gerando a conclusão de que o Estado teria sido um ator central na conformação do assim-chamado “milagre asiático”. PESQUISA & DEBATE, SP, volume 23, número 2(42) pp. 291-316, jul.-dez. 2012 291
ESTATISMO. Participação do Estado nas atividades econômicas, nas quais ele atua como empresário em setores da produção industrial e de serviços. Embora o fenômeno do estatismo ocorra nas economias capitalistas mais desenvolvidas, foi nos países subdesenvolvidos que a penetração do Estado na economia surgiu como uma necessidade nacional. Na Ásia, África e América Latina, o Estado foi o principal responsável pelos projetos de implantação das indústrias de base (siderurgia, petróleo, geração de energia) e sistemas de transportes e comunicações.
Nas colônias afro-asiáticas que se tornaram independentes após a Segunda Guerra Mundial, o Estado formou seu patrimônio com base nas empresas estrangeiras nacionalizadas pelos movimentos de libertação vitoriosos. No Brasil, o Estado responde por cerca de um terço dos investimentos dirigidos para os setores produtivos, domina mais da metade do capital bancário e tem presença empresarial preponderante em vários setores básicos
. Novíssimo dicionário de Economia. São Paulo: Best Seller, 1999, p. 222

Para amenizar os efeitos da crise que causara um duro golpe ao liberalismo econômico, muitos países adotaram políticas intervencionistas de estímulo ao crescimento econômico e à geração de empregos. Nos Estados Unidos, a solução escolhida ficou conhecida como New Deal (“novo acordo” ou “nova transação”).O New Deal foi um programa de recuperação econômica executado pelo governo de Franklin Delano Roosevelt, que foi presidente dos Estados Unidos, representando o Partido Democrata, entre 1933 e 1945. Eleito em 1932, sua vitória no pleito deveu-se principalmente ao sucesso do programa de auxílio e de combate ao desemprego implantado por ele no estado de Nova York durante seu mandato como governador. O programa tinha como base as ideias do economista britânico John Maynard Keynes, que negava os princípios do livre mercado e defendia a intervenção governamental na economia e a aplicação de recursos do Estado no combate ao desemprego. Por meio dele, foram implementadas medidas fundamentais para a recuperação do capitalismo estadunidense: 
  • intervenção do Estado no sistema financeiro e em setores importantes da economia; 
  • aumento da vigilância sobre as atividades bancárias e as operações na Bolsa de Valores; 
  • taxação dos cidadãos mais ricos; 
  • regulamentação das atividades das associações operárias e dos sindicatos;
  • concessão de empréstimos às indústrias a juros baixos. 
  • ...foram criadas frentes de trabalho para a realização de obras públicas, como a construção de autoestradas, barragens e instalações de saneamento urbano a partir do recrutamento de milhares de desempregados nas grandes cidades.
  • Para reduzir a superprodução agrícola, o governo passou a fornecer subsídios aos fazendeiros para que deixassem suas terras em repouso. 
  • Também decretou o pagamento de salário mínimo e a semana legal de quarenta horas, com o objetivo de impor à indústria a admissão de maior número de trabalhadores.
 Todas essas intervenções na economia possibilitaram a retomada do crescimento econômico estadunidense. Colhendo os frutos da recuperação econômica do país, Roosevelt foi reeleito presidente dos Estados Unidos três vezes seguidas: em 1936, 1940 e 1944.
Tal qual aconteceu nos Estados Unidos, outros países, como Grã-Bretanha e França, tiveram de adotar medidas para reativar suas economias, abrindo mão das normas do Estado liberal: grandes obras foram implementadas com o objetivo de recolocar em funcionamento os mecanismos econômicos; políticas deflacionárias entraram em vigor, reduzindo drasticamente o volume de papel-moeda em circulação; as importações diminuíram sensivelmente após a elevação das tarifas alfandegárias; as políticas sociais tiveram prioridade sobre as econômicas; a agricultura recebeu subsídios em vez das barreiras alfandegárias. História: das Cavernas ao terceiro milênio. Livro do Professor.Volume único- parte III. São Paulo: Moderna, 2017p. 454

A crise do modelo capitalista desencadeia a experiência totalitária na Alemanha e na Itália. Outros países, como Inglaterra e Estados Unidos, buscam soluções diferentes que pudessem evitar tanto o perigo do nazismo como a tentação do comunismo. As novas medidas tomadas encaminham o liberalismo para a tendência que podemos chamar de liberalismo social, em que é revisto o papel do Estado na economia.
Desde o início do século, a Inglaterra já vinha implantando medidas assistenciais como seguro nacional de saúde e sistema fiscal progressivo. Mas é nas décadas de 20 e 30 que o Estado começa a intervir de forma marcante na produção e distribuição de bens, o que indica uma forte tendência em direção ao Welfare State, ou seja, ao Estado de bem-estar social. Tanto é assim que, nos anos 40, considerava -se que qualquer cidadão teria direito a emprego, controle de salárioseguro contra invalidezdoença, proteção na velhicelicença maternidade, aposentadoria. o que aumentou significa ativamente a rede de serviços sociais garantidos pelo Estado.
 É nessa direção que se desenvolve o pensamento do inglês John Maynard Keynes (1883 -1946), que além de economista era também filósofo e jurista. Seguindo a tendência democrática de Stuart Mill, Keynes considera necessário aliar a eficiência e a liberdade individual, com devida justiça social. Mas isso provoca o revisionismo econômico, já que exige do Estado maior intervenção nos negócios as forças econômicas e regular as distorções, o que s ignifica uma crítica ao laissez faire da economia clássica.
Nos Estados Unidos, idéias semelhantes orientam o presidente Roosevelt na elaboração do plano econômico conhecido como New Deal, que introduziu o dirigismo estatal durante a depressão da década de 30....
As teorias keynesianas foram influentes desde a década de 30 até a de 70, quando passaram a ser severamente criticadas pelo neoliberalismo" 
 Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna. 2ª Edição Atualizada, p. 260
 O Marxismo na verdade prevê a extinção do Estado e fim da propriedade privada:
A classe operária, organizando-se num partido revolucionário, deve destruir o Estado burguês e criar um novo Estado capaz de suprimir a propriedade privada dos meios de produção. A esse novo Estado dá-se o nome de ditadura do proletariado, uma vez que, segundo Marx, o fortalecimento contínuo da classe operária é indispensável
enquanto a burguesia não tiver sido liquidada como classe no mundo inteiro.
A primeira fase, de vigência da ditadura do proletariado, corresponde ao socialismo, que supõe a existência do aparelho estatal, da burocracia, do aparelho repressivo e do aparelho jurídico. Nessa fase persiste a luta contra a antiga classe dominante, a fim de evitar a contra -revolução. O princípio do socialismo é: "De cada um, segundo sua capacidade, a cada um, segundo seu trabalho".
A segunda fase, chamada comunismo, tem como princípio: "De cada um, segundo sua capacidade, a cada um, segundo suas necessidades". O comunismo se define pela supressão da luta de classes e, consequentemente, pelo desaparecimento do Estado. Na "anarquia feliz" o desenvolvimento prodigioso das forças produtivas levaria
à"era da abundância", à supressão da divisão do trabalho em tarefas subordinadas (materiais) e tarefas superiores (intelectuais), à ausência de contraste entre cidade e campo e entre indústria e agricultura.
Se a passagem para o comunismo significa o desaparecimento das classes, como fica a afirmação que fizemos inicialmente de que, para Marx, a luta de classes é o motor da história?
O movimento da história continuaria, pois ela é um processo; só que a luta não mais seria entre a classe dominante e a dominada, mas entre a vanguarda e os elementos que impedem as mudanças por comodismo ou incompreensão. A luta seria entre o progresso e as forças conservadoras, entre o novo e o velho. 

Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 240-245

COMUNISMODoutrina que defende a abolição da propriedade privada dos meios de produção, a distribuição igualitária dos bens produzidos pela sociedade e que a organização da riqueza social seja feita pela própria comunidade de produtores.
 Propõe ainda a extinção do Estado, o autogoverno da coletividade e o fim das
classes sociais.
...Derrotando pela força a burguesia e apossando- se do poder do Estado, os operários expropriariam os capitalistas e coletivizariam todos os meios de produção e de distribuição de bens. Os dois pensadores pouco se detiveram sobre as características e as formas de organização da
futura sociedade da abundância, onde o trabalho deixaria de ser um sacrifício na qualidade de trabalho alienado e iria se tornar um prazer para todos os membros da sociedade, porque seria um trabalho livre e consciente. Ao mesmo tempo, cada pessoa receberia da sociedade o suficiente para satisfazer suas necessidades físicas e culturais.
 Com o desaparecimento das classes sociais, o Estado perderia suas funções, que seriam gradativamente absorvidas pela sociedade civil.  NOVÍSSIMO DICIONÁRIO DE ECONOMIA. São Paulo: Best Seller, 1999.
1.7 Neoliberalismo no Brasil
O Brasil não passou pelo Estado de Bem estar Social  ou Welfare state (ver 1.2), portanto políticas neoliberais não trazem bons resultados:
As peculiaridades do desenvolvimento dos países da América Latina –
processo de colonização, séculos de governos autoritários, industrialização tardia
e dependência periférica – não permitiram a gestação e o florescimento de um
Estado de Bem-Estar Social ou algo que a ele se assimilasse. O intervencionismo
estatal confunde-se historicamente com a prática autoritária/ditatorial,
construindo-se o avesso da ideia de Estado Providência, aumentando as distâncias
sociais e o processo de empobrecimento das populações. Assim, a tese de que
em países periféricos, de desenvolvimento tardio, o papel do Estado deveria ser o
de intervenção para a correção das desigualdades não encontrou terreno fértil
em terras latino-americanas. Ao contrário, a tese intervencionista sempre esteve
ligada ao patrimonialismo das elites herdeiras do colonialismo.
Isso é perfeitamente aplicável ao caso brasileiro, onde o intervencionismo estatal, condição de possibilidade para a realização da função social do Estado, serviu tão somente para a acumulação de capital e renda em favor de uma pequena parcela da população. De todo modo, embora o Estado intervencionista represente uma espécie de amálgama capitalista, como projeto salvacionista em face do crescimento dos movimentos de massa, tornou-se, na verdade, o embrião da construção das condições da etapa que o sucedeu nos países desenvolvidos, o Estado Democrático de Direito. E isso não ocorreu no Brasil....Evidentemente, a minimização do Estado em países que passaram pela etapa do Estado Providência ou Welfare state tem consequências absolutamente diversas da minimização do Estado em países como o Brasil, onde não houve o Estado Social.95 O Estado interventor-desenvolvimentista-regulador, que deveria fazer esta função social, foi – especialmente no Brasil – pródigo (somente) para com as elites,96 enfim, para as camadas médio-superiores da sociedade, que se apropriaram/aproveitaram de tudo desse Estado, privatizando-o, dividindo/loteando com o capital internacional, os monopólios e os oligopólios da economia. 
 ...Repita-se, pois, que no Brasil a modernidade é tardia e arcaica. O que houve (há) é um simulacro de modernidade.98 Como muito bem assinala Eric Hobsbawn, o Brasil é “um monumento à negligência social”, ficando atrás de muitos países periféricos em vários indicadores sociais, como mortalidade infantil e alfabetização, tudo porque estes Estados se empenharam na redução das desigualdades.99 Ou seja, em nosso país, as promessas da modernidade ainda não se realizaram. E, já que tais promessas não se realizaram, a solução que o establishment apresenta, por paradoxal que possa parecer, é o retorno ao Estado (neo)liberal. Daí que a pós-modernidade é vista como a visão neoliberal. Só que existe um imenso deficit social em nosso país, e, por isso, temos que
defender as instituições da modernidade contra esse neoliberalismo pósmoderno.
Ciência Política e Teoria do Estado. 8ª EDIÇÃO Revista e Atualizada. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014.

2- O MARXISMO E SUAS VERTENTES 
ESCOLA MARXISTA. Escola de pensamento econômico fundada por Karl Marx e Friedrich Engels. Consiste num conjunto de teorias econômicas (a mais-valia), filosóficas (o materialismo dialético), sociológicas (o  materialismo histórico) e políticas, desenvolvido a partir da filosofia de Hegel, do materialismo filosófico francês do século XVIII e da economia política inglesa do início do século XIX. A síntese dessas formulações foi apresentada em O Capital (1867), em que, a partir da teoria do valor-trabalho da escola clássica inglesa, Marx desenvolve o conceito de mais-valia como trabalho excedente, não-pago, fonte do lucro, do juro e da renda da terra. A partir da teoria da mais-valia, Marx analisa o processo de acumulação de capital no sistema capitalista, mostrando haver uma correlação entre a crescente acumulação e concentraçãode capital e a pauperização do proletariado e a proletarização da classe média, situações que causariam a eclosão das contradições básicas do sistema.
Entre os principais fatores que contribuíram para as crises periódicas no sistema capitalista, Marx destacou:
  •  o progressivo decréscimo da taxa de lucro (a diminuição da mais valia), decorrente do maior aumento do capital constante (máquinas e equipamentos) em relação ao capital variável (mão-de-obra empregada); 
  • o dinamismo anárquico do sistema, ligado à busca incessante de lucros maiores e expresso no fato de os progressos técnicos tornarem os antigos instrumentos de trabalho ultrapassados antes de sua utilização normal; 
  • a desordem dos mercados provocada pela contradição básica entre o aspecto coletivo dos meios de produção (as grandes unidades técnicas) e o caráter privado de sua apropriação. 
A queda do regime capitalista ocorreria por força de suas próprias contradições internas, mas a mudança seria impulsionada pela luta de classes, pela ação revolucionária do proletariado, que implantaria um regime socialista, com a socialização dos meios de produção, estágio preparatório para a fase definitiva do comunismo. Entretanto, após a morte de Marx e Engels, a rápida industrialização da Alemanha e o fortalecimento do Partido Social-Democrata e dos sindicatos melhoraram as condições de vida dos operários alemães. Nesse contexto, considerando que as previsões de pauperização progressiva das massas não se tinham verificado, surgiu na II Internacional uma tendência revisionista da teoria marxista.
Seu principal porta-voz foi Eduard Bernstein (1850-1932), que propôs substituir o conteúdo revolucionário do marxismo pela concepção de uma evolução reformista e gradual. O revisionismo “direitista” de Bernstein foi combatido pelo “centro” ortodoxo representado por Karl Kautsky (1854-1938) e pela “esquerda” socialdemocrata de Rosa Luxemburgo (1870-1919).
A controvérsia que se seguiu referiu-se basicamente à teoria do colapso do sistema capitalista e à natureza das crises que levariam a seu fim e ao advento do socialismo: as crises provocadas pela tendência decrescente da taxa de lucros e as causadas pelo subconsumo das massas. Nessa discussão, destacou-se a posição do economista revisionista russo Tugan-Baranovski, para quem as crises se deviam à “desproporção” entre os vários ramos da produção. Mas o destaque maior nessa controvérsia coube a Rosa Luxemburgo. Em A Acumulação do Capital, 1913, ela argumenta que acumulação de capital era impossível num sistema capitalista fechado, adaptando a teoria de Marx às novas condições do imperialismo econômico e político do início do século XX.
Pouco antes, o dirigente socialista austríaco Rudolf Hilferding havia publicado seu famoso livro, O Capital Financeiro (1910), no qual mostra que o imperialismo é uma conseqüência do desenvolvimento dos monopólios, controlados pelo capital financeiro. As concepções desses autores foram desenvolvidas por Lênin em O Imperialismo, Etapa Superior do Capitalismo, 1916, em que caracteriza o capitalismo moderno por sua própria dinâmica de formação e ampliação de mercados por meio da dominação colonial e da guerra. A ação do capital monopolista internacional dividiria os países em dois grupos: os de estrutura financeira e industrial poderosa (em permanente expansão econômica) e os atrasados (fornecedores de matéria-prima e mão-de obra barata), em relação de dependência com os primeiros. A importância da contribuição teórica e prática de Lênin para a teoria marxista deu origem à expressão marxismo-leninismo. O marxismo-leninismo atribui ao Partido Comunista o papel de consciência teórica e liderança prática do proletariado na derrocada do capitalismo, doutrina vitoriosa na Revolução Russa de 1917. Mais tarde, durante os primeiros anos de regime soviético, destacou-se a posição do economista Preobrajenski, autor de uma proposta de industrialização imediata e de um rápido progresso técnico, em detrimento da expansão do setor agrícola. Após a morte de Lênin, surgiram novamente posições “direitistas”, “esquerdistas” e “centristas” no âmbito da experiência soviética (e na Internacional Comunista). Seus principais porta-vozes eram, respectivamente, Nikolai Bukharin (1888-1938), Leon Trotski (1879-1940) e Joseph Stalin (1879-1953), que esmagou seus  dversários e adotou uma política que oscilou entre as concepções de Bukharin e Trotski, ambos teóricos de peso.
Após a estagnação dogmática que caracterizou o período stalinista, houve um revigoramento da pesquisa teórica no campo do marxismo. Desenvolveu- se uma série de polêmicas, centradas particularmente em torno das contribuições de Mao Tsé-Tung, Antonio Gramsci, Rosa Luxemburgo, Georg Lukács, Louis Althusser e outros. No campo da teoria econômica, depois da importante contribuição do economista polonês Oskar Lange à planificação socialista, dando-lhe fundamento matemático, destacam-se as contribuições teóricas do belga Ernst Mandel, dirigente da IV Internacional (fundada por Trotski em 1938) e autor de penetrante análise do capitalismo contemporâneo, que denomina de “capitalismo tardio”; do economista inglês Maurice Dobb, no estudo dos problemas econômicos do socialismo; do austríaco Andre Gorz, nas análises das contradições do capitalismo e numa estratégia alternativa de transição para o socialismo; do francês Charles Bettelheim, autor de importante estudo da estrutura de classes na União Soviética; e dos norte-americanos Paul Sweezy e Paul Baran, na análise das características do capitalismo monopolista contemporâneo NOVÍSSIMO DICIONÁRIO DE ECONOMIA. São Paulo: Best Seller, 1999.
1. Introdução As revoluções burguesas do século XVIII se encontravam, no início do século XIX, ameaçadas pelas forças conservadoras do feudalismo em decomposição, representadas pela nobreza e pelo clero, ansiosas p ara restaurar o absolutismo e excluir a burguesia do poder político...
 3-O materialismo histórico não é mais do que a aplicação dos princípios do materialismo dialético ao campo da história. E, como o próprio nome indica, é a explicação da história por fatores materiais, ou seja, econômicos e técnicos. Marx inverte o processo do senso comum que pretende explicar a história pela ação dos "grandes homens", ou, às vezes, até pela intervenção divina. Para o marxismo, no lugar das idéias, estão os fatos materiais; no lugar dos heróis, a luta de classes. Em outras palavras, o que Marx explicitou foi que, embora possamos tentar compreender e definir o homem pela consciência, pela linguagem, pela religião, o que fundamentalmente o caracteriza é a forma pela qual reproduz suas condições de existência. Portanto, para Marx, a sociedade se estrutura em níveis.

O primeiro nível, chamado de infra-estrutura, constitui a base econômica (que é determinante, segundo a concepção materialista). Engloba as relações do homem com a natureza, no esforço de produzir a própria existência, e as relações dos homens entre si. Ou seja, as relações entre os proprietários e não-proprietários, e entre os não-proprietários e os meios e objetos do trabalho.

 O segundo nível, político -ideológico, é chamado de superestrutura. É constituído:
a) pela estrutura jurídico-política representada pelo Estado e pelo direito: segundo Marx, a relação de exploração de classe no nível econômico repercute na relação de dominação política, estando o Estado a serviço da classe dominante.

 b) pela estrutura ideológica referente às formas da consciência social, tais como a religião, as leis, a educação, a literatura, a filosofia, a ciência, a arte etc. Também nesse caso ocorre a sujeição ideológica da classe dominada, cuja cultura e modo de vida reflete as idéias e os valores da classe dominante. Vamos exemplificar como a infra-estrutura determina a superestrutura, comparando valores de dois diferentes períodos da história. A moral medieval valoriza a coragem e a ociosidade da nobreza ocupada com a guerra, bem como a fidelidade, que é a base do sistema de suserania e vassalagem; do ponto de vista do direito, num mundo cuja riqueza é a posse de terras, considera -se ilegal (e imoral) o empréstimo a juros. Já na Idade Moderna, com o advento da burguesia, o trabalho é valorizado e, consequentemente, critica -se a ociosidade; também ocorre a legalização do sistema bancário, o que exige a revisão das restrições morais aos empréstimos....
 Conforme os exemplos, as manifestações da superestrutura (no caso, moral e direito) são determinadas pelas alterações da infraestrutura decorrentes da passagem econômica do sistema feudal para o capitalista. ... Analisando o contrato que os homens estabelecem com a natureza para transformá -la por meio do trabalho e as relações entre si é que se descobre como eles produzem sua vida e suas idéias. No entanto, essas determinações não podem nos fazer esquecer do caráter dialético de toda determinação: ao tomar conhecimentodas contradições, o homem pode agir ativamente sobre aquilo que o determina.
A práxis
Ao analisar o ser social do homem, Marx desenvolve uma nova antropologia, segundo a qual não existe uma "natureza humana" idêntica em todo tempo e lugar. Para ele, o existir humano decorre do agir, pois o homem se autoproduz à medida que transforma a natureza pelo trabalho. Sendo o trabalho uma ação coletiva, a condição humana depende da sua existência social. Por outro lado, o trabalho é um projeto humano e como tal depende da consciência que antecipa a ação pelo pensamento. Com isto se estabelece a dialética homem -natureza e pensar-agir. Marx chama de práxis à ação humana de transformar a realidade. Nesse sentido, o conceito de práxis não se identifica propriamente com a prática, mas significa a união dialética da teoria e da prática. Isto é, ao mesmo tempo que a consciência é determinada pelo modo como os homens produzem a sua existência. também a ação humana é projetada, refletida, consciente. Por isso a filosofia marxista é também conhecida como filosofia da práxis.

A luta de classes
As relações fundamentais de toda sociedade humana são as relações de produção, que revelam a maneira pela qual os homens, a partir das condições naturais, usam as técnicas e se organizam por meio da divisão do trabalho social. As relações de produção correspondem a um certo estádio das forças produtivas, que consistem no conjunto formado pelo clima, água, solo, matérias -primas, máquinas, mão-de-obra e instrumentos de trabalho. Por exemplo, quando os instrumentos de pedra são substituidos pelos de metal, ou quando o desenvolvimento da agricultura se torna possível pela descoberta de técnicas de irrigação, de adubagem do solo ou pelo uso do arado e de veículos de roda, estamos diante de alterações das forças produtivas que por sua vez provocarão mudanças nas formas pelas quais os homens se relacionam. Chamamos modo de produção a maneira pela qual as forças produtivas se organizam em determinadas relações de produção num dado momento histórico. Por exemplo, no modo de produção capitalista, as forças produtivas, representadas sobretudo pela s máquinas do sistema fabril, determinam as relações de produção caracterizadas pelo dono do capital e pelo operário assalariado. No entanto, as forças produtivas só podem se desenvolver até certo ponto, pois, ao atingirem um estádio por demais avançado, entram em contradição com as antigas relações de produção, que se tornam inadequadas. Surgem então as divergências e a necessidade de uma nova divisão de trabalho. A contradição aparece como luta de classes.
Vejamos como isso ocorre na história da humanidade. Nas sociedades primitivas, os homens se unem para enfrentar os desafios da natureza hostil e dos animais ferozes. Os meios de produção, as áreas de caça, assim como os produtos, são propriedades comuns, isto é, pertencem a toda a sociedade (comuna primitiva). A base econômica determina certa maneira de pensar peculiar, em que não há sentimento de posse, uma vez que não existe propriedade privada. O modo de produção patriarcal surge quando o homem inicia a domesticação de animais , desenvolve a agricultura graças ao uso dos instrumentos de metal e fabrica vasilhas de barro, o que possibilita fazer reservas. Quais as conseqUências das modificações das forças produtivas"? Alteram-se as relações de produção e o modo de produção: aparece uma forma específica de propriedade (propriedade da família, num sentido muito amplo); diferenciam-se funções de classe (autoridade do patriarca, do pai de família): há alteração do direito hereditário, estabelecendo -se a filiação paterna (e não mais materna).
 O modo de produção escravista é decorrência do aumento da produção além do necessário à subsistência e exige o recurso a novas forças de trabalho, conseguidas geralmente entre prisioneiros de guerra, transformados em escravos. Com isso surge propriamente a propriedade privada dos meios de produção, e a primeira forma de exploração do homem pelo homem com a consequente contradição entre senhores e escravos. Dá -se então a separação entre trabalho intelectual e trabalho manual. A ociosidafe passa a ser considerada a perfeição do homem livre, enquanto o trabalho manual, considerado servil, é desprezado. O modo de produção escravista é típico da Antiguidade grega e romana. A luta dos povos bárbaros contra o Império Romano, no final da Antiguidade, não é senão a luta contra a escravidão a eles imposta pelos romanos. A contradição do regime escravista leva - o a ruínà e, para restaurar a economia, são necessárias novas relações de produção.
No modo de produção feudal, a base econô mica é a propriedade dos meios de produção pelo senhor feudal. O servo trabalha um tempo para si e outro para o senhor, o qual, além de se apropriar de uma parte da produção daquele, ainda lhe cobra impostos pelo uso comum do moinho, do lagar etc. A contradição dos interesses das duas classes leva a conflitos que farão aparecer, paulatinamente, uma nova figura: o burguês. Surgida dentre os servos que se dedicam ao artesanato e ao comércio, a nova figura social forma os burgos e consegue aos poucos a liberdade pessoal e das cidades. A jovem burguesia está destinada a desenvolver as formas produtivas que em determinado momento exigirão novas relaçõés de produção. O modo de produção capitalista é a nova síntese que surge das ruinas do sistema feudal, ou seja, da contradição entre a tese (senhor feudal) e a antítese (servo). O que vimos até agora é que o movimento dialético pelo qual a história se faz tem um motor: a luta de classes. Chama -se luta de classes ao confronto entre duas classes antagônicas quando lutam por seus interesses de classe.
No modo de produção capitalista, a relação antitética se faz entre o burguês, que é o detentor do capital, e o proletário, que nada possui e só vive porque vende sua força de trabalho. Veremos agora, com mais atenção, como se processa a relação antagônica entre as duas classes.

4. A mais-valia
O sistema capitalista consiste na produção de mercadorias. Mercadoria é tudo o que é produzido não tendo em vista o valor de uso (por exemplo, uma malha que fazemos para nosso próprio uso), mas tem por objetivo o valor de troca, isto é, a venda do produto. Sendo a mercadoria um produto do trabalho, o seu valor é determinado pelo total de trabalho socialmente necessário para produzi -la. Como a mercadoria é produzida? Para sobreviver, o trabalhador vende ao capitalista a única mercadoria que possui, que é a capacidade de trabalhar. Qual deve ser o valor da força de trabalho? Sendo um ser vivo, o trabalhador precisa receber o necessário para a subsistên cia e reprodução de sua capacidade de trabalho, ou seja, alimento, roupa, moradia, possibilidade de criar os filhos etc. O salário deve portanto corresponder ao custo de sua manutenção e de sua família. O operário se distingue dos escravos e dos servos por receber um salário a partir do contrato livremente aceito entre as partes. No entanto, na obra O capital, Marx explica que a relação de contrato é livre só na aparência e que, na verdade, o desenvolvimento do capitalismo supõe a exploração do trabalho do operário. Isso porque o capitalista contrata o operário para trabalhar durante um certo período de horas a fim de alcançar determinada produção. Mas o trabalhador, estando disponível todo o tempo, na verdade produz mais do que foi calculado, ou seja, a força de trabalho pode criar um valor superior ao estipulado inicialmente. No entanto, a parte do trabalho excedente não é paga ao operário, e serve para aumentar cada vez mais o capital. Marx diz que, ao comprar a força de trabalho, o capital ista "adquire o direito de servir-se dela ou de fazê -la funcionar durante todo o dia ou toda a semana (...) Como vendeu sua força de trabalho ao capitalista, todo o valor, ou todo o produto por ele (pelo operário) criado pertence ao capitalista, que é dono de sua força de trabalho, pro tempore.Esse tipo de intercâmbio entre o capital e o trabalho é o que serve de base à produção capitalista, ou ao sistema do salariado, e tem de conduzir, sem cessar, à constante reprodução do operário como operário e do capitalista como capitalista"3 .
Chama-se mais-valia, portanto, ao valor que o operário cria além do valor de sua força de trabalho, e que é apropriado pelo capitalista.


5. Alienação e ideologia
Com a descrição da mais -valia, Marx configura o caráter de exploração do sistema capitalista. De imediato o operário não é capaz de reverter o quadro porque se encontra alienado. Ao desenvolver o conceito de alienaçao, Marx rejeita as explicações comuns que aparecem em toda a história da filosofia, ora com contornos religiosos, ora metafísicos ou morais. A elas opõe a análise das condições reais do trabalho humano e descobre que a alienação tem origem na vida econômica: quando o operário vende no mercado a força de trabalho, o produto que resulta do seu esforço não mais lhe pertence e adquire existência independente dele. ... ele não mais projeta ou concebe aquilo que vai executar (dá-se a dicotomia concepção-execução do trabalho, a separação entre o pensar e o agir); com o aceleramento da produção, provocado pela crescente mecanização do trabalho (linha de montagem), o operário executa cada vez mais apenas uma parte do produto (trabalho parcelado ou trabalho "em migalhas"); o ritmo do trabalho é dado exteriormente e não obedece ao próprio ritmo natural do seu corpo. O produto do trabalho do operario subtrai -se portanto á sua vontade, à sua consciência e ao seu controle, e o produtor não se reconhece no que produz. O produto surge como um poder separado do produtor, como realidade soberana e tirânica que o domina e ameaça.
A esse processo Marx chama fetichismo da mercadoria. Da mesma forma, a mercadoria não é apenas o resultado da relação de produção, mas vale por si mesma, como realidade autônoma e, mais ainda, como determinante da vida dos homens. Produz-se então a grande inversão em que a reificação do homem (res: "coisa") é o contraponto do fetichismo da mercadoria. Quando a mercadoria se "anima", se "humaniza", obriga o homem a sucumbir às forças das leis do mercado que o arrastam ao enfrentamento de crises, guerras e desemprego. A consequência é a desumanização do homem, sua reificação. O que faz com que os homens não percebam a reificação e não reajam prontamente à exploração é a ideologia
. À medida que o modo de produção vai sendo superado, a classe dominante procura retardar a transformação mantendo o modo de produção caduco com suas superestruturas, disfarçando as contradições, dissimulando as aparências e apresentando soluções reformistas, impedindo, assim, que as classes oprimidas formem a sua própria consciência de classe. Em outras palavras, as idéias, condutas e valores que permeiam a concepção de mundo de uma determinada sociedade, e que representam os interesses da classe dominante, ao serem generalizadas às classes dominadas ajudam a manter a dominação. A ideologia impede que o proletário tenha consciência da própria submissão, porque camufla a luta de classes quando faz a representação ilusória da sociedade mostrando -a como una e harmônica. Mais ainda, a ideologia esconde que o Estado, longe de representar o bem comum, é expressão dos interesses da classe dominante.

6-Estado e sociedade

Para Marx, o Estado não supera as contradições da sociedade civil, mas é o reflexo delas, e está aí para perpetuá -las.
Por isso só aparentemente visa ao bem comum, estando de fato a serviço da classe dominante. Portanto, o Estado é um mal que deve ser extirpado.
Ao lutar contra o poder da burguesia, o proletariado deve destruir o poder estatal, o que não será feito por meios pacíficos, mas pela revolução. No entanto,
diferentemente dos anarquistas, Marx não considera viável a pass agem brusca da sociedade dominada pelo Estado burguês para a sociedade sem Estado, havendo a necessidade de um período de transição.
A classe operária, organizando-se num partido revolucionário, deve destruir o Estado burguês e criar um novo Estado capaz de suprimir a propriedade privada dos meios de produção. A esse novo Estado dá-se o nome de ditadura do proletariado, uma vez que, segundo Marx, o fortalecimento contínuo da classe operária é indispensável
enquanto a burguesia não tiver sido liquidada como classe no mundo inteiro.
A primeira fase, de vigência da ditadura do proletariado, corresponde ao socialismo, que supõe a existência do aparelho estatal, da burocracia, do aparelho repressivo e do aparelho jurídico. Nessa fase persiste a luta contra a antiga classe dominante, a fim de evitar a contra -revolução. O princípio do socialismo é: "De cada um, segundo sua capacidade, a cada um, segundo seu trabalho".
A segunda fase, chamada comunismo, tem como princípio: "De cada um, segundo sua capacidade, a cada um, segundo suas necessidades". O comunismo se define pela supressão da luta de classes e, consequentemente, pelo desaparecimento do Estado. Na "anarquia feliz" o desenvolvimento prodigioso das forças produtivas levaria
à"era da abundância", à supressão da divisão do trabalho em tarefas subordinadas (materiais) e tarefas superiores (intelectuais), à ausência de contraste entre cidade e campo e entre indústria e agricultura.
Se a passagem para o comunismo significa o desaparecimento das classes, como fica a afirmação que fizemos inicialmente de que, para Marx, a luta de classes é o motor da história?
O movimento da história continuaria, pois ela é um processo; só que a luta não mais seria entre a classe dominante e a dominada, mas entre a vanguarda e os elementos que impedem as mudanças por comodismo ou incompreensão. A luta seria entre o progresso e as forças conservadoras, entre o novo e o velho. 

Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 240-245
SOCIALISMO. Conjunto de doutrinas e movimentos políticos voltados para os interesses dos trabalhadores, tendo como objetivo uma sociedade onde não exista a propriedade privada dos meios de produção. Pretende eliminar as diferenças entre as classes sociais e planificar a economia, para obter uma distribuição racional e justa da riqueza social. Em geral, apresentam-se como partidários do socialismo partidos e organizações comunistas, social- democratas, socialistas e trabalhistas, além de agrupamentos libertários e igualitários de tendência anarquista e, mais recentemente, algumas correntes de diversos movimentos sociais e de minorias. O socialismo estendeu-se também após a Segunda Guerra Mundial aos movimentos de libertação nacional (mesclando-se nesse caso com o nacionalismo) e à luta de vários povos contra a ditadura e o autoritarismo. Dessa diversidade de inspirações e matizes ideológicos resultam profundas divergências quanto aos métodos de construção da nova sociedade, o papel dos partidos políticos, a função do Estado e a questão da democracia no plano político e no econômico. Em certa medida, a noção de socialismo confunde- se com a de comunismo, embora, modernamente, haja profundas diferenças de teoria e prática entre os dois movimentos. A idéia de comunismo remonta à Antiguidade grega e ressurge em movimentos sociais de inspiração religiosa que marcaram a crise da sociedade feudal e o surgimento da Idade Moderna. O socialismo, por sua vez, é típico da sociedade pós-Revolução Industrial, ligando-se às primeiras manifestações da classe operária e de artesãos contra as injustiças sociais advindas da consolidação do modo de produção capitalista. O termo “socialismo” foi empregado pela primeira vez em 1827, no jornal de Robert Owen Cooperative Magazine. Na época, foi utilizado como sinônimo de cooperação, democracia radical e também de comunismo. O pensamento socialista, nas suas origens, ligava-se fundamentalmente às idéias e propostas de reforma social de Owen, Saint- Simon e Fourier, que Karl Marx e Friedrich Engels chamaram de socialistas utópicos. Para se
diferenciarem desse socialismo, Marx e Engels se posicionavam como comunistas; ao mesmo tempo, consideravam-se fundadores do socialismo científico: partiam de um aprofundado estudo das relações capitalistas de produção, para propor sua eliminação por meio da ação revolucionária dos trabalhadores, aglutinados em torno da Internacional Socialista, criada por ambos em Londres, em 1864. Participavam dessa I Internacional as mais diversas correntes do movimento socialista e operário. O debate ideológico que se travou nessa organização posicionou como rivais os adeptos de Karl Marx e os partidários de Joseph Proudhon. Estes negavam a ação política da classe operária e propunham uma alteração da sociedade a partir da  criação de uma rede de cooperativas de produção geridas pelos trabalhadores,  sistema que terminaria suplantando o próprio capitalismo e o Estado.
Presente em todos os movimentos reivindicatórios da classe operária, o socialismo teve, no século XIX, como feito histórico mais significativo a instauração revolucionária da Comuna de Paris (1871), onde tiveram destaque os seguidores de August Blanqui. Após a liquidação da Comuna, o movimento socialista esteve vinculado à ação da Internacional, onde se dividiam os marxistas e os anarquistas liderados por Bakunin. A criação de partidos socialistas na Europa (o primeiro foi o alemão, em 1875) relacionou a luta pelo socialismo, fundamentalmente, aos adeptos de Marx, organizados a partir de 1889 na II Internacional. Questões de estratégia e tática socialista e a polêmica em torno da participação na Primeira Guerra Mundial  conduziram o movimento socialista marxista a uma cisão: de um lado os seguidores do revisionismo, que defendiam a construção do socialismo por meio de reformas sociais e cujos principais representantes foram Eduard Bernstein e Karl Kautski; de outro, os adeptos de Lênin e Rosa Luxemburgo, defensores da revolução e da ditadura do proletariado como momentos  necessários para a construção do socialismo. Essa divisão marcou as duas tendências fundamentais do socialismo na atualidade, alargando-se a  istância entre ambas, sobretudo após a Revolução de Outubro de 1917, que implantou o socialismo na Rússia. A tendência revisionista ou reformista desligou-se do pensamento de Marx, sendo hoje representada pelos partidos socialistas, social-democratas e trabalhistas da Europa e outras partes do mundo, ao passo que o pensamento socialista de tradição marxista está oficialmente representado pelos partidos comunistas e,   secundariamente, por organizações de inspiração trotskista. Ao mesmo tempo, o chamado socialismo real (a sociedade nos moldes das existentes na União Soviética, em países da Europa Oriental, na China, no Vietnã e em Cuba) está sendo submetido a rigorosa crítica pelas novas correntes do pensamento socialista (muitas delas baseadas em Marx), que procuram recuperar a tradição democrática do socialismo, no que diz respeito à função do Estado, dos partidos políticos, suas relações com os trabalhadores e a gestão da economia NOVÍSSIMO DICIONÁRIO DE ECONOMIA. São Paulo: Best Seller, 1999.

COMUNISMODoutrina que defende a abolição da propriedade privada dos meios de produção, a distribuição igualitária dos bens produzidos pela sociedade e que a organização da riqueza social seja feita pela própria comunidade de produtores.
 Propõe ainda a extinção do Estado, o autogoverno da coletividade e o fim das
classes sociais.
As primeiras formas de organização humana são classificadas como modalidades de comunismo primitivo. Nelas não havia diferenciação social e a existência do grupo baseava- se na cooperação entre todos os indivíduos, que gozavam dos mesmos direitos e deveres.
Não havendo Estado ou hierarquia social rígida, essas organizações sociais sustentavam se não na sujeição de alguns indivíduos a outros, mas na responsabilidade de todos perante a comunidade.
No pensamento social moderno, o comunismo apresenta-se como sistema econômico
a ser implantado em lugar do capitalismo, a partir da destruição deste por uma revolução
social conduzida pelos trabalhadores. Idéias comunistas, no entanto, já aparecem na Antiguidade. Na obra A República, Platão descreve uma sociedade ideal cuja camada dirigente obedece a normas comunitárias de vida, embora o mesmo não ocorra com as camadas inferiores e os escravos. Na Idade Média, as heresias que se propagavam entre alguns setores do baixo clero e entre os camponeses estavam comumente impregnadas
de aspirações igualitárias. A partir do Renascimento, com as mudanças trazidas
pela desagregação da economia do feudalismo e pela Revolução Comercial, alguns autores idealizaram sociedades comunistas, como as descritas nas obras Utopia, de Thomas Morus, e A Cidade do Sol, de Tommaso Campanella.
 Com a consolidação do modo de produção capitalista, no decorrer da Revolução Industrial, o sonho de uma sociedade comunista tornou-se mais freqüente.
As condições desumanas de vida a que foi lançado o nascente proletariado geraram severas condenações à propriedade capitalista, revoltas operárias e propostas de reforma social. Robert Owen, na segunda década do século XIX, propôs aos trabalhadores e artesãos ingleses a criação de uma sociedade alternativa baseada nas cooperativas industriais e agrícolas. À medida que o capitalismo se impunha, cresciam as associações secretas, seitas e sindicatos, que se insurgiam contra as novas relações de produção.
Na França, as idéias reformadoras de Charles Fourier e Saint-Simon tiveram grande repercussão entre os trabalhadores. Ambos, ao lado de Robert Owen, seriam mais tarde chamados por Marx de socialistas utópicos, pois pretendiam resolver os problemas dos trabalhadores sem intervir diretamente nas relações entre as classes, isto é, sem procurar desenvolver o antagonismo entre a burguesia e o proletariado. Manifestações e revoltas operárias eclodiram na Inglaterra (o movimento cartista), na França (rebeliões em
Lyon e Paris) e na Alemanha, em toda a primeira metade do século XIX. Na França, até os acontecimentos da Comuna de Paris (1871), o movimento insurrecional de tendência comunista esteve ligado basicamente às idéias de Auguste Blanqui, partidário dos métodos conspirativos de François Babeuf (Gracchus). Novas abordagens da questão social na sociedade capitalista surgiram a partir de 1848, após os levantes operários
na França e na Alemanha. Então, as idéias dos socialistas utópicos perdiam influência e
duas tendências passavam a disputar a hegemonia dos movimentos comunista e operário:
os partidários de Karl Marx e Friedrich Engels (fundadores do socialismo científico) e os partidários de Joseph Proudhon, um dos pioneiros do anarquismo.
 Em seu Manifesto Comunista (1848), Marx e Engels submeteram a uma crítica rigorosa as relações sociais capitalistas e sustentaram que, intensificando a luta de classes, os trabalhadores poderiam destruir a dominação da burguesia e construir a sociedade comunista. Para eles, ao desenvolver enormemente as forças produtivas nos mercados nacionais e internacionais e ao concentrar cada vez mais a riqueza social, o capitalismo criava as condições de sua própria superação. Por isso, ambos se insurgiam contra as propostas dos socialistas utópicos e afirmavam que a libertação dos trabalhadores
deveria ser obra dos próprios trabalhadores. Derrotando pela força a burguesia e apossando- se do poder do Estado, os operários expropriariam os capitalistas e coletivizariam todos os meios de produção e de distribuição de bens. Os dois pensadores pouco se detiveram sobre as características e as formas de organização da
futura sociedade da abundância, onde o trabalho deixaria de ser um sacrifício na qualidade de trabalho alienado e iria se tornar um prazer para todos os membros da sociedade, porque seria um trabalho livre e consciente. Ao mesmo tempo, cada pessoa receberia da sociedade o suficiente para satisfazer suas necessidades físicas e culturais.
 Com o desaparecimento das classes sociais, o Estado perderia suas funções, que seriam gradativamente absorvidas pela sociedade civil. O desaparecimento do Estado era também uma tese central dos anarquistas, principais adversários de Marx. Representados por Proudhon e posteriormente por Bakunin, os anarquistas sustentavam que a extinção do Estado e das classes sociais deveria ser imediata (isto é, não seria um processo gradativo), e a autogestão econômica e política, a prioridade do movimento anticapitalista. Por isso, preferiam ser considerados libertários e não comunistas. As divergências entre anarquistas e marxistas desenrolaram se ao longo de toda a I Internacional. A partir de 1880, sobretudo, os termos “comunista” e “socialista” ficaram ligados fundamentalmente aos seguidores de Marx.
Com a vitória da Revolução Russa de 1917, o movimento comunista expandiu-se por todo o mundo, sendo fundados partidos comunistas em dezenas de países. Aglutinados em torno da Internacional Comunista, sediada em Moscou, esses partidos empreenderam movimentos  insurrecionais e conquistaram o poder em vários países. Mais tarde, o movimento comunista contemporâneo passou por divergências que ganharam várias tendências opostas, cada uma delas atribuindo a si própria a maior fidelidade ao pensamento de Marx e Engels. Assim ocorreu na divergência entre Lênin e os  representantes da II Internacional, no rompimento entre Stálin e Trotski, na denúncia de Stálin por Kruschev, nas divergências e conflitos entre a União Soviética e a China, entre esta e a Albânia e no afastamento dos dirigentes do eurocomunismo em relação aos soviéticos. Atualmente, em conseqüência da desagregação dos regimes comunistas dos países do Leste Europeu, os partidos comunistas dos países capitalistas também entraram em colapso.
Com uma estrutura burocrática muito rígida, com a excessiva centralização da economia e com um aparato político repressivo, os regimes comunistas do Leste Europeu não puderam acompanhar a revolução tecnológica que marcou os países capitalistas desenvolvidos a partir dos anos 70. Como durante todo esse período continuaram a dar prioridade à indústria pesada e de armamentos, as populações desses países continuaram à margem da produção dos produtos de consumo, responsável pela melhoria do padrão de vida dos seus vizinhos ocidentais.
À exceção de Cuba, da Coréia do Norte e da Albânia, em todos os demais países o planejamento central deu lugar ao mercado como principal alocador de recursos. Na China, embora a orientação seja na direção de uma economia de mercado [capitalismo], o regime político ainda continua fechado e dominado pelo Partido  comunista. NOVÍSSIMO DICIONÁRIO DE ECONOMIA. São Paulo: Best Seller, 1999.


2.1 MARXISMO-LENINISMO


Lênin e depois Stálin elaboraram o marxismo-leninismo, que se tornou a ideologia oficial do partido único na URSS e de todos os partidos europeus que aspiravam à revolução. No entanto, a situação histórica dos diversos países exigia dos intelectuais um esforço de adaptação e coacção da teoria marxista, de modo que nunca foi tranquilamente aceita a chamada "ideologia oficial".
Com o fechamento do regime na era stalinista, a perseguição aos defensores de teorias heterodoxas costumava culminar com a eliminação dos dissidentes, tal como ocorreu com Bukhárin e Trótski.
Leon Trótski (1879-1940) foi companheiro de Lênin nas lutas de outubro de 1917. Defendeu a "revolução permanente", que significa o prolongamento da luta de classes em escala nacional e internacional, o que deveria gerar inevitavelmente a guerra civil interna e a guerra revolucionária externa. Partindo do princípio
de que o mundo capitalista exerce influência perniciosa sobre os países que pretendem implantar o socialismo, Trótski pregava a necessidade da expansão da revolução mundial.
 Essa posição foi combatida por Stálin, seu mais ferrenho inimigo, que defendia a tese do "socialismo num só país".Trótski, perseguido, refugia-se no México, onde foi assassinado por um stalinista em 1940
Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 264
2.2 STALINISMO
Lênin morreu cedo, em 1924, e seu sucessor foi Joseph Stálin (1879 -1953), que dirigiu a URSS durante quase trinta anos com mão de ferro. Nesse período o Estado é de tal modo fortalecido que se transforma em Estado totalitário.
Contrariando a orientação de Lênin e Trótski, Stálin imprime ao socialismo um caráter predominantemente nacionalista, fortalece a polícia política, a Tcheka, o exército e o partido único e desenvolve o "culto á personalidade". Menos preocupado com a teoria e mais com a formulação de máximas de ação, com ele o marxismo torna -se dogmático, sem tolerância com nenhuma forma de crítica, o que provoca inúmeros expurgos e perseguições, além de gerar um regime de terror.
A URSS transforma-se nos anos 40 em grande potência mundial, desenvolvida e industrializada. A planificação econômica rigidamente centralizada dá ênfase à indústria pesada, ainda que nos setores de agricultura e produção de bens de consumo tenham sido enfrentadas dificuldades maiores.p. 263

A Revolução Russa de 1917 derruba o czarismo e implanta novo regime, inspirado no marxismo -leninismo.Segundo Marx,... na fase transitória entre o capitalismo e a nova ordem deve se instalar a ditadura do proletariado, na qual o Estadoembora concebido essencialmente como domínio e coerção, deve desaparecer com o tempo.Apesar da coerção do Estado, a ditadura do proletariado é considerada uma democracia pelos marxistas, pois todos teriam acesso ao poder, já que os sovietes são compostos por deputados escolhidos entre os diversos segmentos sociais, como operários, soldados e camponeses. Além disso, a propriedade coletiva dos meios de produção reverteria, para todos, os benefíciosda produção, antes usufruidos por alguns poucos privilegiados.
No entanto, a idéia do gradual desaparecimento do Estado não se concretiza; ao contrário, é inevitável o seu fortalecimento logo após a revolução, a fim de evitar a contra-revolução. Tal situação já se verifica durante o governo de Lênin, e recrudesce após sua morte, quando Stálin sobe ao poder em 1924. O partido único torna-se onipotente, sendo proibidas as oposições em seu interior. A liberdade de imprensa e de expressão é reduzida, e os políticos dissidentes são perseguidos e dizimados.
A Tcheka, polícia política, cuida de reprimir os heterodoxos. Proliferam os campos de concentração de trabalhos forçados e os hospitais psiquiátricos, onde são internados os dissidentes, após intensas e brutais campanhas de expurgo.Instaura-se o terror, justificado pela necessidade de fortalecimento da ideologia oficial ameaçada. O poder é cada vez mais centralizado e cresce oculto à personalidade de Stálin.
Com Stálin a teoria degenera em dogmatismo e se impõe independente da experiência vivida, negando qualquer forma de pensamento divergente. A petrificação da doutrina acrescenta-se a formulação de máximas de ação. Tudo isso está longe da concepção marxista baseada na dialética teoria e prática.A ação totalitária ainda é possível porque a administração do terror é científica, sustentada pela tecno-burocracia. Essa organização, importada do capitalismo ocidental, baseia-se no regime de divisão racional do trabalho e se estrutura em uma rede de microorganizações, o que permite o controle da máquina do Estado.
Para melhor exercer o poder, Stálin interfere em todos os domínios da cultura:Jdanov, membro do partido, dá os cânones da produção artística e critica os "desvios burgueses " das letras e das artes; o biólogo Lysenko rejeita a genética mendeliana,acusando-a de burguesa e conservadora (!) porque, para Mendel, os caracteres veiculadosconservam-se de geração em geração; Lysenko retoma as ultrapassadas teorias lamarckianas, segundo as quais os caracteres adquiridos poderiam se tornar hereditários.Após a morte de Stálin e a ascensão de Kruchev (1956) inicia -se o processo de desestalinização, com a denúncia dos crimes e violências, a destruição do cultoà personalidade e a crítica ao dogmatismo.
Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p.254-255


2.3 A social-democracia


 O enfrentamento das dificuldades decorrentes da depressão econômica que atingi a toda a Europa, no final do século XIX, fez com que a Segunda Internacional, iniciada em1889, tivesse características diferentes da anterior. Menos "internacional", favoreceu a organização relativamente autônoma dos grupos socialistas dos diversos países, atendendo às peculiaridades nacionais.Dessa forma, na Alemanha predominou a ideologia do Partido Social -Democrata Alemão, inspirador da social -democracia. 
Os principais teóricos dessa tendência são Eduard Bernstein (1850-1932) e Karl Kautsky (1854-1938).
Apesar de divergirem em vários pontos, os social -democratas concordam em recusar a via revolucionária para a implantação do socialismo, e buscam mecanismos legais democrático-parlamentares que levem, numa lenta evolução orgânica, à superação do capitalismo. Recusam portanto a violência e não querem separar socialismo e democracia.
Várias medidas são tomadas para a conquista de direitos sociais, como legislação de proteção ao trabalhador, direito de associação, criação de inúmeras cooperativas de consumo e ampla divulgação das idéias socialistas por jornais, revistas, teatro etc. O resultado desses esforços significou conquistas reais para os operários.
Até 1914, o fortalecimento do movimento sindical na Alemanha tornou possível a colaboração permanente entre Estado, empresas e classe trabalhadora.
A social-democracia não se confunde com o liberalismo social ... pois o Estado de bem-estar social é anti-socialista e pretende manter o capitalismo, ao passo que a social -democracia visa em última instância a superação do capitalismo e a implantação do socialismo.
A social-democracia sofreu inúmeras críticas. Do ponto de vista econômico, porque a elevada carga fiscal desestimula os investimentos e leva a economia a impasses. Do ponto de vista social, há a alegação de que o Estado nem sempre consegue atender aos inúmeros encargos assumidos nem conter o aumento pernicioso do aparelho burocrático. Do ponto de vista ideológico, a social -democracia sofre acusações dos liberais, já que estes criticam o socialismo, e dos próprios socialistas, que a acusam de viver bem demais com o capitalismo, sem conseguir superá-lo. 
Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 264

2.4 A esquerda da social-democracia


 Rosa Luxemburgo (1870-1919) e Karl Liebknecht (1871-1919) representam a ala mais radical da social-democracia alemã. Discordam daqueles que deram seu aval à participação da Alemanha na Primeira Guerra Mundial e criticam os revisionistas como Bernstein, retomando a perspectiva revolucionária como forma de destruição do capitalismo. Rosa Luxemburgo defendia a tese da espontaneidade das massas e criticava o partido único, cuja consequência é o governo ditatorial de uma minoria.Alertou severamente sobre os perigos da burocracia, que poderia levar à supressão da democracia.Ajudou na formação da Liga Espartaquista (o nome Espártaco lembra o escravo revoltado que desafiou o governo de Roma no ano 71 da nossa era) e fundou o Partido Comunista Alemão.Em 1919, Rosa e Liebknecht são fuzilados. Na década de 30, a cisão entre o Partido Comunista Alemão e a social-democracia será uma das causas da ascensão de Hitler ao poder. 
Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 265


2.5 Gramsci
Antonio Gramsci (1891-1937) foi um dos mais importantes teóricos italianos, preso durante onze anos pela ditadura fascista. Mesmo no cárcere, onde ficouaté a morte, escreveu muito, enfatizando a crítica ao dogmatismo do marxismo oficial, que , ao petrificar a teoria, impedia a prática revolucionária. Suas principais obras são Concepção dialética da história, Os intelectuais e a organização da cultura, Literatura e vida nacional, Cadernos do cárcere.
Gramsci preocupa-se com o economicismo do marxismo tradicional expresso na interpretação rígida da relação entreinfra-estrutura e superestrutura. Sem abandonar o materialismo histórico dialético, torna mais flexível a relação entre o econômico e o ideológico -político quando analisa o papel dos intelectuais.
Sua contribuição teórica está sobretudo em ter compreendido que o Estado capitalista não se impõe apenas pela coerção e violência explícita, mas também por consenso, por persuasão. Ou seja, por meio das instituições da sociedade civil, como Igreja, escola, partidos políticos, imprensa, a ideologia da classe dominante é difundida e preservada.
Gramsci usa o conceito de hegemonia para explicar o processo. Etimologicamente, essa palavra significa "dirigir, guiar, conduzir". Uma classe é hegemônica quando é capaz de elaborar sua própria visão de mundo, ou seja, um sistema convincente de idéias pelas quais conquista a adesão até da classe dominada. A tarefa de elaboração cabe aos chamados intelectuais orgânicos.
É dessa forma que também se impede a tomada de consciência da classe dominada. Não tendo sua própria consciência de classe, permanece desorganizada e passiva, e as eventuais rebeliões não modificam a situação de dependência. Por isso Gramsci considera a necessidade de os elementos das classes populares continuarem organicamente ligados à sua classe de forma a elaborarem, coerente e criticamente, a experiência proletária por meio dos seus próprios intelectuais orgânicos. Só assim será possível a unificação da teoria com a prática, ou seja, da ação revolucionária com a transformação intelectual. Gramsci abriu caminho para posteriores reflexões de Nicos Poulantzas e de Louis Althusser, este último o teórico do conceito de aparelhos ideológicos de Estado. 
Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 265
 Hegemonia, acima de tudo, capacidade de direção intelectual e moral, em virtude da qual a classe dominante, ou aspirante ao domínio, consegue ser aceita como guia legítimo, constitui-se em classe dirigente e obtém o consenso ou a passividade da maioria da população diante das metas impostas à vida social e política de um país. É este o significado que se depreende da "teoria da Hegemonia" que Antônio Gramsci transformou em centro da sua reflexão sobre a política e o Estado modernos e se acha registrada nas páginas dos Quaderni del carcere. Segundo Gramsci, numa sociedade de classes, a supremacia de uma delas se exerce sempre através das modalidades complementares e, de fato, integradas, se bem que analiticamente dissociáveis, do domínio e da Hegemonia. Se o domínio se impõe aos grupos antagônicos pelos mecanismos de coerção da sociedade política, a Hegemonia se exerce sobre grupos sociais aliados ou neutrais, usando dos "mecanismos hegemônicos" da sociedade civil. Uma conjugação de força e de consenso, de ditadura e de Hegemonia é fundamental em todo o Estado; o que varia é a proporção entre ambos os elementos, em razão do grau de desenvolvimento da sociedade civil, que, como sede da ação ideologicamente orientada, é o locus de formação e difusão da Hegemonia, o centro nevrálgico de toda a estratégia política.
Quando a sociedade apresenta uma "estrutura maciça", como ocorre no Ocidente industrial e mobilizado pelo capitalismo, o papel da ação hegemônica torna-se crucial, não só na gestão como até mesmo na conquista e construção do Estado, um papel privilegiado em relação ao da força, no entanto sempre necessariamente presente. Não só será inviável que o domínio se possa segurar aqui por longo tempo faltando a Hegemonia, como, diversamente do que acontece nos países onde "o Estado é tudo" e a sociedade civil é informe e indistinta, tornar-se-á impossível conquistar o poder, se a força que ambiciona "fazer-se Estado" não se fizer primeiro hegemônica no bloco social antagônico ao bloco que está no poder.
Por outros termos, no Ocidente, a Hegemonia não é apenas uma modalidade necessária do exercício do poder para a classe dominante, é também um pré-requisito estratégico para qualquer classe revolucionária. Gramsci expressa este conceito fundamental da sua teoria revolucionária em confronto polêmico com o economismo dominante, usando as metáforas da "guerra de posição" e da ocupação gradual das "casamatas" do campo inimigo por parte do sujeito revolucionário. Compreende-se à luz desta fundamentação teórica como a crise do Estado, quando é "orgânica", tem por conteúdo uma crise de Hegemonia, uma quebra na aptidão dos grupos dominantes se tornarem também dirigentes, um grave déficit de legitimidade em quem poderia preparar a transição a novas formas de Estado, a equilíbrios orgânicos mais avançados (é este o caso da revolução jacobina) ou estáticos (como no Ressurgimento italiano, no fascismo e nas numerosas variações históricas da "revolução passiva").
É óbvio que toda classe social se serve, no processo da sua organização em classe dirigente, de uma peculiar instrumentação hegemônica: o parlamentarismo, os partidos liberal-democráticos, a opinião pública com os grandes órgãos de informação, quando se trata da burguesia capitalista mais avançada, com apoio estrutural do mercado e da própria organização fabril; os conselhos operários, no primeiro momento, o sindicato e, sobretudo, o partido revolucionário, quando é o proletariado que luta pelo poder. A este incumbirá a tarefa de selecionar os intelectuais que compõem a classe operária, organizar a sua Hegemonia, muni-los de uma teoria e de uma estratégiacapazes de confrontar vitoriosamente a Hegemonia das classes dominantes.
Seguindo o caminho indicado por Gramsci, o debate acerca da Hegemonia continuou até os nossos dias, definindo melhor o conceito e enriquecendo-o de novas particularidades. Alguns estudiosos marxistas, especialmente Nicos Poulantzas, defenderam a importância de uma função hegemônica no seio do próprio bloco que detém o poder, destinada a regular as contradições existentes entre as diversas classes e frações de classe que o compõem. A Hegemonia de uma classe ou fração sobre as demais que compõem o bloco do poder dominante faz com que cada uma renuncie aos seus interesses imediatos, interesses econômico-corporativos, em benefício do comum interesse político pela exploração e domínio das classes subalternas. A Hegemonia atua como princípio de unificação dos grupos dominantes e, ao mesmo tempo, como princípio de disfarce do domínio de classe. Simetricamente, no bloco revolucionário entendido como unidade contraditória entre classes dominadas, a Hegemonia indica a transformação política, para além de todo particularismo e corporativismo, do interesse da classe operária em interesse geral de todos os explorados. Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998 p. 581

Quanto às suas ideias sobre os intelectuais, Gramsci sugere que, se, por um lado, os filósofos profissionais desenvolvem a capacidade de pensamento abstrato, todos os seres humanos têm uma prática filosófica quando interpretam o mundo, ainda que, frequentemente, de forma não sistemática e não crítica. A filosofia converte-se, segundo a expressão de Marx, em “uma força material” com efeitos sobre o “senso comum” de uma época. Um sistema filosófico deve ser colocado em perspectiva histórica, no sentido de que não pode ser criticado simplesmente num plano abstrato, mas deve ser referido às ideologias que ajuda várias forças sociais a gerarem. Como uma “filosofia da práxis”, o marxismo pode ajudar as massas a se tornarem protagonistas da história, à medida em que um número cada vez maior de membros da classe subalterna venha a adquirir conhecimentos especializados, desenvolvendo a possibilidade de uma atividade intelectual crítica e uma visão do mundo coerente. Gramsci critica duas posições influentes em sua época, que reforçam a passividade e a resignação refletidas em frases do tipo “é preciso ser filosófico acerca disso”: o idealismo de Croce e o que ele considerava a interpretação simplista e mecânica do marxismo por Bukharin. Essa abordagem encontra ecos na visão crítica de Gramsci sobre a literatura, o folclore e as relações entre a cultura popular e a “alta” cultura ou a cultura “oficial”, que deve ser analisada do ponto de vista de como os intelectuais, enquanto grupos, se relacionam com a massa da população e com o desenvolvimento de uma cultura nacional popular. Dicionário do pensamento marxista. Tom Bottomore.  Zahar.

2.6 A teoria crítica da sociedade
A Escola de Frankfurt surgiu na Alemanha em 1925, representada por Max Horkheimer, Theodor Adorno, Herbert Marcuse, Walter Benjamin, Erich Fromm e Jurgen Habermas2. 
Foi responsável pela formulação da chamada teoria crítica da sociedade, Os principais temas dessa reflexão de natureza sociológico -filosófica são: a autoridade, o autoritarismo, o totalitarismo, a família, a cultura de massa, o papel da ciência e da técnica, a liberdade. Embora o ponto de partida seja marxista, os diversos autores repensam esses temas de formas diferentes, muitas vezes se afastando da ortodoxia marxista.Os frankfurtianos elaboram a teoria crítica da sociedade em oposição ao que chamam de teoria tradicional, significando esta última a herança da teoria marxista bem como as diversas interpretações desse pensamento.
Uma das críticas feitas se refere ao dogmatismo dos leninistas e stalinistas quando desenvolvem uma concepção naturalista da história, segundo a qual a evolução dos fatos históricos marcha inexoravelmente em direção à sociedade sem classes. Trata -se de uma concepção determinista e evolucionista típica do positivismo predominante no final do século XIX.
Segundo a concepção naturalista, o desenvolvimento capitalista produziria de forma irreversível a alienação e pauperização crescente da classe operária e a agudização da crise resultaria na revolução e na vitória inevitável do socialismo. Resulta daí a noção de progresso e da inevitabilidade da violência. Reconhece-se na evolução progressiva a passagem de um estádio "inferior" para outro necessariamente "melhor" do que o anterior. E a violência é considerada elemento necessário e constitutivo do progresso: a revolução é a "locomotiva da história", fator de evolução.
Os frankfurtianos recusam a noção de progresso e condenam a violência. Mas compreendem que esta "lógica"já estava embutida na noção de razão construída desde a Idade Moderna por Descartes. A exaltação da razão que culmina no positivismo oculta o lado escuro da razão responsável pela opressão e desumanização.Analisando as sociedades tecnocráticas, altamente tecnicízadas e "racionalizadas", a Escola de Frankfurt denuncia a perda da autonomia do sujeito, docilizado tanto pela sociedade industrial totalmente administrada como pelas extremas regressões à barbárie representada pelos Estados totalitários.No processo de recuperação da razão, os frankfurtianos reformulam o conceito de indivíduo, reivindicando a autonomia e o direito à felicidade. Nesse sentido dizem "não" ao sacrifício individual das gerações presentes as gerações futuras e criticam o revolucionário "tagarela" que exalta o sofrimento do povo ao mesmo tempo que o submete à mais cruel opressão, como é o caso de Robespierre e de todos os revolucionários contraditoriamente "democráticos".***2Habermas deve à Escola de Frankfurt a primeira orientação de seu pensamento, desenvolvendo a seguir um caminho próprio. 
Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 265-266
2.7 O eurocomunismo
De maneira geral, o marxismo, enquanto teoria e prática revolucionária, tem sofrido inúmeras alterações a partir das situações históricas do nosso tempo.A experiência soviética do totalitarismo stalinista obrigou os europeus a reavaliarem vários aspectos importantes, desde a critica desencadeada pelo processo de desestalinização levada a efeito por Rruchev, Na década de 70 surge o eurocomunismo, pelo qual os partidos comunistas ocidentais começam a repensar os seus próprios caminhos, independentemente da tutela soviética. A semelhança da social-democracia alemã, recusam a rigidez da teoria leninista da ditadura do proletariado e buscam formas pacificas e democráticas de transformação da sociedade.
Na Itália, por êxemplo, o Partido Comunista Italiano, liderado por Togliatti, afirma a idéia de que existem caminhos nacionais para o socialismo (policentrismo),defende o pluralismo partidário e preconiza as alianças que o proletariado deve fazer com outros grupos que compõem as classes populares, como camponese s, intelectuais e camadas médias.
O Partido Comunista Francês orienta -se na mesma direção, e se em 1970 expulsara de seus quadros o filósofo Roger Garaudy sob a acusação de "revisionismo de direita", será essa mesma a acusação dirigida por Moscou a o Partido em 1976, após a atuação de Georges Marciais no XXII Congresso da PCF. Entre outras mudanças, é substituído o conceito de ditadura do proletariado pelo de "desafio democrático", segundo o qual seria possível promover a transição pacífica e progressiva por meio do sistema representativo.
Na Espanha, após a queda do ditador Franco, a atuação de Felipe González é feita no sentido de também dar acentuada importância ao projeto eleitoral e à luta pela democratização social. Para tanto são valor izados os pactos entre empresariado e trabalhadores.

Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 266
3- A CRISE DO SOCIALISMO
"a implantação do chamado "socialismo real" encontrou dificuldades inúmeras e desembocou em becos sem saída. Se de início a União Soviética conseguira se transformar em uma potência industrializada, com a erradicação do analfabetismo e a resolução de inúmeros problemas sociais como moradia e saúde - o que significa uma forma de democracia substancial, já que os bens produzidos são distribuídos -, por outro lado sempre foi cerceada a liberdade individual, no que se refere ao direito de circulação, expressão e difusão da informação.
Quanto à política, muito cedo a promessa de que o poder deveria ser dado aos sovietes foi desmentida com a crescente identificação entre o Estado e o Partido Unico, que sufocou o pluralismo e a possibilidade de contestação do sistema. 
A centralização do poder criou a camada dirigente dos burocratas que mantinham privilégios e não conseguiam evitar a corrupção.
O desenvolvimento da economia militar e espacial, ao sugar enormes recursos, entra em descompasso com a insuficiente produção de bens de consumo. A diminuição do crescimento leva a um período de estagnação, sem condições de evitar a queda da qualidade de vida. Na gestão de Brejnev (de 1964-1982), o gigante soviético começa a perceber nítidos sinais da crise que se avizinha.
Quando Gorbatchev sobe ao poder em 1985, inicia uma série de mudanças. A perestroika, ou "reestruturação da economia", tem por objetivo quebrar a rigidez do planejamento estatal com a introdução de elementos de regulação de mercado. A glasnost, ou "abertura", "transparência", refere-se às reformas nas instituições políticas, visando a renovaçao dos quadros da velha e autoritária elite burocrática dirigente; suas conseqUências foram a libertação dos presos políticos, a garantia da imprensa livre e da liberdade individualA glasnost, por ter sido desencadeada ao mesmo tempo que a perestroika, trouxe ao conhecimento dos soviéticos fatos que aceleraram os anseios de libertação e a impaciência de aguardar as reformas mais lentas da economia.
Em novembro de 1989, a queda do muro de Berlim, símbolo da separação de dois mundos, teve um caráter desencadeador do processo de esfacelamento do Leste Europeu.
Mantida pela força, a antiga "ordem" se desintegra e os países -satélite Tchecoslováquia, Hungria, Polônia, Bulgária, Romênia e Alemanha Oriental proclamam um a um a sua independência. Com exceção da Romênia, onde houve violência na deposição do ditador, nos outros países as revoluções eram chamadas "de veludo", tal a "maciez" das transformações efetuadas, resultantes dos movimentos civis que reuniam pessoas de diversas tendências políticas.
Em pouco tempo a própria URSS se desintegra, incapaz de manter unidas as Repúblicas constituídas por diferentes etnias. É introduzido o pluralismo partidário, a imprensa livre e a economia de mercado. Gorbatchev não realiza a transição gradual que tinha em mente. Quando passa o poder para Ieltsin, encerra-se o capítulo da implantação do "socialismo real" no Leste Europeu.  "Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 3ª Edição Revista. Livro do Professor.  p. 281

A excessiva centralização politico-administrativa nos países socialistas gerou problemas que ao longo prazo, contribuíram para o fim do regime soviético: ineficiência do setor público; desperdício de recursos; baixa produtividade nas atividades agropecuárias por causa da falta de investimentos; falta de inovação tecnológica e de capacidade para produzir bens e serviços uma vez que a produção bélica consumia a maior parte dos recursos estatais  História: Das cavernas ao terceiro milênio. Patrícia Ramos Braick e Myriam Becho Mota. Parte III. São Paulo: moderna, 5ª edição ,2017, p. 579

 marxismo ocidental
Na década de 1920, desenvolveu-se, na Europa Central e Ocidental, um pensamento filosófico e político marxista que pôs em questão o MARXISMO SOVIÉTICO que então codificava as conquistas da Revolução Russa. Posteriormente chamado de “marxismo ocidental”, esse pensamento marxista crítico deslocou a ênfase do marxismo da economia política e do Estado para a cultura, a filosofia e a arte. Entre os marxistas ocidentais, que nunca foram mais do que um grupo bastante diferenciado de pessoas e correntes, estão Gramsci na Itália, Lukács e Korsch na Europa Central, e, a partir da década de 1930, a ESCOLA DE FRANKFURT , que desempenhou um papel essencial na preservação desse estilo de pensamento. Depois da Segunda Guerra Mundial, Goldmann e os círculos que se congregaram em torno das revistas Les Temps Modernes (Sartre, Merleau- Ponty) e Arguments (Lefebvre) constituíram um marxismo ocidental francês (ver Kelly, 1982). Sob a influência de Lukács, de Gramsci e da Escola de Frankfurt, novas gerações de marxismo ocidental surgiram, particularmente na Alemanha, na Itália e nos Estados Unidos....
O marxismo ocidental assumiu uma forma filosófica, mas a política nela se combinou com a filosofia. A oposição que despertou não veio apenas de divergências metafísicas: sua orientação filosófica implicava, e por vezes formulava, princípios de organização política que entravam em choque com o leninismo: os marxistas ocidentais tenderam menos ao partido de vanguarda do que aos CONSELHOS e a outras formas de autogestão. Suas teorias e princípios foram igualmente marcados pelas consequências de um fato histórico específico, qual seja a derrota constante das revoluções na
Europa Ocidental no século XX: em certo sentido, o marxismo ocidental pode ser considerado uma reflexão filosófica sobre essas derrotas....

Em primeiro lugar, os marxistas ocidentais, de Gramsci a Marcuse,
. Os intelectuais tornam-se mais do que lacaios da classe atribuem aos intelectuais um papel chave dominante; o próprio marxismo precisa contar com uma credibilidade intelectual e com o apoio dos intelectuais, e por isso tem de permanecer atualizado em relação à cultura burguesa. Os marxistas ocidentais empreenderam uma grande variedade de estudos sobre a cultura, abrangendo a literatura, a música e as artes plásticas. Também se empenharam, cada vez mais, em análises da cultura popular, de massa e comercial, pois, em sua concepção, a cultura de massa é parte da sociedade burguesa, tanto quanto o processo de trabalho, ou talvez mais. Alguns deles, em particular os pensadores da Escola de Frankfurt, voltaram-se para a teoria psicanalítica (ver PSICANÁLISE) por motivos semelhantes: a psicanálise não apenas lhes parecia uma das arestas críticas da cultura burguesa, como também prometia esclarecer como o indivíduo se impregnava da cultura...
Para explicar e desmontar a cultura burguesa, os marxistas ocidentais redescobriram ou inventaram os conceitos da falsa consciência, reificação e hegemonia cultural, que aparecem regularmente nos títulos de suas obras (Lukács, 1923; Guterman e Lefebvre, 1936; Gabel, 1962) Dicionario do pensamento marxista.Tom Bottomore.  Zahar.



4-SOCIALISMO E COMUNISMO SÃO NECESSÁRIOS?
Para os socialistas que recusam aceitar que o sonho da sociedade igualitária acabou, há o consolo de reconhecer que o chamado "socialismo real" nunca foi de fato o socialismo sonhado, e alguns o acusam de desvio da proposta inicial.
Em outro nível de discussão, há os que preferem não se referir a desvios, já que, se considerarmos a dialética da teoria e da prática, a política deve ser entendida como um processo dinâmico em que as interpretações teóricas precisam constantemente ser ajustadas às alterações das circunstâncias. Toda teoria é uma construção histórica, não é a verdade absoluta, e para que não envelheça, para ser mantida viva, é preciso transformá -la quando preciso.
Uma das causas do descrédito do "socialismo real" resultou justamente da incapacidade do dogmático marxismo-leninismo em ajustar-se aos novos tempos.
 Marx escreveu no século XIX, e não existe mais o capitalismo que ele conheceu.
Depois dele houve o fortalecimento das organizações representativas do operariado, e, com os frutos da intervenção do Estado assistencialista ( Welfare State) [VER 1.2], os trabalhadores conseguiram inegáveis vantagens que amenizaram o caráter extremamente cruel das relações de produção do século XIX.
Além disso, hoje há o prevalecimento do setor terciário (serviços), e não apenas do setor secundário (indústria), com inumeras profissões novas. Segmentos
médios atingem níveis de especialização com boa remuneração e melhores condições de trabalho. Isso não significa o fim da exploração do trabalho, mas essas mudanças
diluíram, de certa forma, a evidência da miséria contemplada por Marx. 

Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 269
Para uma análise completa do SOCIALISMO REAL e suas falhas click 

https://averacidadedafecrista.blogspot.com/2018/11/socialismo-x-capitalismo.html



5-O LADO ESCURO DO CAPITALISMO
 Os liberais se regozijam com a derrocada do Leste Europeu, contrapondo ao fracasso da economia planejada do "socialismo real" o pretenso sucesso da economia de mercado.Bem-vindos ao progresso, à eficácia, à produtividade?O que é, afinal, o capitalismo real? Ele não consiste apenas nas luzes que costumam ofuscar contradições intransponíveis. O lado sombrio parece fazer parte integrante da condição de crescimento do capitalismo. A expansão do capitalismo sempre foi feita a partir da criação de laços de dependência:

  • a colonização da América do século XVI ao XVIII;

  • o imperialismo na Africa e Asia no século XIX;

  • no século XX, a implantação das multinacionais nos países não -desenvolvidos.

  • .. os acordos do FMI (Fundo Monetário Internacional) têm feito com que a ajuda dos países mais ricos aos mais pobres os transforme de fato em eternos credores, descapitalizados para o pagamento dos juros da dívida.
Tais laços de dependência econômica resultam evidentemente em dependência política. Quando nos referimos aos países mais ricos do mundo, não encontramos sequer uma dezena entre as 170 nações existentes. E. se a distribuição de renda é assim irregular entre os países, ela também se aprofunda nos países subdesenvolvidos, como o Brasil, onde a concentração de renda atinge níveis alarmantes.
Um dos lados sombrios do capitalismo está portanto na má distribuição de renda, com concentração de riqueza em poucos países ricos, e, nestes, nos pequenos grupos de privilegiados. Em decorrência, não há como evitar os focos de pobreza e miséria, e ainda desemprego, migrações, marginalização de jovens e velhos, surtos inflacionários reprimidos por recessão longa e dolorosa.
Além disso, como contraponto da evolução tecnológica, ocorre a destruição do meio ambiente e o desequilíbrio ecológico, pois a lógica do interesse privado geralmente não coincide com o bem coletivo.
Se ao criticar o "socialismo real" as nações capitalistas contrapõem com orgulho a liberdade individual existente no Ocidente, é bom lembrar que se trata de uma liberdade formal, disponível só para os beneficiados do sistema. Ou seja, numa sociedade em que há injusta repartição de bens, os contratos de trabalho não são tão livres quanto se supõe. Nem é livre a "opção do trabalhador pelo desemprego, analfabetismo ou baixos salários.
Com isso queremos dizer que a crítica feita pelos socialistas ao capitalismo continua válida. Ainda mais no momento presente, em que o neoliberalismo tende a rejeitar o Estado assístencialista - que teoricamente significa a contradição com o livre mercado -, mas que bem ou mal tem ajudado a minorar as dificuldades dos trabalhadores. Daqui para frente, na selva do "salve-se quem puder", onde já sabemos de antemão que as chances no ponto de partida não são iguais, a tendência é o recrudescimento dos problemas sociais. P. 270
O capitalismo é um bom produtor de riqueza, mas um mau distribuidor dela." Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 3ª Edição Revista. Livro do Professor.  p. 282 



 6- ESTATISMO X LIVRE MERCADO. Como os países se enriqueceram?

Se são verdadeiras as críticas feitas ao socialismo real e ao capitalismo real, é preciso
reinventar a política. Se, como disse Bobbio, o capitalismo é o estado da injustiça e o
socialismo, o da não-liberdade, é preciso agora descobrir a maneira de conciliar a igualdade de oportunidades com a liberdade, ou seja, unir socialismo e democracia.
Há quem considere tratar -se de empresa impossível, argumentando serem incompativeis a economia socialista e a política democrática.
Segundo alguns críticos, a implantação do socialismo exige a estatização, o centralismo da economia planejada, donde decorre a burocracia e consequentemente a hierarquia e a perda de procedimentos democráticos.
 Quanto mais existe planejamento central, mais próximo fica o autoritarismo e /ou o totalitarismo. Portanto, o stalinismo não teria sido apenas "desvio" de rota, mas o caminho inevitável do socialismo.
Para outros, no entanto, o que existe é apenas a constataçao de que o "socialismo real" não soube fazer a conciliação com a democracia, e seria bom que essa experiência ajudasse a experimentar novos caminhos.
A saída estaria na economia mista, reunindo empresas estatais e particulares a fim de conjugar a economia de planejamento com a economia de mercado. Afinal, entre os extremos do laissez-faire e e do estatismo, devem existir fórmulas as mais variadas e inteligentes de controle da economia.
Para o funcionamento adequado desta, seriam necessários mecanismos políticos para garantir o prevalecimento de valores coletivos sobre os individuais. Os abusos, tanto do Estado como dos grupos privados , seriam controlados pelo estado de direito e por organizações da sociedade civil que pudessem garantir a coparticipação na formação das vontades e decisões.
Nesse sentido, o reconhecimento do fracasso da economia de planos pode significar não o retorno puro e simples à economia de mercado, mas a exigência de novas estruturas políticas, sociais e econômicas que permitam a gestão do patrimônio público e privado de maneira a impedir privilégios ou exploração e garantir iguais oportunidades de trabalho e de a cesso aos bens produzidos pela sociedade. 

Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 271

Hoje, quando olhamos para os países ricos, em sua maioria, eles praticam o livre comércio. Por isso, é comum pensarmos que foi com esta receita que eles se desenvolveram. Mas, na realidade, eles se tornaram ricos usando o protecionismo e as empresas estatais. Foi só quando eles enriqueceram é que adotaram o livre comércio para si e também como uma imposição a outros Estados. O nome do meu livro, Chutando a escada, faz referência a um livro de um economista alemão do século XIX, Friedrich List, que foi exilado político nos Estados Unidos em 1820. Ele critica a Inglaterra por querer impor aos EUA e à Alemanha o livre comércio. Afinal, quando você olha para a história inglesa, eles usaram todo o tipo de protecionismo para se tornar uma nação rica. A Inglaterra dizendo que países não podem usar o protecionismo é como alguém que após subir no topo de uma escada, chuta a escada para que outros não possam usá-la novamente.
Do mesmo jeito que mandamos nossas crianças para a escola ao invés do trabalho quando são pequenas, e as protegemos elas crescerem, os Governos de economias emergentes têm que proteger suas indústrias até que elas cresçam e possam competir com as indústrias de países ricos. Praticamente todos os países ricos, começando pela Inglaterra no século XVIII, Estados Unidos e Alemanha, no século XIX, Suécia no começo do século XX, além de Japão, Coreia do Sul e Taiwan...todos estes países se desenvolveram usando protecionismo, subsídios estatais, controle do investimento direto estrangeiro, e em alguns casos, até mesmo empresas estatais.
A Coreia do Sul depois da crise asiática de 1997 abraçou o neoliberalismo, não tanto como os países da América Latina, mas desregulamentou o mercado financeiro e alavancou políticas industriais. O resultado é que uma economia que costumava crescer 6%, 7%, 8% até 1990, agora está sofrendo para crescer 3%. Isso porque as mudanças que criaram líderes globais na área industrial, automotiva e eletrônica, também produziram baixo crescimento, falta de trabalho e não impediram que estas indústrias migrassem para outros países. E mesmo assim, não tivemos o colapso industrial que se vê no Brasil. 
HA-JOON CHANG | ECONOMISTA DA UNIVERSIDADE DE CAMBRIDGE   https://brasil.elpais.com/brasil/2018/01/05/economia/1515177346_780498.html
 Para saber mais  click 
https://averacidadedafecrista.blogspot.com/2018/09/por-que-os-paises-ricos-intervem-na.html

7- ETAPAS DO CAPITALISMO
Pré-capitalismo- (séculos XII a XV) o modo de produção feudal ainda predomina, mas já se desenvolve relações capitalistas

Capitalismo comercial [mercantil] ( séc. XV a XVIII)- maior parte do clucro concentaro  nas mãos do comerciantes, que constituem a camada hegemonica da sociedade; o trabalho mais comum.
Capitalismo industrial (séc.XVIII a XX)com a revolução Industrial, o capital passa a ser investido basicamente nas industrias, que se tronam a atividade econômica mais importante, o trabalho assalariado firma definitivamente.

Capitalismo financeiro (sec.20)- os bancos e outras intituições financeiras passam a controlar as demias atividades economicas, por meio de financiamentos à agricultura, à industria, à pecuária e oa comercio.  Introdução á Sociologia. Pérsio Santos de Oliveira. 2001, São Pualo: Ática, p. 109

Octavio Ianni procurou identificar os diferentes momentos do desenvolvimento capitalista que resultaram na globalização.
O primeiro corresponde à emergência da economia capitalista e sua instalação na Europa, ao estabelecer o trabalho livre, a mercantilização da produção e a organização do mundo na forma de Estados nacionais. O capitalismo era alimentado pelo colonialismo. As colônias forneciam às respectivas metrópoles europeias matérias‑primas e escravos. Como resultado, a Europa conheceu um período de acumulação de capital e de emergência da burguesia como classe dominante, e as colônias foram integradas à economia europeia. 
O segundo momento é o da industrialização e de um processo mais efetivo de implantação do capitalismo no mundo, por meio de estreitas relações internacionais de dependência econômica e política, que submeteram as nações a centros hegemônicos. Isso caracterizou o imperialismo. O capitalismo instalou‑se por todo o mundo, abarcou os mais diversos continentes, mares e oceanos e promoveu um forte processo de centralização com a formação de impérios. A economia entrou em um estágio de produção ampliada e tornou‑se altamente planificada. A tecnologia passou a desempenhar papel preponderante em atividades bélicas de conquista e manutenção de territórios e na produção de mercadorias. Houve fortes movimentos de resistência em diferentes partes do mundo, que geraram graves conflitos e a emergência do movimento mais forte de oposição ao capitalismo — o comunismo, que instaurou um modelo alternativo de produção e organização política. A cultura globalizou‑se e homogeneizou‑se com a criação da indústria cultural e da cultura de massa. Houve intensa mobilização populacional provocada pelo êxodo rural e pela emigração, levando multidões a se instalar definitivamente em outros territórios.
 O terceiro momento é aquele que recebe o nome de globalização. Os modelos alternativos ao capitalismo, em especial o mundo comunista, entraram em decadência, e houve um processo de enfraquecimento do nacionalismo e da relação de proximidade entre Estado e cidadão. Formaram‑se organismos internacionais para a administração econômica, social e política, como a Organização das Nações Unidas (ONU), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. A informática revolucionou a produção de bens e a divisão internacional do trabalho por meio das mídias digitais. O capitalismo entrou em sua fase efetivamente planetária, tendo como centro hegemônico os Estados Unidos. A racionalização econômica atingiu níveis jamais pensados, e as relações internacionais redefiniram-se. Sociologia. Introdução à ciência da sociedade. Cristina Costa. Livro do Professor. São Paulo: Moderna, 5ª edição, 2016.

 "A globalização, processo de integração político-econômica e cultural dos países, ocorrido na passagem do século XX para o século XXI, resultou de um movimento de expansão do capitalismo que se iniciou com as Grandes Navegações e o colonialismo europeu. Avançou com o desenvolvimento da indústria e das comunicações, mas foi a partir do final do século XX, com a revolução informática e o fim do confronto entre Estados Unidos e URSS, que a globalização se apresentou em toda sua potencialidade, de maneira a revolucionar as relações internacionais. Um dos efeitos desse processo foi o enfraquecimento das fronteiras nacionais e a aproximação entre blocos de países com interesses convergentes. Uma nova ordem geopolítica une regiões e nações antes distantes.
Ao lado disso, a extinção da URSS estancou a expansão comunista no Ocidente, fazendo prevalecer o capitalismo liberal desde sempre defendido pelos Estados Unidos. A essa nova etapa do capitalismo, apoiado na globalização e na informática, dá-se o nome de neoliberalismo. 
"Sociologia. Introdução à ciência da sociedade. Cristina Costa. Livro do Professor. São Paulo: Moderna, 5ª edição, 2016. P. 247

  

8- ESPAÇO POLITICO- DIREITA E  ESQUERDA.


  • È um conceito linear (abrangendo apenas uma dimensão) dentro do espaço político que por sua vez é pluridimensional. Temas ligados a religião, ecologia, moral, etnias, linguistica podem estar ligados tanto à esquerda quanto a direita, embora  possa pender para um dos lados, dentro de cada momento histórico.
  • é um conceito relativo ao momento histórico.
  • é um conceito que pode não abranger certas estratégias do partido
“Direita e Esquerda não são conceitos absolutos. Não são conceitos substantivos ou ontológicos. Não são qualidades intrínsecas no universo político. São lugares do ‘espaço político”. Representam uma determinada topologia política. Que nada tem a ver com a ontologia política”. (Direita e Esquerda. Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995, p. 91)

Podemos ter regimes libertários tanto de direita como de esquerda.
Exemplo: Anarquismo (extrema esquerda) e  capitalismo de centro direita.

Podemos ter regimes autoritários ou ditatoriais tanto de direita como de esquerda.
Exemplo:  Socialismo (extrema esquerda) e Nazismo (Fascismo e regimes autoritários).

Observe o gráfico abaixo, o qual tem dois eixos, um vertical que mede a liberdade individual e o outro  que classifica (diferencia) a direita da esquerda:


Como procurei mostrar, desenvolvendo melhor o argumento nesta nova edição, o contraste entre libertários e autoritários corresponde a uma ou tia distinção, que não se superpõe à distinção entre direita e esquerda, mas com ela se cruza. Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  p. 20

8.1 Origem do termo esquerda e direita
A classificação direita-esquerda remonta à reunião dos Estados Gerais durante a Revolução Francesa, onde delegados que se identificavam com a reforma social e o igualitarismo sentavam-se à esquerda do rei e delegados identificados com o conservadorismo e a aristocracia sentavam-se à direita.
Objetivamente, porém, a definição de Esquerda/Direita nasce com uma opção que jacobinos e girondinos exerceram ao ocupar os assentos à esquerda e à direita do plenário da Assembléia Legislativa da República Francesa em 1792, logo após a vitória da Revolução e a promulgação da histórica Constituição de setembro de 1791.


Os jacobinos representavam a pequena burguesia e o proletariado; os girondinos, a burguesia que desejava resgatar e conservar os antigos privilégios. Certo é que ambas as correntes se insurgiam contra o absolutismo e, no plano político,
se situavam como liberais.  https://norbertobobbio.wordpress.com/2010/06/20/direita-esquerda-e-a-falha-dos-rotulos/




8.1- Direita e esquerda em relação ao status  quo (estado atual)
Direita- grupo desfavorável à mudança.
Esquerda- grupo favorável á mudança.

Ou seja, dentro de um partido ou grupo as pessoas favoráveis a uma revisão ou proposta são de esquerda e as não favoráveis são de direita. O revisionismo marxista apresentou téóricos a favor da revisão (esquerda) e teóricos contra (direita)
 Para Lipset e muitos outros, o divisor de águas entre esquerda e direita está na atitude favorável ou não às políticas de mudança no status quo. Seja qual for a sua interpretação mais correta, não há dúvida de que, nas modernas democracias de massa, as noções de esquerda e direita desempenham um papel importante no âmbito da disputa eleitoral ... Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998, p.392

8.2 Direita e esquerda em relação a critérios clássicos:

Esquerda- Socialismo/Comunismo e Anarquismo
Fim da Propriedade Privada
Defesa Coletividade dos meios de produção.
Fim das classes sociais (igualitarismo)

Direita
Defesa da propriedade privada.
Defesa da propriedade privada dos meios de produção.
Inigualitarismo (classes sociais permanecem)- a igualdade é inatingível


8.3 Esquerda e direita em relação ao intervencionismo estatal
Esta análise é economicista, reduz todos os aspectos da sociedade apenas aos aspectos econômicos.
Por Espaço político se entende a área de conflito que constitui a base da  Relação entre eleitores e partidos, num dado sistema político e num certo momento histórico....
 O Espaço político mais simples e mais utilizado, tanto no âmbito da pesquisa científica
como no do debate político, é o da dimensão esquerdadireita. Esta dimensão ou continuum tem sido variadamente interpretada:
 Anthony Dows, o primeiro politólogo que usou de maneira sistemática a noção de Espaço político neste sentido, a interpreta como grau de intervenção do Estado na economia, quando uma posição de esquerda se identifica com uma maior propensão a favor de políticas de intervenção.
Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998, p.392
O critério de intervenção estatal tem três problemas:

  • O Anarquismo  é considerado  extrema esquerda,não defende nenhum tipo de intervenção estatal, contrariando assim este critério
  • Os regimes totalitários como o Fascismo (e Nazismo) e o Comunismo de Stalin, embora fossem regimes antagônicos e inimigos mortais, apresentavam, ambos,um controle estatal da economia e da sociedade muito forte ,  mas são representantes respectivamente da extrema direita e extrema esquerda, tolindo ou diminuindo assim a liberdade individual
  • Os regimes autoritários de direita também apresentavam uma alta intervenção estatal.
No início do século XX, a Espanha era uma monarquia que havia perdido a riqueza colonial, não tendo desenvolvimento industrial suficiente para se comparar a outras potências europeias. Politicamente, socialistas, anarquistas e comunistas opunham-se à monarquia. Enquanto os socialistas defendiam reformas sociais que garantissem melhores condições de vida aos trabalhadores, os comunistas acreditavam que o Estado burguês deveria ser superado e pregavam a tomada do poder pela força. Os anarquistas, por sua vez, defendiam a extinção do Estado e suas instituições e a criação de comunidades autônomas, que seriam geridas por todos que nela vivessem e trabalhassem.Várias greves e atos terroristas liderados por esses grupos de esquerda ocorreram nos anos 1910, colocando em dúvida a legitimidade da monarquia e reivindicando mudanças na ordem social. Esse contexto favoreceu a intervenção de militares, que, em 1923, sob o comando do general Primo de Rivera, estabeleceram uma ditadura com o apoio real p.  Conexão História. Roberto Catelli Júnior. vol 3.São Paulo: AJS – 2013 1ª- edição p. 105


“Foi em meio a ideologias que mobilizavam multidões que surgiu o Estado Novo no Brasil (1937-45). Estado Novo foi também o nome que receberam outras ditaduras na mesma época: a de Franco, na Espanha, e a de Salazar, em Portugal, por exemplo. O ‘novo’ aqui representava o ideal político de encontrar uma ‘via’ que se afastasse tanto do capitalismo liberal, quanto do comunismo, duas doutrinas políticas que, desde o século XIX, e mais intensamente a partir da revolução soviética, competiam entre si no sentido de oferecer uma nova alternativa política e econômica para o mundo.” Vereda Digital. História: das cavernas ao terceiro milênio. São Paulo: Moderna, 5ª edição , 2017, p. 496

 Na Itália, por exemplo, o governo fascista desenvolveu um modelo de corporativismo em que o Estado mediava as relações entre patrões e empregados para evitar conflitos entre as classes. Esse modelo inspirou o governo brasileiro. Uma das primeiras iniciativas de Vargas para atender a algumas reivindicações dos trabalhadores (e ao mesmo tempo controlá-los) foi a criação do Ministério do Trabalho, em novembro de 1930.  Vereda Digital. História: das cavernas ao terceiro milênio. São Paulo: Moderna, 5ª edição , 2017, p.488

 O fascismo italiano e o nazismo alemão serviram de inspiração para movimentos políticos de extrema direita e a implantação de regimes autoritários em Portugal e na Espanha.A república foi proclamada em Portugal no ano de 1910. No entanto, o governo republicano não conseguiu solucionar seus sérios problemas socioeconômicos, e a experiência republicana parlamentarista foi encerrada com um golpe militar em 1926. Diante do clima de agitação e confronto, a elite portuguesa apoiou as propostas ditatoriais e de forte cunho nacionalista e anticomunista dos militares.
Inspirado no modelo fascista da Itália, o ministro das Finanças António de Oliveira Salazar, nomeado em 1928, adotou uma política econômica rigorosa que equilibrou as contas do país e garantiu sua ascensão ao cargo de chefe do governo em 1932. No ano seguinte, Salazar promulgou uma Constituição de natureza fascista, iniciando uma fase política no país denominada Estado Novo. A política salazarista foi pautada pelo autoritarismo de partido único, pela proibição de sindicatos independentes e pela utilização da imprensa escrita e do rádio como instrumentos de propaganda.
A ditadura portuguesa do Estado Novo foi uma das mais longas do século XX. Ela chegou ao fim somente em abril de 1974, com a deposição do sucessor de Salazar, Marcelo Caetano.
Tal como Portugal, a Espanha enfrentou uma série de perturbações políticas nas décadas de 1920 e 1930. As eleições de 1936 conduziram ao poder a Frente Popular (coligação formada por socialistas, republicanos e comunistas), resultado das alianças de trabalhadores organizadas em todo o país. Essa vitória provocou uma reação violenta dos grupos de direita contra o governo eleito.
Em julho de 1936, um grupo de generais simpatizantes do fascismo, liderado por Francisco Franco, tentou dar um golpe de Estado e derrubar o governo. Os golpistas tinham o apoio do bloco conservador, que se estendia dos monarquistas aos fascistas da Falange, uma facção política conservadora. Porém milícias improvisadas pelos trabalhadores e demais setores populares conseguiram resistir, dando tempo para que as tropas republicanas se organizassem. Iniciou-se, assim, uma guerra civil que se estendeu por três anos.
A Espanha dividiu-se em dois campos político-militares. De um lado, estavam as milícias de trabalhadores, dirigidas por comunistas, socialistas, anarquistas e setores do exército leais ao governo eleito; do outro, os milicianos monarquistas e fascistas e os militares golpistas, que controlavam a maioria do exército, apoiados pelos latifundiários e pela Igreja. O bloco republicano tinha o apoio da União Soviética e das Brigadas Internacionais, organizadas por voluntários de vários países.
Os golpistas, que se autodenominavam nacionalistas, eram apoiados por Salazar, Hitler e Mussolini. Em abril de 1937, a Força Aérea Alemã, a Luftwaffe, bombardeou a cidade de Guernica, com o objetivo de testar a eficiência dos seus equipamentos e apoiar os fascistas na guerra. O conflito chegou ao fim em março de 1939, com a vitória dos nacionalistas do general Franco, que governou o país até 
1975.Vereda Digital. História: das cavernas ao terceiro milênio. São Paulo: Moderna, 5ª edição , 2017, p 462 
.


No que diz respeito à definição de esquerda e direita, a distinção entre as duas díades adquire particular relevância, pois um dos modos mais comuns de caracterizar a direita em relação à esquerda é contrapondo a direita libertária à esquerda igualitária. Não tenho qualquer dificuldade em admitir a existência de doutrinas e movimentos mais igualitários e de doutrinas e movimentos mais libertários, mas teria alguma dificuldade em admitir que esta distinção serve para distinguir a direita da esquerda. Existiram e ainda existem doutrinas e movimentos libertários tanto à direita quanto à esquerda" Direita e Esquerda: Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  pp. 117-118

8.4 Direita e esquerda em relação a questões morais, ecológicas, etc..

Historicamente, o Marxismo sempre perseguiu os homossexuais, mas no Brasil recentemente os partidos de extrema esquerda e centro esquerda tem assumido a causa LGBTQ.https://averacidadedafecrista.blogspot.com/2018/03/erros-catolicos-e-evangelicos-sobre.html

 Isso mostra que não se pode usar questões morais como critério de direita ou esquerda.  Isso acontece porque o espaço político é pluridimensional e não linear . Assim questões religiosas, morais, étnicas, linguisticas e ecologicas dentre outras, podem cruzar a dimensão esquerda direita:  
No interior desta tendência , que vê a natureza..., tendo sido possível, por exemplo, fazer a distinção entre verdes de direita e verdes de esquerda...problemas de ordem moral e jurídica, como acontece no caso  de muitas reivindicações  do movimento feminista, dentre as quais a mais complexa é a do aborto. Mas por um caminho ou outro estas reivindicações acabaram se enquadrando mais à esquerda... Norberto Bobbio e o debate politico contemporâneo. Sérgio Cândido de Mello. São Paulo:Annablume, 2ª edição.  2008, p. 132 
 ...Depois disto, apesar da notável contribuição que o uso da dimensão esquerda-direita trouxe ao estudo da disputa política, não é lícito fazer coincidir com ela, como pretendem alguns investigadores, a noção de Espaço político, pois isso a empobreceria do ponto de vista analítico e fundamental Os espaços lineares são simples e, por isso, fáceis de utilizar e interpretar; mas, devido justamente à sua simplicidade, nem sempre podem explicar certas estratégias de partido ou certos comportamentos de voto, por esquecerem a existência de outras dimensões de identificação e de competição que podem cruzar-se com a dimensão esquerda-direita, e alterar assim a dinâmica global da luta política. Uma dessas outras dimensões é, por exemplo, a religiosa, mas podemos citar também a propósito a dimensão étnica, a lingüística e outras. Às vezes, tais dimensões podem sobrepor-se ao continuum esquerda-direita. O mais freqüente é entrecruzarem-se. Neste caso, o Espaço político há de ser considerado, para todos os efeitos, como pluridimensional, e não linear.Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998, p.393 
8.5 Direita e esquerda no aspecto atual- Igualdade x Desigualdade


No que diz respeito à definição de esquerda e direita, a distinção entre as duas díades adquire particular relevância, pois um dos modos mais comuns de caracterizar a direita em relação à esquerda é contrapondo a direita libertária à esquerda igualitária. Não tenho qualquer dificuldade em admitir a existência de doutrinas e movimentos mais igualitários e de doutrinas e movimentos mais libertários, mas teria alguma dificuldade em admitir que esta distinção serve para distinguir a direita da esquerda. Existiram e ainda existem doutrinas e movimentos libertários tanto à direita quanto à esquerda" Direita e Esquerda: Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  pp. 117-118

 "para mim, a liberdade pode ser tanto de direita quanto de esquerda, e a verdadeira disputa entre esquerda e direita repousa em atribuir maior estima à igualdade ou à diversidade "Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  p. 12

Mais uma vez não estou dizendo que uma maior igualdade é um bem e uma maior desigualdade um mal. Não desejo sequer dizer que uma maior igualdade seja sempre e
em todos os casos preferível a outros valores como a liber
dade, o bem-estar, a paz. Com estas referências a situações históricas pretendo simplesmente reafirmar minha tese de que o elemento que melhor caracteriza as doutrinas e os movimentos que se chamam de "esquerda" e como tais têm o igualitarismo desde que entendido, repito, não como a utopia de uma sociedade em que todos são iguais em tudo mas como tendência, de um lado, a exaltar mais o que faz os homens iguais do que o que os faz desiguais, e de outro, em termos práticos, a favorecer as políticas que objetivam tornar mais iguais os desiguais. Direita e Esquerda Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  p. 20
"Quanto à relação entre direita e desigualdade, disse e repeti várias vezes que a direita é inigualitária não por más intenções- e portanto, para mim, a afirmação de que o inigualitarismo é a característica principal dos movimentos de direita não se mostra como um juízo moral -, mas porque considera que as desigualdades entre os homens são não apenas inelimináveis (ou são elimináveis apenas com o sufocamento da liberdade) como são também úteis, na medida em que promovem a incessante luta pelo melhoramento da sociedade"Direita e Esquerda Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  p. 20

"um movimento de esquerda é o fim ou o resultado a que se propõe: derrubada de um regime despótico fundado na desigualdade entre quem está em cima e quem está embaixo na escala social, percebido _como uma ordem injusta, injusta precisamente porque inigualitária, porque hierarquicamente constituída; e a luta contra uma sociedade na qual existem classes privilegiadas e, portanto, em defesa e pela instauração de uma sociedade de iguais juridicamente, politicamente, socialmente, contra as mais comuns formas de discriminação, como são as que estão elencadas no Artigo 3 da Constituição Italiana, corretamente considerado a maior contribuição dada pelos partidos de esquerda à formação da Carta Constitucional da Itália." Direita e Esquerda:Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  p. 19
  "O mencionado artigo estabelece... :Todos os cidadãos têm paridade social e são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, língua, religiões, opiniões políticas, condições pessoais e sociais. Cabe à República remover os obstáculos de ordem social e econômica que, limitando de fato a liberdade e a igualdade dos cidadãos, impedem o pleno desenvolvimento da pessoa humana e a efetiva participação de todos os trabalhadores na organização política, econômica e social do país." "Direita e Esquerda:Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  p. 108 e 121
"pois são infinitas as possibilidades de serem apresentados exemplos de casos diminutos ou mínimos de medidas igualitárias que limitam a liberdade e, vice-versa, de medidas libertárias que aumentam a desigualdade.aumentam a desigualdade.Uma norma igualitária que impusesse a todos os cidadãos a ultilização unicamente de meios de trasporte públicos para aliviar [alleggerire] o tráfego ofenderia a liberdade de escolher  meio de trasporte preferido" Direita e Esquerda:Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  p. 113.
 Uma das mais convincentes provas históricas da tese até aqui defendida, segundo a qual o igualitarismo é  a característica distintiva da esquerda, pode ser deduzida do fato de que um dos temas principais, senão o principal, da esquerda histórica, comum tanto aos comunistas quanto aos socialistas, é a remoção daquilo que se considerou, não só no século \ passado mas desde a antiguidade, um dos maiores, senão o maior, obstáculo à igualdade entre os homens: a propriedade individual, o "terrível direito"
...A luta pela abolição da propriedade individual, pela coletivização, ainda que não integral, dos meios de produção, sempre foi, para a esquerda, uma luta pela igualdade, pela remoção do principal obstáculo para a realização de uma sociedade de iguais. Até mesmo a política das nacionalizações, que por um longo período de tempo caracterizou a política econômica dos partidos socialistas, foi conduzida em nome de um ideal igualitário, não tanto no sentido positivo de aumentar a igualdade, mas no sentido negativo de diminuir uma fonte de desigualdade.  Direita e Esquerda:Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  p. 121-123
 No entanto, na primeira vez em que uma utopia igualitária entrou na história, passando do reino dos "discursos" para o reino das coisas, acabou por se transformar em seu contrário.  Direita e Esquerda:Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995,  p.124
"Se me for concedido que o critério para distinguir a direita e a esquerda é a diversa apreciação da idéia da igualdade, e que o critério para distinguir a ala moderada da ala extremista, tanto na direita quanto na esquerda, é a diversa postura diante da liberdade, pode-se então repartir esquematicamente o espectro em que se colocam doutrinas e movimentos políticos nas quatro seguintes partes:
a) na extrema-esquerda estão os movimentos simultaneamente igualitários e autoritários, dos quais o jacobinismo é o exemplo histórico mais importante, a ponto de se ter tornado uma abstrata categoria aplicável, e efetivamente aplicada, a períodos e situações históricas diversas;

b) no centro-esquerda, doutrinas e movimentos simultaneamente igualitários e libertários, para os quais podemos empregar hoje a expressão “liberalismo social”, nela compreendendo todos os partidos social-democratas, em que pesem suas diferentes práxis políticas;
c) no centro-direita, doutrinas e movimentos simultaneamente libertário e inigualitários, entre os quais se inserem os partidos conservadores, que se distinguem das direitas reacionárias por sua fidelidade ao método democrático, mas que, com respeito ao ideal de igualdade, se prendem à igualdade diante da lei, que implica unicamente o dever por parte do juiz de aplicar imparcialmente as leis, e à liberdade idêntica, que caracteriza aquilo que chamei de igualitarismo mínimo;
d) na extrema-direita, doutrinas e movimento antiliberais e antiigualitários, dos quais creio ser supérfluo indicar exemplos históricos bem conhecidos como o fascismo e o nazismo. Direita e Esquerda. Razóes e significados de uma distinção política. 2ª reimpressão.Norberto Bobbio, 1995, p.118-119


9-FASCISMO
O êxito do movimento soviético animava o movimento operário e apavorava a alta burguesia: o medo da revolução foi o principal motivo pelo qual os representantes do grande capital descartaram os partidos conservadores tradicionais e apoiaram política e financeiramente os grupos de extrema direita e ultranacionalistas, como o Partido Nacional Fascista. Liderados por Benito Mussolini, os integrantes desse partido defendiam o ódio aos comunistas e o desprezo à democracia liberal. Os esquadrões paramilitares fascistas atacavam sindicatos, jornais e comícios socialistas e comunistas.... Por rejeitar o socialismo e defender a ideia de que somente um governo forte faria a Itália prosperar, os fascistas conquistaram o apoio do grande capital e de setores da pequena burguesia, que temiam o avanço da esquerda....Na nobreza como na indústria, possuindo vastas propriedades ou grandes fábricas, vítimas, uma e outra, do estado anárquico que reinava na província, o entusiasmo que suscitou o triunfo de Mussolini foi sincero e espontâneo. O patriciado de camisas brancas apertou com efusão a mão do fascismo de camisas negras, e as belas damas da aristocracia foram as primeiras a exaltar-se pela pessoa do ditador. A burguesia citadina, liberal por tradição, mas sentindo bem que havia no ar uma vassourada, julgou prudente pôr-se ao lado do cabo da vassoura, e aderiu à revolução.” História: das cavernas ao terceiro milênio. São Paulo: Moderna, 5ª edição , 2017, p. 456-457 


Como aconteceu na Itália com o fascismo, o grande capital e a pequena burguesia, temendo o avanço do comunismo, apoiaram e financiaram a ascensão nazista. Depois da quebra da Bolsa de Valores de Nova York, o Partido Nazista cresceu de forma acelerada na Alemanha. Nas eleições parlamentares de julho de 1932, elegeu 230 deputados, recebendo quase 38% dos votos.... “O racismo nazista logo provocou o êxodo em massa de intelectuais judeus e esquerdistas, que se espalharam pelo que restava de um mundo tolerante. HOBSBAWM, Eric J. Era dos extremos: o breve século XX (1914-1991). 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 151.História: das cavernas ao terceiro milênio. São Paulo: Moderna, 5ª edição , 2017, p. 459-460
I-DEFINIÇÃO:
literatura referente ao Fascismo é normal depararmos com definições diversas e freqüentemente contraditórias deste conceito. A multiplicidade de definições é demonstrativa não só pela real complexidade do objeto estudado, como também pela pluralidade de enfoques, cada um dos quais acentua, de preferência, um ou outro traço considerado particularmente significativo para a descrição ou explicação do fenômeno. Preliminarmente podemos distinguir três usos ou significados principais do termo.
 O primeiro faz referência ao núcleo histórico original, constituído pelo Fascismo italiano em sua historicidade específica;
o segundo está ligado à dimensão internacional que o Fascismo alcançou, quando o nacional-socialismo se consolidou na Alemanha com tais características ideológicas, tais critérios organizativos e finalidades políticas, que levou os contemporâneos a estabelecerem uma analogia essencial entre o Fascismo italiano e o que foi chamado de Fascismo alemão;
 o terceiro, enfim, estende o termo a todos os movimentos ou regimes que compartilham com aquele que foi definido como "Fascismo histórico", de um certo núcleo de características ideológicas e/ou critérios de organização e/ou finalidades políticas. Nesta última acepção, o termo Fascismo assumiu contornos tão indefinidos, que se tornou difícil sua utilização com propósitos científicos. Por isso, vem-se acentuando cada vez mais a tendência de restringir seu uso apenas ao Fascismo histórico, cuja história se desenrola na Europa entre os anos 1919 e 1945 e que está essencial e especificamente representado no Fascismo italiano e no nacional-socialismo alemão.
Em geral, se entende por Fascismo um sistema autoritário de dominação que é caracterizado:
  •  pela monopolização da representação política por parte de um partido único de massa, hierarquicamente organizado; 
  • por uma ideologia fundada no culto do chefe,
  •  na exaltação da coletividade nacional,
  •  no desprezo dos valores do individualismo liberal e no ideal da colaboração de classes, em oposição frontal ao socialismo e ao comunismo, dentro de um sistema de tipo corporativo;
  •  por objetivos de expansão imperialista, a alcançar em nome da luta das nações pobres contra as potências plutocráticas; 
  • pela mobilização das massas e pelo seu enquadramento em organizações tendentes a uma socialização política planificada, funcional ao regime; 
  • pelo aniquilamento das oposições, mediante o uso da violência e do terror;
  •  por um aparelho de propaganda baseado no controle das informações e dos meios de comunicação de massa;
  •  por um crescente dirigismo estatal no âmbito de uma economia que continua a ser, fundamentalmente, de tipo privado;[ contrário ao socialismo-comunismo]
  •  pela tentativa de integrar nas estruturas de controle do partido ou do Estado, de acordo com uma lógica totalitária, a totalidade das relações econômicas, sociais, políticas e culturais
 II. "TEORIAS" SOBRE O FASCISMO. 
 Há diversos critérios de classificação das teorias relativas ao Fascismo: o cronológico, o políticoideológico, o disciplinar e o sistemático — só para citar os mais usados — que podem ser diversamente combinados entre si, dando origem a tipologias mais ou menos complexas. A subdivisão aqui utilizada possui caráter introdutório e tem por objetivo chamar a atenção para as principais abordagens analíticas do fenômeno, desenvolvidas por estudiosos de várias tendências, a partir da década de 20. Usando a terminologia empregada por E.  Noite no seu famoso ensaio Theorien über den Faschismus, hoje já introduzida no léxico comum dos estudos sobre o assunto, as teorias sobre o Fascismo podem ser divididas em duas grandes categorias: em teorias singularizantes e teorias generalizantes.
 Pertencem à primeira categoria as teorias que, para explicar a origem e sucesso dos movimentos e dos regimes fascistas, recorrem a fatores estreitamente ligados às particularidades de uma determinada realidade nacional e rejeitam toda a tentativa de generalização de um contexto histórico específico a outro. Segundo os defensores deste tipo de abordagem, as analogias verificáveis entre os movimentos e regimes comumente definidos como fascistas são de caráter formal, ao passo que as diferenças entre uma situação e outra são de tal modo relevantes que só admitem um discurso cientificamente fundado em cada um dos Fascismos. Conseqüentemente, o termo Fascismo se aplica corretamente ao movimento político que se impôs na Itália nos anos imediatamente posteriores à Primeira Guerra Mundial, e ao tipo de regime por ele instaurado após a tomada do poder; a outros movimentos ou regimes a eles variamente assimiláveis, de acordo com os esquemas analíticos utilizados, só impropriamente se pode aplicar o termo de Fascismo.
Pertencem à segunda categoria as teorias que consideram o Fascismo como um fenômeno supranacional que apresentou, nas diversas formas de que historicamente se revestiu, características essencialmente análogas, resumíveis num conjunto de fatores homogêneos. Conforme os fatores considerados, assim são as definições e o campo de aplicação do conceito. As teorias generalizantes podem, por sua vez, subdividir-se em duas subcategorias, respectivamente definíveis como intrapolíticas e transpolíticas.
As primeiras referem-se a fatores histórico-políticos determinados, historicamente individualizáveis; as segundas, a fatores a-históricos, inerentes à natureza humana, ao caráter repressivo da cultura, às características imanentes à luta política e por aí além. ..

 III. A ABORDAGEM SINGULARIZANTE. 
— A tendência a analisar o Fascismo como um produto particularmente característico da sociedade italiana e da sua história é contemporânea ao próprio nascimento do Fascismo. ..
As primeiras hipóteses de explicação do Fascismo, com base em fatores internos típicos da situação italiana, foram aventadas, naturalmente, nos anos 20, em concomitância com aconsolidação do movimento fascista, com a tomada do poder por Mussolini e com a progressiva transformação do Estado liberal em Estado de características totalitárias. Poucos souberam então ver no Fascismo a antecipação de uma crise mais geral que revolucionaria a Europa e, com a catástrofe da Segunda Guerra Mundial, viria a produzir profundas mudanças na organização interna de cada um dos Estados nacionais e na ordem internacional. As causas imediatas da vitória do Fascismo foram geralmente procuradas no clima de forte instabilidade social, política e econômica, criado na Itália nos primeiros anos posteriores à Primeira Grande Guerra Mundial. Mas, ao tentarem explicar a vulnerabilidade e ruína das instituições liberais, alguns estudiosos se interrogaram sobre o passado da história nacional, chegando a descobrir no processo de formação do Estado unitário aquela debilidade intrínseca das estruturas que o Fascismo havia de pôr a nu....
A afirmação do caráter tipicamente italiano do Fascismo, subscrita também, entre outros, por autorizados teóricos fascistas, que reivindicavam ser ele o coroamento do processo de unificação nacional iniciado com o Ressurgimento, foi questionada com o surgir de movimentos fascistas em vários países da Europa, mormente com a subida ao poder do nacional-socialismo na Alemanha. A partir dos anos 30, predominaram as interpretações tendentes a acentuar o caráter supranacional do Fascismo, que haviam de orientar a maior parte da pesquisa e alimentar o debate teórico mesmo depois da Segunda Guerra Mundial. Em contradição com essa interpretação, foi-se esboçando nos últimos dez anos uma corrente historiográfica que visa reduzir o âmbito de aplicação do conceito de Fascismo apenas ao contexto italiano. ...diferenças ideológicas e projetivas do Fascismo italiano com relação ao nazismo. Não se nega a existência de um denominador comum entre os dois fenômenos e, por conseguinte, a possibilidade de os englobar no mesmo conceito de Fascismo; mas esse denominador serve mais para estabelecer limites em relação ao exterior, isto é, em relação a outros regimes de tipo autoritário, do que para lhe explicar a natureza, os objetivos fundamentais e a função histórica.
 IV. A ABORDAGEM GENERALIZANTE.
 — Que o Fascismo italiano e o nacional-socialismo alemão, malgrado as diferenças devidas às particularidades das respectivas histórias nacionais, hajam de ser considerados como especificações de um modelo de dominação essencialmente único, é coisa que tem sido sustentada pela maior parte dos estudiosos contemporâneos, independentemente das suas posições ideológicas e políticas.
 É a eles que se deve a elaboração de alguns esquemas interpretativos que muito têm contribuído para a orientação dos trabalhos dos historiadores e cientistas sociais da geração seguinte. ... O que lhes é comum é o esforço por compreender as raízes do Fascismo e, de um modo mais geral, dos fenômenos autoritários evidenciados pela sociedade moderna, num conjunto de variáveis que transcendem os limites de cada uma das realidades nacionais.:...
a) O Fascismo como uma ditadura aberta da burguesia. — Entre os primeiros que captaram a dimensão internacional do Fascismo e as suas potencialidades expansivas, estão os expoentes do movimento operário em suas diversas articulações. O elemento unificador das várias formas de reação na Europa, no período que medeia entre as duas guerras mundiais, está na análise das contradições da sociedade capitalista e das modificações por ela introduzidas na dinâmica das relações e conflitos entre as classes, na fase histórica iniciada com a Primeira Guerra Mundial.
Dentro desta interpretação, é conveniente distinguir a formulação "clássica" — resumível nas teses elaboradas pela Terceira Internacional comunista a partir de meados dos anos 30 — dos seus ulteriores desenvolvimentos, que reassumem temas e idéias já presentes no debate iniciado pelos componentes do marxismo europeu desde a tomada do poder pelo Fascismo na Itália, reelaborando-os em função de uma análise menos esquemática das relações entre estrutura e supra-estrutura, entre esfera econômica e esfera política. Na primeira formulação, as origens do Fascismo como fenômeno internacional são relacionadas com a crise histórica do capitalismo em seu estádio final, o do imperialismo, e com a necessidade que a burguesia tem, em face do agravamento das crises econômicas e da exacerbação do conflito de classes, de manter o seu domínio, intensificando a exploração das classes subalternas e, em primeiro lugar, da classe operária. O imperialismo envolve a tendência a transformar em sentido reacionário as instituições da burguesia, e o Fascismo é a expressão mais coerente dessa tendência.
Ele constitui uma das formas do Estado capitalista, precisamente a caracterizada pela ditadura aberta da burguesia, exercida já sem a mediação das instituições da democracia parlamentar. A Itália e a Alemanha, como elos mais fracos da cadeia imperialista, foram as primeiras a experimentar esta forma de dominação, mas essa mesma ameaça impende sobre os demais Estados capitalistas. São dois os elementos centrais deste tipo de análise: a concepção instrumental dos partidos e dos regimes fascistas, considerados como expressão direta dos interesses do grande capital, e a sua função essencialmente contra-revolucionária no duplo sentido de ataque frontal contra as organizações do proletariado e de esforço por frear o curso do desenvolvimento histórico. 
Em conseqüência, é dado pouco relevo ao fato, qualitativamente novo em relação às formas precedentes de reação, de que a fascista operasse mediante um partido de massa de base predominantemente pequeno-burguesa, embora comunistas italianos e alemães, como P. Togliatti ou Clara Zetkui, já houvessem chamado a atenção para isso.
Além disso, eram categoricamente rejeitadas, sob pretexto de ignorarem a definição do Fascismo como ditadura da burguesia, as análises que em vários setores do movimento operário vinham sendo feitas do Fascismo como forma de "bonapartismo", isto é, como regime caracterizado pela cessão temporária do poder político a uma terceira torça e por uma relativa autonomia do executivo em relação às classes dominantes, tornadas possíveis graças a uma situação de equilíbrio entre as principais forças de classe em ação.
A teoria do Fascismo como ditadura da burguesia constitui ainda hoje a chave interpretativa predominante nos estudos que têm como modelo de referência o marxismo e a sua concepção da mudança histórica. Com o tempo, porém, ela passou por uma certa revisão que tornou mais problemáticos alguns nexos, particularmente os existentes entre burguesia e Fascismo, entre movimentos e regimes fascistas, entre capitalismo, democracia e Fascismo.
 Esta revisão é o resultado de uma reflexão teórica que teve efeitos importantes em vários sentidos. O primeiro deles foi a atenuação do economicismo presente nas primeiras formulações e o reconhecimento de uma relativa autonomia da esfera política com relação à esfera da economia. Isso trouxe consigo uma mais aprofundada análise das crises de onde emergiram os regimes fascistas; uma articulação mais complexa da relação entre Fascismo e classes sociais; uma consideração mais atenta dos aspectos institucionais dos regimes fascista», da lógica do seu funcionamento, das bases da sua legitimação. Mas não modificou a concepção do Fascismo como forma particular de ditadura da burguesia, embora esta fosse atenuada pelo reconhecimento da autonomia relativa dos Estados fascistas em face do grande capital, no âmbito de uma convergência comum para objetivos imperialistas.
b) O Fascismo como totalitarismo. —
 O quadro de referência é constituído, direta ou indiretamente, pelas teorias da sociedade de massa; à dinâmica das relações entre as classes sucede, como principal fator explicativo do surgimento dos fenômenos do autoritarismo moderno, a dinâmica das relações entre as massas e as elites num contexto caracterizado pela decomposição do tecido social tradicional, pelo desabe dos sistemas de valores comuns, pela atomização e massificação dos indivíduos, e por uma crescente burocratização.
O aspecto central desta teoria, e ao mesmo tempo o mais criticado, é a subsunção sob uma mesma categoria, a do Estado totalitário, dos regimes fascistas e comunistas, com base em analogias existentes na estrutura e técnicas de gestão do poder político. São. com efeito, estas analogias — verificáveis independentemente dos fins declarados que se tem em vista dos precedentes históricos e do conteúdo das respectivas ideologias — que os teóricos do totalitarismo privilegiam no plano descritivo e admitem como problema principal no plano explicativo. Os elementos que definem o Estado totalitário são, em termos típico-ideais, conforme a formulação de Friedrich e Brzezinski:

  •  uma ideologia oficial tendente a cobrir todo o âmbito da existência humana e à qual se supõe aderirem todos, pelo menos passivamente; 
  • um partido de massa único, tipicamente conduzido por um só homem; 
  • um sistema de controle policial baseado no terror; o monopólio quase completo dos meios de comunicação de massa; 
  • o monopólio quase completo do aparelho bélico; e, enfim, 
  • o controle centralizado da economia. O alvo é o de conseguir o controle total de toda a organização social, a serviço de um movimento ideologicamente caracterizado. As condições essenciais para a sua aparição são um regime de democracia de massa e o poder dispor de um aparelho tecnológico como o que só a moderna sociedade industrial pode oferecer.
 O Estado totalitário se apresenta, portanto, como uma forma de domínio inteiramente nova, não só com respeito aos sistemas de democracia liberal, mas também às formas anteriores de ditadura e autocracia, uma vez que no passado não existiam os pressupostos para a sua realização. Possui, além disso, um caráter eversivo com relação ao sistema social preexistente, na medida em que lhe modifica radicalmente a estrutura, que se baseava na existência de uma pluralidade de grupos e de organizações autônomas.
As razões do sucesso dos regimes totalitários são geralmente postas no declínio do sistema liberal burguês e, especialmente, na dissolução do sistema classista, que é ao mesmo tempo causa e condição da sua sobrevivência. ...
 A teoria clássica do totalitarismo tem estado sujeita a numerosas críticas que têm por alvo uma dupla série de problemas.
 O primeiro diz respeito ao campo específico da análise dos regimes fascistas. Sob este ponto de vista, parece hoje dificilmente sustentável a hipótese de que a origem e sucesso dos movimentos fascistas estariam relacionados com o conjunto de fenômenos compreendidos no conceito de "sociedade de massa". Pesquisas recentes demonstraram que, nos países onde o Fascismo se consolidou, o sistema de estratificação era muito mais rígido, o peso das estruturas tradicionais muito mais forte e o grau de "atomização" — no sentido de falta de estruturas associativas intermediárias — muito menor que em outros onde o Fascismo jamais se ofereceu como alternativa concreta. A tentativa de explicar o processo de introdução do Fascismo com base na dinâmica das relações entre massas privadas de uma clara conotação de classe também contradiz um dado empírico já seguro, ou seja, a base constituída de massas predominantemente pequeno-burguesas dos movimentos fascistas e sua coligação com amplos setores da burguesia agrária e industrial, antes e depois da tomada do poder.
 Finalmente, esta teoria não consegue fornecer uma explicação aceitável sobre o problema da função histórica dos regimes fascistas, oscilando entre uma resposta de tipo não racional — os regimes totalitários seriam neste caso uma espécie de experimento monstruoso de engenharia social, tendo como fim a criação de um novo tipo de homem máquina totalmente heterodirigido — e a renúncia explícita ao momento explicativo em favor de uma morfologia dos sistemas totalitários.
A segunda série de problemas diz respeito à própria utilidade do conceito de totalitarismo que, como instrumento, não permite discriminar entre regimes que, apresentando analogias no funcionamento do sistema político, diferem em outros aspectos importantes como os relativos à constelação das forças que favoreceram o seu triunfo, à relação entre as velhas e as novas elites, ao tipo de interferência na estrutura econômico-social e às suas conseqüências. Os que pensam que tal conceito ainda conserva uma certa valia no plano descritivo têm afirmado constantemente a necessidade de uma mais ampla tipologia dos sistemas totalitários, baseada na análise comparada dos diversos regimes, capaz de levar em conta as diferenças. É daí que surgiu a tendência de compreender dentro do mesmo tipo o Fascismo italiano e o nacional-socialismo alemão, com base nas analogias observáveis não só nas técnicas de gestão do poder político, como também na ideologia, na base social e na função histórica dos dois regimes.
c) O Fascismo como via para a modernização. — Nestes últimos tempos, tem-se desenvolvido um novo tipo de abordagem que tem como referência o esquema teórico da modernização e considera os regimes fascistas como uma das formas político institucionais através das quais se operou historicamente a transição de uma sociedade agrária de tipo tradicional à moderna sociedade industrial.
As análises que antecedem — se excetuarmos a tentativa de explicar a implantação do Fascismo na Itália baseada no atraso geral da sociedade italiana — possuem um aspecto comum que é o de situarem os regimes fascistas num contexto caracterizado, em seu conjunto, por uma situação de avançada industrialização. A dinâmica existente entre massas e elites, o conflito entre a grande burguesia e o proletariado no estádio imperialista do capitalismo, assim como a revolta das classes médias emergentes, são indicadores de um tipo de sociedade que já passou total ou parcialmente à modernidade.
Até os fenômenos de natureza mais estritamente política, que são relacionados com o surgir dos movimentos e regimes fascistas, são típicos de um sistema democrático plenamente consolidado, seja que se acentuem as suas contradições internas, como pretende a análise marxista, seja que se descubra nele o terreno específico onde tais movimentos podem nascer e desenvolver-se, como quer a teoria do totalitarismo. A análise do Fascismo à luz das teorias da modernização coloca-o, ao invés, não já em relação com os conflitos e crises próprios da sociedade industrial, mas com os conflitos e crises característicos da fase de transição para ela.

d) O Fascismo como revolta da pequena burguesia. — ..., as análises, que têm posto em evidência a ligação entre a pequena burguesia e o Fascismo, jamais alcançaram uma autonomia que as impusesse como alternativa interpretativa global....
O fato de que a pequena burguesia pudesse contribuir de modo determinante para o sucesso dos movimentos fascistas, fornecendo-lhes os quadros e as bases de massa na fase de ascensão e um consenso ativo na fase de regime, não entrava nos esquemas clássicos, nem nos da teoria liberal, nem nos do marxismo. Para a teoria liberal, a pequena burguesia constituía um dos pressupostos do sistema democrático e a garantia de um desenvolvimento pacífico e gradualmente progressivo da sociedade; para o marxismo, ela estava impossibilitada de exercer um papel político autônomo em virtude da sua colocação dentro da estrutura de classes e da sua posição subalterna no respeitante ao conflito fundamental entre a grande burguesia e o proletariado.
Em coerência com tais esquemas, a contribuição da pequena burguesia para o triunfo dos movimentos fascistas ou é negada, como na teoria do totalitarismo, em benefício da relação entre as massas não diferenciadas e as elites, ou então concebida em termos instrumentais, sendo atribuída à pequena burguesia a função de massa de manobra de um movimento a serviço dos desígnios do grande capital, como acontece na teoria do Fascismo como ditadura da burguesia. A capacidade de mobilizar a pequena burguesia, baseando-se numa ideologia composta onde confluíam o irracionalismo e o voluntarismo, o anticapitalismo e o anti-socialismo, vagas aspirações a uma democracia radical unidas a acentos fortemente nacionalistas, parece, contudo, ser um dos elementos característicos do movimento fascista, desde a implantação do Fascismo na Itália. Este fato é analisado por alguns observadores como revolta da pequena burguesia urbana e rural, ameaçada em seu status pelos processos de transformação sócioeconômica em marcha, particularmente pelos processos de concentração industrial e pelo conseqüente aumento da influência da grande burguesia e do proletariado industrial na cena política. Estendendo-se à pequena burguesia, o esquema da luta de classes fornecia-lhe o critério interpretativo do movimento, considerado revolucionário em suas premissas subjetivas mas reacionário no conteúdo objetivo, sendo como era expressão de estratos postos à margem pelo desenvolvimento produtivo e pela evolução da sociedade capitalista....
Mas é um ponto ainda sem solução, principalmente no que respeita à função, dirigente ou subalterna, da pequena burguesia dentro do sistema de poder fascista. Enquanto parece hoje já bastante provado e debatido o papel que ela desempenhou como base de massa dos movimentos fascistas, apresenta-se ainda como problemática a tentativa de mostrar o Fascismo, enquanto regime, como expressão da pequena burguesia no poder. Os estudos orientados neste sentido, embora tenham demonstrado o crescimento quantitativo dos estratos pequeno-burgueses — em virtude da expansão do papel do Estado, das suas funções político-administrativas, do aparelho de propaganda e de repressão —, embora tenham demonstrado também o restabelecimento das distâncias sociais em relação à classe operária e uma certa mudança nos quadros dirigentes nos vários níveis da burocracia política e administrativa, não conseguiram, contudo, demonstrar, de modo convincente, que as opções fundamentais dos regimes fascistas respondessem a uma lógica oposta  aos interesses das antigas classes dominantes nem que pudessem ser referidas a um projeto de transformação social dotado de uma autonomia própria e tendente a conferir à pequena burguesia, antiga ou nova, um papel hegemônico no seio da sociedade.
 V. PROBLEMAS ABERTOS.
Um dos discriminadores fundamentais continua sendo a relação entre capitalismo e Fascismo. É um problema ainda não resolvido se o Fascismo representou um tipo particular de solução para as crises de transformação do sistema capitalista ao longo de uma linha de identidade estrutural ou o início de um processo de modificação das estruturas do capitalismo tendente a criar um ordenamento econômico e social diverso tanto do capitalismo quanto do socialismo. A solução deste problema tornou-se ainda mais difícil pelo fato de que a duração relativamente breve dos regimes fascistas e a sua queda em virtude dos acontecimentos bélicos só permite falar de linhas ou tendências. A questão gira em torno da relação entre política e economia e do maior ou menor grau de autonomia alcançado pelos Estados fascistas em face das forças economicamente dominantes, em especial do grande capital industrial e financeiro.
 Existem a tal respeito duas correntes principais de pesquisa que se movem em direções divergentes:
 a primeira propensa a demonstrar a convergência de interesses entre o Fascismo e o grande capital, para confirmar a tese de uma continuidade estrutural entre capitalismo e Fascismo, segundo a qual a autonomia relativa do poder político se explica dentro de uma coincidência substancial de objetivos e fins com o poder econômico;
 o segundo, ao contrário, tendente a apresentar tal convergência como resultado de situações contingentes, nunca capazes de contestar a divergência fundamental entre a ideologia e prática dos movimentos e regimes fascistas e as condições de sobrevivência do sistema capitalista.
Sob este aspecto, as pesquisas efetuadas por ambas as vertentes não parecem haver modificado os termos do problema no que respeita ao debate suscitado no início da década de 40, até mesmo no seio do marxismo, entre os defensores, como Hilferding, de uma incompatibilidade essencial entre a lógica dos sistemas totalitários e a lógica do capitalismo, e aqueles que, como Franz Neumann, pensavam ser a forma totalitária a mais adequada em relação aos objetivos imperialistas do capitalismo monopólico. Foi se, portanto, delineando a necessidade de passar de um tipo de argumentação intencionalmente conduzida em termos de objetivos a outra fundada na análise concreta das mudanças ocorridas nas estruturas das sociedades fascistas, como resultado das estratégias umas vezes convergentes, outras vezes conflitantes, das múltiplas forças em ação.
 Deste trabalho de aprofundamento realizado em vários sentidos surgirá uma imagem dos sistemas fascistas bem mais complexa e contraditória do que parecia no passado. Esta complexidade, este caráter contraditório parecem ligados ao fato de que eles constituem um exemplo de solução para os conflitos nascidos na sociedade industrial, baseado na utilização de técnicas políticas profundamente inovadoras, cujas implicações não foram ainda totalmente esclarecidas.
Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998, p.466-475

10-Totalitarismo x Autoritarismo
"Os regimes autoritários costumam ser identificados indevidamente com os governos totalitários. O que há de comum entre eles é que ambos cerceiam as liberdades individuais em nome da segurança nacional, recorrem à maciça propaganda política, exercem a censura e dispõem de aparelho repressivo. No Brasil, por exemplo, desde Getúlio Vargas havia o Departamento de Ordem Política e Social (Dops), que controlava e fichava pessoas suspeitas de agirem contrariamente ao sistema. Esse departamento teve suas funções intensificadas no período da ditadura militar pós-1964.Nos regimes autoritários, porém, não há uma ideologia de base que sirva “para a construção da nova sociedade” e não há mobilização popular para lhes dar apoio. Ao contrário, em vez de doutrinação política e de incentivo ao engajamento ativista – ainda que dirigido –, predomina a despolitização, que leva à apatia política. O clima de repressão violenta gera medo e desestimula a ação política da sociedade civil.
Sempre que possível, os governos autoritários procuram manter a aparência de democracia: permitem a existência de partidos de oposição, mas apenas de uma oposição formal, que nunca se realiza na prática. Mesmo o partido do governo é mero apêndice do Poder Executivo.
O governo autoritário também nomeia militares para a burocracia estatal, enquanto a elite econômica conta com oficiais das forças armadas nos postos-chave. Os militares saem do quartel para integrar a instituição política mais importante da nação. Foi o que aconteceu por ocasião do golpe militar de 1964, que impôs o regime autoritário no Brasil durante duas décadas. Na América Latina, outros países também passaram pela experiência autoritária, como o Uruguai, a Argentina e o Chile.
Filosofar com textos:temas e histórias da Filosofia. Volume único. 1ª edição. São Paulo:Moderna. 2012,p. 242

"Na tipologia dos sistemas políticos, são chamados de autoritários os regimes que privilegiam a autoridade governamental e diminuem de forma mais ou menos radical o consenso, concentrando o poder político nas mãos de uma só pessoa ou de um só órgão e colocando em posição secundária as instituições representativas. Nesse contexto, a oposição e a autonomia dos subsistemas políticos são reduzidas à expressão mínima e as instituições destinadas a representar a autoridade de baixo para cima ou são aniquiladas ou substancialmente esvaziadasDicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998,p. 95

"Todavia, na classificação dos regimes políticos contemporâneos, o conceito de Autoritarismo é empregado muitas vezes para designar, não todos os sistemas antidemocráticos, mas apenas uma sua subclasse. Neste sentido, distingue-se entre
Autoritarismo e totalitarismo. A propósito desta distinção devemos dizer, em termos preliminares, que enquanto o uso estrito que se faz de Autoritarismo é útil e legítimo, o uso amplo de "totalitarismo" traz consigo inconvenientes sérios, sendo vivamente
criticado. Na verdade o que se contrapõe aos regimes autoritários são todos os regimes monopartidários com índices de alta mobilização política. No verbete TOTALITARISMO encontraremos uma discussão explícita deste ponto. [MARIO STOPPINO] 
 Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998, p. 100


"Os elementos que definem o Estado totalitário são,
em termos típico-ideais, conforme a formulação de
Friedrich e Brzezinski:

  •  uma ideologia oficial tendente a cobrir todo o âmbito da existência humana e à qual se supõe aderirem todos, pelo menos passivamente;
  • um partido de massa único, tipicamente conduzido por um só homem;
  •  um sistema de controle policial baseado no terror;
  • o monopólio quase completo dos meios de comunicação de massa; o monopólio quase completo do aparelho bélico; e, enfim, o controle centralizado da economia. O alvo é o de conseguir o controle total de toda a organização social, a serviço de um movimento ideologicamente caracterizado. Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998, p.471-472



A segunda teoria clássica, a de Carl J. Friedrich e de Zbigniew K. Brzezinski, define o Totalitarismo com base nos traços característicos que podem ser encontrados na organização dos regimes totalitários.Segundo esta colocação, o regime totalitário é resultante da união dos seis pontos seguintes: 1) uma ideologia oficial que diz respeito a todos os aspectos da atividade e da existência do homem e que todos os membros da sociedade devem abraçar, e que critica, de modo radical, o estado atual das coisas e que dirige a luta pela sua transformação; 

2) um partido único de massa dirigido tipicamente por um ditador, estruturado de uma forma hierárquica, com uma posição de superioridade ou de mistura com a organização burocrática do Estado, composto por pequena percentagem da população, onde uma parte nutre apaixonada e inabalável fé na ideologia e está disposta a qualquer atividade para propagá-la e atuá-la; 

3) um sistema de terrorismo policial, que apóia e ao mesmo tempo controla o partido, faz frutificar a ciência moderna e especialmente a psicologia científica e é dirigido de uma forma própria, não apenas contra os inimigos plausíveis do regime, mas ainda contra as classes da população arbitrariamente escolhidas; 

4) um monopólio tendencialmente absoluto, nas mãos do partido e baseado na tecnologia moderna, da direção de todos os meios de comunicação de massa, como a imprensa, o rádio e o cinema; 5) um monopólio tendencialmente absoluto, nas mãos do partido e baseado na tecnologia moderna, de todos os instrumentos da luta armada; 
6) um controle e uma direção central de toda a economia através da coordenação burocrática das unidades produtivas antes independentes. Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998, p.1249

Mas o que mais se deve objetar àqueles que destacam tais diferenças entre fascismo e comunismo é que elas não são um argumento pertinente contra o uso do conceito de Totalitarismo para designar tanto regimes fascistas como comunistas, ou melhor, para designar uma certa fase histórica do sistema comunista soviético e uma certa fase histórica do sistema nazista alemão. Não são um argumento pertinente as diferenças de ideologia porque, com base em ideologias de conteúdos diferentes, podemos construir praxes de domínio político substancialmente análogas. E não são um argumento pertinente as diferenças de base social porque, partindo de um ambiente econômicosocial diferente e de uma composição social de sustentação de massa diferente, podemos chegar, igualmente, a praxes de domínio político substancialmente análogas. Na  Alemanha de Hitler e na Rússia de Stalin verificou-se precisamente este fenômeno. Em cima de bases sociais e de ideologias diferentes criou-se uma praxe política fundamentalmente semelhante, feita de um partido monopolista, de uma ideologia de transformação da sociedade, do poder absoluto de um chefe, de um terror sem precedentes e. por conseqüência, da destruição de toda a linha estável de distinção entre aparelho político e sociedade. Se chamarmos e interpretarmos esta praxe política através do nome e do conceito de Totalitarismo, então poderemos e deveremos usar tal nome e tal conceito todas as vezes que (e só) existir a praxe correspondente, que se realize num sistema fascista ou num sistema comunista. Daí se segue que é legítimo falar de "Totalitarismo fascista" e de "Totalitarismo comunista" no sentido indicado. Mas segue-se também que é ilegítimo usar tais expressões se com elas quisermos dizer que o comunismo e o fascismo são fenômenos necessariamente totalitários por natureza. Dicionário de política I Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino;Brasília : Editora Universidade de Brasília, 1 la ed., 1998, p. 1253


11-ANARQUISMO

1. Introdução
Proudhon (1809-1865) e Bakunin (1814-1876), contemporâneos de Marx, com ele partilham
  •  as críticas ao sistema capitalista,
  •  à propriedade privada dos meios de produção e à exploração da classe proletária pela burguesia. 
  • Concordam também que as revoluções Francesa e Americana foram mais políticas que sociais, pois elas teriam renovado os padrões de autoridade, dando poder às novas classes, mas não modificaram basicamente a estrutura social e econômica da França e dos Estados Unidos. 
A relação de amizade e admiração de Proudhon e Bakunin com Marx rompeu -se, porém, a partir de divergências que se tornaram cada vez mais agudas. O nó do desentendimento encontra-se na teoria marxista da ditadura do proletariado..., Marx preconizava um degrau necessário antes do advento do comunismo, quando a força do proletariado, exercida através do partido, evitaria a contra -revolução da classe deposta. Só depois o poder se dissolveria rumo à sociedade sem Estado.
Bakunin acusa Marx de otimista, não considerando ser possível evitar a rígida oligarquia de funcionários públicos e tecnocratas que tenderiam a se perpetuar no poder.

2. Principais idéias do anarquismo
É comum as pessoas identificarem anarquismo com caos", "bagunça". Na verdade, não se trata disso.Etimologicamente, a palavra é formada pelo sufixo archon,que em grego significa "governante", e em, "sem", ou seja, "sem governante". O princípio que rege o anarquismo está na declaração de que o Estado é nocivo e desnecessário,  pois há formas alternativas de organização voluntária.
 Se a religião, o Estado e a propriedade contribuíram em determinado momento histórico para o desenvolvimento do homem, passam a ser restrições a sua emancipação.
No entanto, a tese anarquista da negação do Estado não deve levar as pessoas a pensarem que se trata de uma proposta individualista, pois a organização não coercitiva se funda na cooperação e na aceitação da comunidade. O homem é um ser naturalmente capaz de viver em paz com seus semelhantes, mas as instituições autoritárias deformam e atrofiam suas tendências cooperativas. Surge, então, um aparente paradoxo, ou seja, a realização da ordem na anarquia; essa ordem na anarquia é uma ordem natural.
 A sociedade estatal possui uma estrutura cuja construção é artificial, pois cria uma pirâmide em que a ordem é imposta de cima para baixo. A sociedade anarquista seria não uma estrutura, mas um organismo que cresce de acordo com as leis da natureza, e a ordem natural se expressa pela autodisciplina e cooperação voluntária e não pela decisão hierárquica.
Por isso, os anarquistas repudiam até a formação de partidos, já que estes prejudicam a espontaneidade de ação, tendem a se burocrafizar e a exercer formasde poder. Também temem as estruturas teóricas, porque podem tornar -se um corpo dogmático.
Daí o anarquismo ser mais conhecido como movimento vivo e não tanto como doutrina. A ausência de controle e de poder torna o movimento anarquista oscilante, sempre frágil e flexível, podendo ficarinativo por muito tempo para surgir espontaneamente quando necessario.
A crítica à existência do Estado leva à tentativa de inversão da pirâmide de poder que o Estado representa; a organização social que deriva dessa inversão rege-se pelo princípio da descentralização, procurando estabelecer a forma mais direta de relação, ou seja, a do contato "cara a cara". A responsabilidade começa a partir dos núcleos vitais da vida social, onde também são tomadas as decisões: o local de trabalho, os bairros. Quando isso não é possível por envolver outrossegmentos, formam-se federações. O importante, porém, é manter a participação, a colaboração, a consulta direta entre as pessoas envolvidas.Os anarquistas criticam a forma tradicional de democracia parlamentar, pois a representação contém o risco de alçar ao poder um demagogo. Quando a decisão envolve áreas mais amplas, havendo necessidade de convocação de assembléia, a proposta é de escolha de delegados por tempo limitado e sujeitos à revogação do seu mandato.Além da crítica feita ao Estado, os anarquistas prevêem que a supressão da propriedade privada dos meios de produção deve dar lugar a formas de organização que estimulem as ações dos indivíduos livres no corpo coletivo, o que poderia se tornar possível na comuna livre e em empresas dirigidascoletivamente.Da mesma forma repudiam a estrutura hierárquica da Igreja e defendem o ateísmo como condição de autonomia moral do homem, liberto dos dogmas e da noção de pecado: "Para afirmar o homem, é preciso negar Deus".

3. Representantes e movimentos
O mais brilhante anarquista foi Bakunin, filho de ricos aristocratas russos. Tornou-serevolucionário graças à influência de Proudhon. Participou das rebeliões que ocorreram em Paris, Praga e Dresden em 1848 -1849, tendo sido preso por vários anos e depois exilado na Sibéria. De volta à agitação, em 1870 tomou parte nas revoltas de Lyon e Bolonha. Fez cerradas críticas a Marx, tendo sido expulso da Primeira Internacional em 1872. Com outros companheiros fundou a Internacional Saint -Imier. Sua obra é vigorosa e apaixonada, mas mal -organizada, pois dificilmente Bakunin terminava o que começava. Era sobretudo um ativista.
Kropótkin (1842-1912), ao contrário de Bakunin, defende a ação não-violenta e luta pelo respeito à vida humana, condena a pena de morte, a tortura e qualquer forma de castigo imposta ao homem pelo homem.
O romancista Leon Toistól (1828 -1910), embora se intitulasse um "pacifista cristão", tinha opiniões sobre o governo e a autoridade que o aproximam dos ideais anarquistas. A pregação da resistência não-violenta influenciou Gandhi na estratégia da desobediência civil durante a luta pela independência da India.
Entre defensores e simpatizantes, o anarquismo conta com artistas, jornalistas e intelectuais em g eral, como Oscar Wilde, George Orwell, Aldous Huxley, Picasso, Alex Comford, Herbert Read, Emma Goldman, Malatesta e George Woodcock.
No final do século XIX, o movimento sindical deu ampla força ao anarquismo, gerando o movimento chamado anarco - sindicalismo, pelo qual os sindicatos não deveriam se preocupar apenas em conseguir melhores salários, mas em se tornar agentes de transformação da sociedade. Segundo o espírito anarquista, os sindicatos não têm poder centralizado, mas se organizam em pequenos grupos de fábrica, e a ampliação dos contatos em nível estadual e nacional deve sempre preservar a participação direta do trabalhador.
Foi na Espanha que o movimento atingiu maior expressividade, até quando não
pôde mais resistir à ação dos exércitos do ditador Franco. Do mesmo modo, o advento do fascismo na Itália e do nazismo na Alemanha significou o enfraquecimento do movimento naqueles países.
O anarquismo ressurgiu timidamente depois da Segunda Guerra Mundial e recrudesceu na década de 60 com o ativismo de jovens de vários países da Europa e da América, culminando com o movimento estudantil de 1968 em Paris.
O anarquismo no Brasil
Com a abolição da escravatura no final do século XIX, a necessidade de mão -de-obra livre favoreceu a imigração de europeus, sobretudo italianos, que vier am
inicialmente para as fazendas de café. Data do início da República Velha a vinda de um grupo de italianos que, autorizados pelo então imperador Pedro II, instalou -se
no interior do Paraná fundando a Colônia Cecilia nos moldes de uma comunidade anarquist a. Experiência efêmera e cheia de dificuldades, não conseguiu florescer.
No começo do século XX, com a urbanização decorrente da industrialização,
organizou-se o anarco-sindicalismo, visando a atuação mais eficaz na luta contra a opressão patronal. Era um movimento atuante não só na preparação das greves, mas na difusão do ideal anarquista por meio de escolas e jornais.
Merece destaque a atuação de José Oiticica (1882 -1957), que, além de teórico divulgador das idéias anarquistas, foi ativista e por isso exilado. Professor universitário e também do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, tentava aplicar em aula os princípios anarquistas. Homem erudito, foi autor de obra variadíssima; além dos textos políticos, escreveu poesias, contos, teatro e desenvolveu trabalhos  linguístico-filológicos de primeira linha. 
Filosofando. Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna  2ª Edição Atualizada p. 247-249



12- Por que existem países ricos e pobres?
12.1 Os países ricos se tornaram ricos pela revolução industrial  


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12.2 Embora a colonização seja causa de mais enriquecimento, não foi ela a causa do enriquecimento, mas ela dificulta o enriquecimento de outros países

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Indústria, colonialismo, capitalismo tardio ou periférico